As 15 “doenças” da liderança, segundo o Papa Francisco
Problemas que podem prejudicar gestores e instituiçõesGary Hamel é um influente pensador do mundo dos negócios, professor da London Business School, e autor de livros e artigos para The Wall Street Journal, Fortune, The Financial Times, entre outros. Em seu mais novo artigo para a Harvard Business Review, revista norte-americana especializada em gestão, Hamel apresenta as “doenças” de liderança sob o ponto de vista de um dos principais “gestores” do mundo atual, o Papa Francisco.
Hamel destaca que costuma ouvir especialistas em gestão enumerando as qualidades dos grandes líderes. “Raramente, porém, eles falam abertamente sobre as ´doenças´ de liderança. O Papa é mais direto. Ele entende que, como seres humanos temos certas tendências, não todas nobres. O âmbito de influência dos líderes faz com que as suas doenças, se tornem especialmente infecciosas”, destaca o especialista.
O Papa Francisco tem se destacado pela declarada intenção de reformar radicalmente as estruturas administrativas da Igreja Católica, que ele considera insular e burocrática. Em 2014, pouco antes do Natal, ele se dirigiu aos líderes da Cúria Romana (cardeais e outros dignitários da Igreja) de forma contundente. A mensagem para seus colegas dirigentes do Vaticano é de que cargos de liderança são suscetíveis a uma variedade de “doenças” debilitantes, incluindo arrogância, intolerância, miopia e avareza. Quando essas doenças não são tratadas, a própria organização fica enfraquecida.
Segundo Gary Hamel, a Igreja Católica é uma hierarquia povoada por bom coração, mas não necessariamente por almas perfeitas. Nesse sentido, não é muito diferente de outras organizações. É por isso que os conselhos do Papa são relevantes para os líderes em todos os lugares.
O escritor passou um par de horas traduzindo o discurso do Papa em algo próximo da linguagem corporativa. E acrescentou: “eu não sei se há uma proibição de parafrasear pronunciamentos papais, mas como eu não sou católico, eu estou disposto a assumir o risco”.
Gestores (de qualquer setor) são tão sensíveis a patologias quanto qualquer ser humano. Mas, quando elas não são tratadas, o trabalho de toda uma equipe pode desmoronar.
Veja a seguir as “doenças” listadas pelo Pontífice Romano e como elas comprometem a “saúde da liderança”:
1- Pensar que somos imortais, imunes ou indispensáveis
O líder que não tem auto-crítica e se julga acima daqueles que trabalham para ele sofre da “patologia do poder”. Essa pessoa é tomada por um complexo de superioridade e deixa de se importar com a autocrítica. É a patologia do poder e vem de um complexo de superioridade, a partir de um narcisismo que apaixonadamente olha para sua própria imagem e não vê o rosto dos outros, especialmente dos mais fracos e os mais necessitados. O antídoto para essa praga é a humildade.
2 – Trabalho em excesso
Pessoas que mergulham no trabalho sem reservar tempo para o descanso, acabam se estressando e perdendo a concentração. A ocupação excessiva mostra desequilíbrio entre trabalho e vida pessoal. Um tempo de descanso é necessário e permite recarregar as energias. Negligenciar o descanso necessário leva ao estresse. Um tempo de descanso, para aqueles que tenham concluído o seu trabalho, é necessário, obrigatório e deve ser levado a sério: como passar o tempo com a família e respeitando as férias como momentos para recarregar as energias.
3 – “Petrificação”
Líderes que tem um “coração de pedra” tendem a perder serenidade, agilidade e ousadia. Substituir a sensibilidade humana por pura formalidade também é perigoso quando se lida com um grupo. Como afirmou o Papa, “um líder precisa de desprendimento e generosidade.” No decorrer do tempo, perdem a sua serenidade interior, agilidade e ousadia, e se escondem debaixo de uma pilha de papéis, transformando-se em “empurradores de papel”. É perigoso perder a sensibilidade humana que nos permite chorar com os que choram e se alegrar com os que se alegram! Porque, como o tempo passa, os nossos corações crescem duro e se tornam incapazes de amar todos aqueles que nos rodeiam. Ser um líder humano significa ter os sentimentos de humildade e altruísmo, de desprendimento, compaixão e generosidade.
4 – Planejamento sem limite
Quando um gestor planeja tudo até o último detalhe por medo do imprevisível, o processo criativo perde a espontaneidade. Organização é importante, desde que haja espaço para a intuição e o improviso.
5 – Falta de coordenação
Se um líder perde o senso de comunidade e o objetivo de integrar seu grupo, o sistema todo perde equilíbrio. A equipe que não é regida com “camaradagem” e trabalho conjunto vira “uma orquestra que produz ruído”, comprometendo resultados.
6 – “Alzheimer” da liderança
Acontece quando um líder se esquece da gratidão que deve àqueles que sempre o apoiaram ou trouxeram inspiração. Tal reconhecimento não deve perder lugar para “caprichos” e “obsessões”.
7 – Rivalidade
O cargo de líder não serve para contar vantagem sobre os outros, alcançando “títulos” como objetivo principal da vida. O dever fundamental do líder é justamente o oposto: atentar-se para os interesses e anseios da equipe. Como líderes, devemos olhar não só para os nossos próprios interesses, mas também para os interesses dos outros.
8 – “Esquizofrenia existencial”
É a doença de quem vive uma vida dupla e marcada pela hipocrisia. Acontece quando o gestor se isola de clientes e funcionários (pessoas concretas) e se dedica apenas a questões burocráticas, perdendo contato com a realidade.
9 – Fofoca
A fofoca é considerada, pelo Papa, como uma “grave doença” que começa às vezes em uma conversa simples, mas pode sujar o nome de um colega e contaminar a harmonia que existe numa equipe. É a doença de pessoas covardes que não têm a coragem de falar diretamente, mas em vez disso falam pelas costas dos outros.
10 – Idolatria dos superiores
É a patologia que atinge aqueles que cortejam seus superiores com o interesse de ganhar uma promoção. São vítimas de carreirismo e oportunismo; honram pessoas [em vez da maior missão da organização]. Eles pensam apenas do que eles podem obter e não o que eles devem dar; pessoas mesquinhas, infelizes e inspiradas apenas pelo seu próprio egoísmo letal. Para isso, deixam de lado os objetivos da equipe como um todo. Líderes são afetados por esta doença quando incentivam e tiram proveito da cumplicidade de seus subordinados.
11 – Indiferença
Quando o líder só pensa em si mesmo e perde a sinceridade e o calor verdadeiro das relações humanas. Acontece quando o profissional mais experiente não compartilha seu conhecimento com aqueles que estão começando. Por “ciúmes” ou “engano”, a pessoa guarda para si o aprendizado que poderia ser útil para o desenvolvimento da equipe. E ainda, quando por ciúmes, a pessoa fica feliz em ver outros caírem em vez de ajudá-los e encorajá-los.
12 – Excesso de severidade
Ocorre com o gestor que acredita que, para ser sério e respeitado, é preciso ser severo, arrogante ou rude. Na verdade, o excesso de severidade é um sintoma de medo e insegurança. Sempre que possível, o líder deve se esforçar para ser cortês, bem humorado e transmitir entusiasmo. Um líder deve fazer esforço para ser cortês, sereno, entusiasmado e alegre, ser “uma pessoa que transmite alegria onde quer que vá”. Um coração feliz irradia uma alegria contagiante. Assim, um líder nunca deve perder a alegria, o espírito bem-humorado, mesmo em momentos difíceis.
13 – Acumulação compulsiva
Quando o líder tenta acumular bens materiais, não por necessidade, mas para se sentir seguro. Segundo palavras do Papa Francisco, nenhuma riqueza pode preencher o “vazio de um coração”. O fato é que não somos capazes de trazer bens materiais quando deixarmos esta vida, uma vez que “a mortalha não tem bolsos”.
14 – Círculos fechados
Acontece quando a vontade de pertencer a um grupo “seleto” de líderes se torna maior do que a identidade de uma equipe. Começa com boas intenções, mas pode acabar fragmentando uma organização. Com o passar do tempo escraviza seus membros e se torna um câncer que ameaça a harmonia da organização, provocando um imenso mal, especialmente para aqueles que tratamos como outsiders. “Fogo amigo” dos seus colegas é o perigo mais insidioso – começa vagarosamente sem apresentar sintomas específicos -. É o mal que atinge a partir de dentro. Como diz a Bíblia, “Todo o reino, dividido contra si mesmo, é devastado.”
15 – Extravagância e exibicionismo
Ocorre com pessoas que tentam acumular poder a qualquer custo e fazem de tudo para deixar “claro” que são mais capazes que os outros. Podem usar calúnia, difamar e desacreditar os outros; e se colocam em exposição constante para mostrar que são superiores. Esta doença causa grande dano porque leva a pessoa a justificar o uso de quaisquer meios para atingir o objetivo, muitas vezes em nome da justiça e transparência! Gary Hamel exemplifica, lembrando-se de um líder que costumava chamar jornalistas para contar e inventar questões privadas e confidenciais envolvendo seus colegas. A única coisa com que ele estava preocupado era de ver a si mesmo na “primeira página”, fazendo-o se sentir poderoso e fascinante, causando um grande dano para os outros e para a organização.