Gestão e Qualidade, Tecnologia e Inovação | 14 de setembro de 2017

Hospitais devem se preparar para as mudanças promovidas pela medicina genômica 

Grandes centros de oncologia avançam em direção a uma nova era  
Hospitais devem se preparar para as mudanças promovidas pela medicina genômica

Após anos de falsos começos, a era da medicina genômica finalmente chegou. Nos Estados Unidos, milhares de pacientes estão sendo tratados com base em informações extraídas de seu genoma. Conforme informações do portal Trustee, da Associação Americana de Hospitais (AHA), são mudanças que estão sendo adiadas desde 2001, quando começaram  as primeiras publicações sobre o assunto. Porém, para torná-la real, ainda era preciso avanços na infraestrutura da tecnologia da informação e uma queda dos custos. A medicina genômica – diferente da genética – mapeia a função de cada uma das mais de 3 bilhões de bases nitrogenadas que formam a estrutura de DNA.

Hoje, o custo do sequenciamento total de exoma, que revela toda a porção de proteína do DNA, é equivalente a um exame de ressonância magnética, diz Louanne Hudgins, médica e presidente da American College of Medical Genetics and Genomics. “O sequenciamento genômico é uma ferramenta como qualquer outra na medicina”, conta a médica.

Triagem e tratamento do câncer

Em nenhuma área essa transformação genômica é mais aparente do que no tratamento do câncer. Empresas como a Grail’s Circulating Cell-free Genoma Inc., com sede na Califórnia, estão buscando projetos em larga escala, em colaboração com centros médicos acadêmicos e sistemas de saúde.

A Grail’s Inc estuda identificar as impressões digitais genômicas de tumores que podem ser analisados através de uma amostra de sangue. O objetivo é ajudar a identificar o câncer precocemente – quando são mais tratáveis – trazendo um tratamento individualizado às características do paciente.

“Estamos encontrando muito entusiasmo à medida que as pessoas querem participar desses esforços, desde pacientes até médicos”, diz Mark Lee, médico e chefe de desenvolvimento clínico na Grail’s. Segundo ele, os centros de saúde e os pacientes têm cada vez mais a oportunidade de participar de novos tratamentos baseado em genoma.

Com o apoio de gigantes de investimento como a Amazon e Fundação Bill e Melinda Gates, a Grail fez parceria com os principais centros de saúde dos EUA, como a Mayo Clinic, a Cleveland Clinic e a Oncology Network para coletar dados de pacientes com foco em estudos genômicos em larga escala.

Já a empresa de biotecnologia Regeneron fez parceria com Geisinger Health System, com sede na Pensilvânia, para registrar pacientes interessados em um projeto denominado MyCode Community Health Initiative. Em junho passado anunciou que atingiu 150 mil participantes em seu principal estudo de sequenciação de DNA.

Tratar genes, não órgãos

A medicina genômica avançou até o ponto de que os genes e suas variantes agora podem ser alvo de tratamentos através de medicamentos. Em maio, a Food and Drug Administration (FDA) aprovou o pembrolizumab (Keytruda) para tratar qualquer tumor sólido não ressacável ou metastático com um biomarcador genético específico, independentemente da sua localização no corpo.

“Este é um importante passo inicial para a comunidade”, disse Richard Pazdur, diretor do Centro de Excelência em Oncologia da FDA e diretor interino do Escritório de Produtos de Hematologia e Oncologia no Centro de Avaliação e Pesquisa de Drogas da FDA.

Segundo Pazdur, os ensaios clínicos que combinam marcadores genômicos com tratamento direcionado estão bem encaminhados e se espera que tornem a identificação de alvos genômicos uma parte essencial dos cuidados.

As terapias direcionadas obtiveram outro avanço em julho, quando um painel convocado pela FDA deu sua recomendação unânime para a aprovação do primeiro tratamento médico baseado em genes no receptor de antígeno quimérico T ou a terapia celular CAR-T, para tratar uma forma particularmente agressiva de leucemia. É a primeira de uma onda de novas “drogas vivas” projetadas para procurar e destruir tumores. Na ASCO 2017, maior evento de oncologia do mundo, profissionais de hospitais brasileiros já destacaram a “revolução” da imunoterapia e da CART-T Cells.

A terapia com células CAR-T representa o ponto culminante para identificar as características genéticas únicas, em cada forma específica de câncer que pode ser direcionada pelo sistema imunológico. A abordagem, que estimula o próprio sistema imunológico do paciente a reconhecer e atacar células cancerosas, também oferece a promessa de medicina personalizada, já que as células T são colhidas de cada paciente, reestruturadas para reconhecer e atacar o câncer e retornar ao paciente.

No caso do CTL019 da Novartis, (saiba mais) o desaparecimento de tumores que atingiu 83% dos pacientes, foi considerada emblemático desta nova era. Brian Till, do Seattle’s Fred Hutchinson Cancer Research Center da cidade de Seattle (EUA), que trabalha no CAR-T há anos, mas não esteve envolvido no desenvolvimento do CTL019, disse que esses primeiros resultados são encorajadores. “Alcançamos dados suficientes para ser otimista”, diz Till. E acrescentou, que a terapia CAR-T tem potencial para ser administrada como um tratamento ambulatorial aliada ao manejo cuidadoso dos efeitos colaterais.

Diagnósticos

Muitas perguntas permanecem, como se há a necessidade de pessoas saudáveis aprenderem “os segredos ocultos” em seu DNA. Mas essas preocupações provavelmente serão ofuscadas por estas novas terapias direcionadas que estão chegando em hospitais e clínicas dos EUA. A sequência genômica será parte fundamental do atendimento padrão na próxima década.

No campo dos diagnósticos e tratamentos de doenças raras, a medicina genômica já foi transformadora. Há apenas cinco anos, pacientes com inúmeros sintomas vagos, principalmente crianças, podiam ir de médico em médico, tendo que realizar procedimentos invasivos sem receber um diagnóstico definitivo. Embora alguns distúrbios ainda não consigam ser diagnosticados, o sequenciamento do genoma reduziu esse número consideravelmente, conforme destaca a revista Trustee.

Agora, a velocidade de sequenciamento e análise de DNA permite um diagnóstico praticamente em tempo real, movendo-o mais rapidamente para o fluxo de trabalho clínico. No Rady Children’s Hospital-San Diego, uma série de máquinas de sequenciamento da empresa Illumina analisam amostras em apenas 37 horas, de acordo com Stephen Kingsmore, diretor do Institute for Genomic Medicine. As análises forneceram, por exemplo, um diagnóstico de origem genômica para quase 50% dos pacientes. Uma grande parte dos pacientes que já tinha outro tratamento, mudou a abordagem terapêutica a partir das descobertas do sequenciamento. Stephen Kingsmore diz: “todo hospital deve ter acesso a sequenciações e análises rápidas dentro de alguns anos”.

Para os futuros pais, o diagnóstico pré-natal e perinatal também entrou em um novo campo. “O rastreio pré-natal de DNA sem células diminuiu drasticamente o número de procedimentos invasivos, como amniocentese – retirada de líquido amniótico do abdome materno para fins de análise – e a amostragem vilo-coriônica (ou CVS) – exame pré-natal que pode detectar determinadas anomalias genéticas no feto – que as mulheres grávidas se submetem”, diz Hudgins. “Nos últimos anos, diminuiu cinco vezes em muitas localidades dos EUA”

De fato, mais pessoas estão tendo seu DNA sequenciado para combinar um defeito genético subjacente com uma variedade crescente de opções de tratamento direcionado. Cerca de 1.000 testes genéticos estavam disponíveis cinco anos atrás, mas em pouco tempo, o “mercado” explodiu para mais de 52.000 disponíveis nos EUA, com o número crescendo a cada dia, como mostra o site do National Center for Biotechnology Information’se o Genetic Testing Registry.

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