Supremo impede tratamento diferenciado no SUS
Paciente não poderá pagar a mais para ter atendimento ou acomodação superiorHospitais ou clínicas conveniadas que atendem ao Sistema Único de Saúde (SUS), não poderão disponibilizar atendimento ou leitos melhores para pacientes que queiram pagar a mais por um quarto privativo, por exemplo. O Supremo Tribunal Federal (STF) vedou a chamada “diferença de classe”. Uma das preocupações manifestadas com o modelo seria a possível piora no atendimento dos pacientes que não podem pagar essa diferença – com diminuição de acesso a leitos e maiores filas.
Os ministros entenderam, com base no voto do relator, ministro Dias Toffoli, que não se poderia autorizar a criação do que se chamou de “primeira classe do SUS”. De acordo com eles, a Constituição prevê acesso universal e integral à saúde. Isso significa que o sistema deve ser para todos, dos mais ricos aos mais destituídos.
Até então, apesar de o Ministério da Saúde impedir a prática, predominavam no STF decisões favoráveis. Em seu voto, o ministro Dias Toffoli explicou que todos os casos julgados sobre o tema eram individuais, com análise baseada em condição clínica específica do paciente. O relator destacou ainda que grande parte dos precedentes da Corte é da época de criação do SUS. “A permissão a atendimento diferenciado se deu mais pelos casos concretos do que por convencimento referente ao sistema global do SUS”, afirmou.
No processo em julgamento, o pedido para adoção da “diferença de classes” foi feito de forma ampla e irrestrita e não para situação pontual. Trata-se de ação civil pública que chegou ao STF por meio de recurso com repercussão geral.
No caso concreto, o Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul (Cremers) entrou com uma ação civil pública contra o município de Canela (RS), gestor municipal do SUS, argumentando que o paciente pode optar por outras acomodações, desde que pague pela diferença.
O Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, porém, proibiu esse tipo de pagamento. Para o TRF, mesmo sem ônus para o Estado, essa possibilidade de remuneração permite tratamento diferenciado aos pacientes dentro de um sistema que prevê o acesso universal e igualitário da população.
No Supremo, o procurador do Estado do Rio Grande do Sul, Victor Herzer da Silva, defendeu que se alguém atendido pelo SUS quiser pagar por uma acomodação melhor, deve procurar a iniciativa privada. De acordo com ele, permitir a criação de classes dentro do sistema público tornaria oficial uma conduta que hoje é considerada crime – o pagamento “por fora” para médicos atenderem pela rede pública. “Autorizaria aqueles que têm algum dinheiro disponível a receber tratamento privilegiado.”
Para Toffoli, permitir que um paciente internado no SUS tenha acesso a melhores médicos ou acomodação subverte a lógica do sistema e ignora seus pressupostos. “Não parece possível que um sistema que se diz igualitário tenha mudanças devido à situação econômica do paciente.”
A possibilidade de pagamento criaria duas categorias de pacientes, de acordo com o ministro Luiz Fux. “Isso não se encaixa em nenhuma promessa da Constituição”, afirmou Fux. Os hospitais diminuiriam o número de leitos do SUS e quem precisasse do atendimento acabaria tendo que pagar para ser atendido, segundo projetou o ministro.
A ministra Cármen Lúcia defendeu que o Supremo pode e deve mudar sua jurisprudência, mas tem que avisar que está mudando, como foi feito no caso.
* Com informações Exame