Gestão e Qualidade, Mundo | 29 de fevereiro de 2016

Por que a medicina baseada em evidências não avança?

Estudo revela as dificuldades de muitos hospitais em adequar qualidade, segurança e custos
Por que a medicina baseada em evidências não avança

Gestores e administradores hospitalares convivem com a pressão para melhorar os resultados dos pacientes e reduzir custos da instituição. Mesmo assim, conforme revela um novo estudo, muitas organizações usam poucas práticas baseadas em evidências. A medicina baseada em evidências é pouco valorizada entre chefes de instituições de saúde, de acordo com pesquisa conduzida por Bernadette Melnyk, da Faculdade de Enfermagem da Universidade de Ohio (EUA), publicada na revista especializada Worldviews on Evidence-Based Nursing.

Muitas das instituições relataram, no estudo, maus resultados sobre pontos cruciais de desempenho, como quedas e úlceras de pressão. “Uma percentagem substancial de hospitais não estava atendendo parâmetros nacionais de qualidade e segurança”, disse Melnyk. “À medida que olhamos para as explicações de 30% a 40% dos hospitais não estarem atendendo às normas dos principais indicadores de qualidade, uma explicação chave é o baixo nível da prática baseada em evidências acontecendo nestas instituições”.

Os investigadores entrevistaram 276 gestores de setores de enfermagem para avaliar o quanto o protocolo de práticas baseadas em evidências é prioridade nas instituições. Vários estudos têm mostrado que a medicina baseada em evidências gera cuidados de alta qualidade, melhora a saúde da população, a experiência do paciente, e ainda reduz custos.

Enquanto a maioria dos chefes de enfermagem que participaram da pesquisa disse que acreditam no valor da medicina baseada em evidências, mais da metade relatou que, na prática, suas instituições fazem “nada” ou apenas “um pouco” a respeito. Quando incentivados a listarem três principais prioridades, eles classificaram a qualidade (1º), a segurança (2º), e a prática baseada em evidências foi classificada como uma prioridade baixa.

A medicina baseada em evidência une pesquisa, a perícia médica e as preferências e valores do paciente para conduzir a melhores cuidados e resultados. O Instituto de Medicina dos EUA estabeleceu uma meta, para que até 2020, 90% das decisões médicas sejam feitas baseadas em evidências.

Abordagem não é a norma

Crianças com asma, por exemplo, continuam a ser tratadas com nebulizadores em muitas salas de emergência, apesar de numerosos estudos já terem mostrado melhores resultados (e menos hospitalizações) quando as crianças recebem um broncodilatador com um inalador dosimetrado e um espaçador. “Quando os pacientes recebem cuidados baseados em evidências, eles têm 28% de resultados melhores”, salienta a co-autora do estudo, Lynn Gallagher-Ford.

“Há uma ideia geral de que é isso que os hospitais estão fazendo, e a triste notícia é que muitos não estão”, alertou a Dra. Gallagher-Ford, que dirige o Centro para a Medicina Baseada em Evidências Transdisciplinares de Ohio (Ohio State’s Center for Transdisciplinary Evidence-based Practice).

O estudo aponta para a falta de compreensão como a raiz do problema. “Os gestores pesquisados ​​relataram que planejam se concentrar na medicina baseada em evidências assim que ela apresentar dados sobre a melhora na qualidade e na segurança. Essa é a desconexão: gestores pensam que é uma prioridade competir quando, na realidade, a prática baseada em evidências é o mecanismo exato que precisa ser integrado, para se atingir e manter qualidade e segurança “, acrescenta Gallagher-Ford. Segundo a especialista, este equívoco provavelmente existe em outros setores do hospital, e não apenas na enfermagem.

Sem o apoio das lideranças e sem compromisso, é quase impossível para uma instituição sustentar uma cultura de práticas baseadas em evidências, pondera o estudo. “Muitos hospitais param algum tipo de treinamento das equipes da linha de frente e deixam de criar grandes administradores, perdendo um potencial ambiente de sucesso.”

O estudo também revelou que quase 50% dos chefes de enfermagem pesquisados ​​não tinham certeza de como medir os resultados dos pacientes, uma estatística preocupante, de acordo com Bernadette Melnyk e sua equipe. “Esta descoberta significa uma verdadeira lacuna na preparação de líderes de enfermagem”, alerta a pesquisadora.

“Se nós estamos preparando enfermeiros com pós-graduação e doutorado que não dominam a medicina baseada em evidências, então não vamos ter líderes de enfermagem com conhecimento e uma série de capacidades”, diz ela. Sem tais habilidades, se torna inviável criar uma cultura e uma infra-estrutura condizentes com a prática de cuidados baseados em evidências.

Melnyk afirma que os pacientes devem perguntar aos médicos e enfermeiros sobre as provas concretas por trás do atendimento, dos medicamentos ou dos tratamentos que estão recebendo. “Se os pacientes não ficarem satisfeitos com as respostas, devem procurar um profissional que forneça cuidados baseados em evidências”. Os pesquisadores enfatizam que, enquanto as instituições de saúde não tiverem lideranças que dão suporte à medicina baseada em evidências, a qualidade, a segurança e os resultados dos pacientes continuarão sofrendo.

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