Gestão e Qualidade, Política | 27 de maio de 2022

Entidades marcam reunião que pode definir medidas drásticas de hospitais e clínicas junto ao IPE Saúde

Em nota, FEHOSUL e Federação das Santas Casas dizem que “receberam com estupefação e incredulidade as medidas anunciadas pela Presidência do IPE Saúde”
Entidades marcam reunião que pode definir medidas drásticas de hospitais e clínicas junto ao IPE Saúde

Após a publicação da adoção de tabelas remuneratórias (de medicamentos, diárias e taxas hospitalares) na quinta-feira (26) pelo IPE Saúde, o relacionamento da autarquia com os hospitais, clínicas e demais prestadores que integram a rede assistencial do IPE, ganhou ingredientes que podem sedimentar o início de uma das piores crises da saúde gaúcha.

Ao anunciar as medidas, o presidente do IPE, Bruno Jatene, destacou que as “ações são fruto de estudos e reuniões técnicas que têm foco na sustentabilidade do Instituto, a partir, principalmente, do controle das despesas e de práticas já adotadas no mercado”. Por outro lado, as entidades que representam os hospitais e clínicas se dizem “estupefatas” e “incrédulas” com a decisão, já que acordos alinhavados foram publicados de forma diferente, e ainda, não levaram em conta a sustentabilidade assistencial dos prestadores de serviços de saúde.

Em uma nota dura enviada pela Federação das Santas Casas e Hospitais Beneficentes, Religiosos e Filantrópicos do RSFehosul (Federação dos Hospitais e Estabelecimentos de Serviços de Saúde do Rio Grande do Sul), as entidades representativas dos 40 principais hospitais do Estado dizem que “receberam com estupefação e incredulidade as medidas anunciadas pela Presidência do IPE Saúde.”

As duas entidades reclamam ainda que a decisão foi tomada de forma unilateral. “Reuniões sucessivas foram realizadas, também, entre os dirigentes do IPE Saúde e das entidades representativas, com a mesma finalidade, a última delas 24 horas antes do anúncio unilateral das medidas, com encaminhamentos recíprocos ajustados consensualmente, muito diferentes do que foi dado a conhecer”, completa o documento.

Ainda segundo a Federação das Santas Casas e a Fehosul, a análise preliminar de cada hospital indica que a maioria das instituições terá que pagar para continuar prestando serviços aos beneficiários da autarquia estadual. Para as entidades, tal situação “constitui-se em uma afronta ao senso comum e um injustificável ataque a hospitais e clínicas que, ao longo de décadas, vêm cumprindo sua missão institucional [junto ao Ipe-Saúde] de forma exemplar. ”


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Cronograma dos futuros pagamentos “esquecido”

Em relação ao pagamento extraordinário de R$ 150 milhões, prometido para o próximo dia 31 (terça-feira), as entidades reforçam que este valor representa uma ínfima parcela (pouco mais de 10%) do valor devido pelo IPE. As federações informam que o IPE não estipulou qualquer cronograma de pagamentos para os próximos meses, mantendo assim, o cenário de imprevisibilidade e de incertezas quanto ao passivo reconhecido pela própria autarquia, que hoje alcança a cifra de quase R$ 1,2 bilhão.

“Ponto crucial nas negociações referia-se ao avultado passivo financeiro do IPE Saúde para com os prestadores de serviços, hoje identificado em 1,150 bilhão de reais em notas/faturas apresentadas e não pagas, algumas delas há 195 dias, referentes a serviços assistenciais já integralmente fornecidos, que obrigam as instituições a recorrerem a empréstimos bancários, com juros elevados, para manter a regularidade na prestação dos serviços. Até o momento, não foi apresentado cronograma de liquidação deste escandaloso passivo financeiro, que está comprometendo a higidez econômica e a sustentabilidade de hospitais e clínicas”, adiciona a nota.

“Pagaremos para atender?”

Procurados pelo portal Setor Saúde, três gestores de hospitais credenciados ao IPE aceitaram falar, mas com a condição de não expor o seu nome e a instituição hospitalar, já que esperam pelas deliberações que serão tomadas na assembleia agendada pelas federações para a próxima semana.

A falta de acuidade em relação aos dados apresentados pelo IPE durante as negociações foi relatada por um dos gestores. “Foram identificadas divergências e inconformidades nas tabelas apresentadas pelo IPE ao serem confrontadas com as dos hospitais. Tal desigualdade de informações, por si só, como é praxe em qualquer negociação, deveria ser solucionada antes de qualquer publicização. É urgente que as negociações passem a utilizar bancos de dados consistentes, o que não temos verificado por parte dos indicadores trazidos pelo IPE”, disse o gestor de um hospital localizado em Porto Alegre.

Já outro gestor alerta sobre a possível decisão pelo descredenciamento, o que poderá impactar diretamente o SUS. “O nosso hospital não tem condições de manter os atendimentos, caso sejam mantidas estas determinações. Pagaremos para atender? Já vivemos às custas de empréstimos e não é aceitável assumirmos os prejuízos advindos destas medidas. Vamos salvar o IPE? Ok, é o que nós nos propusemos a fazer, mas não se salva o IPE esquecendo da ponta, que é o paciente que ficará desassistido, sendo obrigado a buscar um hospital SUS, que já está comprometido com contratualizações e metas”, disse um dos membros da diretoria de um hospital do interior.

Outra administrador, também do interior do Estado, lembra que o aumento de custos de insumos, de medicamentos, e futuramente o novo piso de enfermagem, tendem a inviabilizar o modelo proposto pelo IPE. “Os custos na saúde só aumentam e o Estado está fazendo uma escolha, que é péssima por sinal. A decisão de se afastar dos hospitais e clínicas pode deixar os quase 1 milhão de beneficiários do IPE com pouquíssimas opções de atendimento. Qual o hospital vai aceitar continuar com o IPE? Aquele que está passando por um momento difícil, sem saídas, mas que logo adiante não terá dinheiro para investir na melhoria da qualidade da assistência, em segurança do paciente ou em tratamentos de ponta e resolutivos, quiçá conseguirá pagar salários. Isto impactará, inclusive, no aumento do desemprego. É de conhecimento geral: muitos profissionais da medicina já deixaram de atender o IPE, o que se reflete na dificuldade de marcar consultas em muitas especialidades. Se esta situação se manter, também não haverá hospitais disponíveis para os pacientes do IPE. Em Porto Alegre, há a possiblidade de transferir pacientes para outras instituições, mas no interior, como fica? Há sim a possibilidade, cada vez mais próxima, de anunciarmos o descredenciamento”, disse o representante do hospital.

Reunião para decidir próximos passos

No final da tarde de sexta-feira (27), as diretorias das duas federações enviaram ofício para a direção do IPE Saúde, indicando que não adotarão as medidas anunciadas.

As entidades representativas informaram ainda que convocaram uma reunião extraordinária de seus filiados e representados, a realizar-se no início da próxima semana, oportunidade em que será adotada uma decisão coletiva das instituições credenciadas ao IPE Saúde.

Nota da FEHOSUL e Federação das Santas Casas

A Federação das Santas Casas e Hospitais Beneficentes, Religiosos e Filantrópicos do RS e a Fehosul (Federação dos Hospitais e Estabelecimentos de Serviços de Saúde do Rio Grande do Sul), vem por meio desta, esclarecer pontos importantes após a publicação de portarias no Diário Oficial Estadual pelo IPE Saúde, nesta quinta-feira (26).

1) As entidades representativas da totalidade dos hospitais, clínicas e laboratórios, que subscrevem, receberam com estupefação e incredulidade as medidas anunciadas pela Presidência do IPE Saúde, e dadas a conhecer na data de ontem (26/05); 

2) Ao longo de mais de 70 dias, técnicos das entidades trabalharam exaustivamente, ao lado de técnicos do IPE Saúde, em grupo de trabalho constituído para encontrar soluções técnicas que pudessem viabilizar econômico-financeiramente a autarquia, manter a sustentabilidade assistencial de hospitais e clínicas e entregar uma assistência de qualidade aos mais de 1 milhão de beneficiários do plano de saúde;

3) Reuniões sucessivas foram realizadas, também, entre os dirigentes do IPE Saúde e das entidades representativas, com a mesma finalidade, a última delas 24 horas antes do anúncio unilateral das medidas, com encaminhamentos recíprocos ajustados consensualmente, muito diferentes do que foi dado a conhecer;

4) Ponto crucial nas negociações referia-se ao avultado passivo financeiro do IPE Saúde para com os prestadores de serviços, hoje identificado em 1,150 bilhão de reais em notas/faturas apresentadas e não pagas, algumas delas há 195 dias, referentes a serviços assistenciais já integralmente fornecidos, que obrigam as instituições a recorrerem a empréstimos bancários, com juros elevados, para manter a regularidade na prestação dos serviços. Até o momento, não foi apresentado cronograma de liquidação deste escandaloso passivo financeiro, que está comprometendo a higidez econômica e a sustentabilidade de hospitais e clínicas; 

5) Análise preliminar das medidas anunciadas indica que a maioria das instituições terão de pagar para continuarem prestando seus serviços à autarquia estadual, o que, obviamente, constitui-se em uma afronta ao senso comum e um injustificável ataque a hospitais e clínicas que, ao longo de décadas, vêm cumprindo sua missão institucional de forma exemplar; 

6) Visando analisar esta dramática situação as entidades representativas convocaram uma reunião extraordinária de seus filiados e representados, a realizar-se no início da próxima semana, oportunidade em que será adotada uma decisão coletiva das instituições credenciadas ao IPE Saúde.

 

 



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