Mundo | 18 de agosto de 2016

Um clitóris em 3D para quebrar tabus

Modelo realista deve ser parte das aulas de educação sexual na França
Um clitóris em 3D para quebrar tabus

Em setembro, início do ano letivo na França, os alunos que retornarem às aulas deverão ter uma surpresa. Eles vão aprender com detalhes tudo sobre o clitóris, graças a um modelo do órgão em 3D, anatomicamente idêntico ao verdadeiro.

Como afirma o jornal Le Figaro em matéria do dia 12 de agosto, o clitóris “tem experimentado um declínio de popularidade desde o início do século passado. Esquecido na educação sexual e representado de forma incompleta nos livros didáticos, o órgão sexual pode agora ser reproduzido facilmente usando uma impressora 3D”.

O modelo, feito através de impressora 3D, foi criado pela pesquisadora Odile Fillod no centro científico, Cités des Sciences et de L’Industrie, em Paris. “Este é um modelo estilizado, porque, na realidade, um clitóris é sempre assimétrico, irregular”, ressalta Odile Fillod. O projeto criou um clitóris de tamanho completo e em 3D, a fim de “mostrar concretamente como é este órgão cuja anatomia é geralmente ignorada ou mal interpretada”, diz ela.

Veja o vídeo do clitóris 3D:

A ideia surgiu a partir da constatação do Alto Conselho para a Igualdade entre Homens e Mulheres do governo francês, de que as aulas de educação sexual estão mergulhadas no machismo. Afinal, as diretrizes sugerem que os homens procuram a “sexualidade genital” enquanto as mulheres “dão mais importância ao amor”.

A maior parte do clitóris fica na parte interna da mulher, em volta da vagina, sendo visível apenas a glande. Sua única função é dar prazer à mulher. É no clitóris que a maioria das mulheres têm maior prazer sexual.

O clitóris 3D tem forma angular, feito de plástico biodegradável, e permite ver a glande com oito mil terminações nervosas, e também revela suas partes internas: composto por um par de corpos cavernosos e dois bulbos do vestíbulo.

Depois de definir um clitóris de forma e tamanho médios, com base em artigos científicos, o modelo em 3D foi disponibilizado gratuitamente na internet (acesse o link, em francês) “Assim professores, educadores sexuais ou qualquer outra pessoa pode imprimir uma cópia e usá-la para fins educacionais”, diz Odile Fillod.

De acordo com ela, nem a educação sexual francesa nem os manuais sobre o assunto concedem ao clitóris o espaço que deve ter. “O currículo escolar detalha conhecimentos relacionados à reprodução, onde o clitóris não intervém”.

Um tabu recente

Ainda assim, o clitóris nem sempre foi um tabu. “Representado pela primeira vez com precisão pelo médico alemão George Ludwig Kobelt em 1844, o clitóris ocupou, até o início do século XX, várias páginas dos livros de anatomia. Mas a partir de 1960, apenas poucas linhas são ainda dedicadas a ele. O sexólogo Jean-Claude Piquard salienta que “alguns dizem que o século XX foi o século da liberação sexual, mas estão errados. Pelo contrário, foi marcado por um movimento de repressão sexual sem precedentes”.

“Durante muito tempo, a medicina pensou que o orgasmo feminino era o principal órgão necessário para a procriação”, acrescenta o sexólogo. “Até o século XIX, a própria Igreja recomendava aos casais que recorressem ao clitóris”, enfatiza. Mas em 1880, “os médicos descobriram que a ovulação é independente do prazer da mulher. Esse foi o início da ´queda´ do clitóris”.

Esta nova iniciativa é parte de um processo destinado a permitir que as mulheres voltem a tomar conhecimento e posse de seus corpos. “Não há dois sexos fundamentalmente diferentes. A contrapartida feminina do pênis é o clitóris, ele tem a mesma origem embrionária, funciona da mesma forma e tem o mesmo papel no prazer sexual”, diz Odile Fillod. Por fim, “o conhecimento do clitóris ajuda a explicar porque a circuncisão feminina é uma grave mutilação sexual”.

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