Estatísticas e Análises | 21 de novembro de 2016

10 mitos sobre infecções urinárias

Journal of Emergency Medicine esclarece sobre diagnóstico e tratamento
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A infecção do trato urinário (ITU) é um quadro infeccioso que pode ocorrer em qualquer parte do sistema urinário (rins, bexiga, uretra e ureteres). É um dos tipos mais comuns de infecção.

Um relatório dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA, de março de 2014, que tratava do uso de antibióticos em hospitais, relatou que o tratamento para ITU era evitável pelo menos em 39% das vezes.

 Um diagnóstico preciso e o tratamento correto são fundamentais na recuperação do paciente, na redução de custos e na utilização adequada de antimicrobianos. Mas existem muitas informações desencontradas a respeito, que podem confundir os médicos.

 Um artigo publicado em setembro no Journal of Emergency Medicine, 10 mitos associados ao diagnóstico e tratamento da ITU foram analisados, com uma revisão da literatura referente a cada mito. “Exploramos os mitos associados à piúria (pus na urina), bacteriúria assintomática (presença de bactérias na urina em pacientes sem sintomas urinários), candidúria (infecção urinária bacteriana) e pacientes idosos e cateterizados. Tentamos dar orientação para clínicos que enfrentam esses cenários clínicos”, diz o artigo.

 Conheça os principais mitos e saiba como orientar-se:

Mito 1: A urina é turva e tem um cheiro ruim. O paciente tem ITU.
Verdade: Cor, clareza e odor da urina não devem ser utilizados isoladamente para diagnosticar a infecção ou iniciar o tratamento. A inspeção visual de clareza da urina não é útil no diagnóstico em mulheres. O mau cheiro não é um indicador confiável de infecção em pacientes com cateter e, normalmente, varia de acordo com o estado de hidratação dos pacientes e concentração de ureia na urina.

 

Mito 2: Bactérias estão presentes na urina. Meu paciente tem ITU.
Verdade: A presença de bactérias na urina no exame microscópico ou por cultura positiva sem sintomas não é uma indicação de infecção urinária, devido à possibilidade de contaminação e bacteriúria assintomática. Sempre que possível, o diagnóstico de infecção urinária deve ser baseado em sintomas clínicos e confirmado por microscopia e cultura de urina. Contagem de colônia não deve ser utilizada para orientar o tratamento em doentes assintomáticos. Em mulheres sintomáticas, a contagem de colônias acima de 10² ufc/ml (Unidades Formadoras de Colônias por mililitro) são clinicamente significativas. Nos homens sintomáticos, a contagens de colônias acima de 10² ufc/ml são clinicamente relevantes para o diagnóstico.

 

Mito 3: A amostra de urina do meu paciente tem mais de 5 células epiteliais escamosas por campo e a cultura é positiva. Como a cultura é positiva, posso ignorar a contagem de células epiteliais e tratar a ITU.

Verdade: Uma boa amostra tem menos de 5 células epiteliais por campo no exame de urina. Para amostras contaminadas, o médico deve considerar o recolhimento ou realizar cateterismo.

 

Mito 4: A urina tem leucócito esterase positivo. Meu paciente deve realizar cultura de urina, tem ITU e precisa de antibióticos

Verdade: Urina com leucócito esterase positivo não deve ser utilizada isoladamente para apoiar o diagnóstico de infecção urinária ou iniciar a terapia antimicrobiana. Exames com cultura de urina acima de 5 leucócitos/campo devem ser reavaliados pela sua utilidade na ausência de sintomas do paciente. Um teste de leucócito esterase tem alta sensibilidade e especificidade para a presença de piúria, no entanto, um leucócito esterase positivo por si só não é útil para o diagnóstico de ITU. Os sintomas são geralmente necessários para o diagnóstico; leucocitúrias ou bacteriúria por si só não são indicações para a terapia antimicrobiana. Em raras ocasiões, um leucócito esterase negativo na presença de sintomas ainda pode levar a cultura de urina, caso haja suspeita clínica. Mais apropriadamente, nessa situação, o médico deve buscar indícios de uretrite, vaginite ou infecção sexualmente transmissível.

 

Mito 5: Meu paciente tem piúria. Ele deve ter ITU.

Verdade: A contagem de leucócitos não deve ser utilizada isoladamente para apoiar o diagnóstico de infecção do trato urinário ou iniciar a terapia antimicrobiana. Em pacientes com neutropenia ou leucopenia, a contagem de leucócitos pode ser artificialmente baixa. Se os sintomas urinários estiverem presentes e existir suspeita de infecção, o laboratório deve ser contatado e feita uma ordem específica para cultura de urina. As contagens de leucócitos limítrofes de 6-10 células/mL podem refletir o estado de hidratação do paciente. Por exemplo, pacientes com oligúria ou anúria, geralmente, têm algum grau de piúria. Leucócitos também podem ser vistos na presença de hematúria moderada. Além disso, doenças não infecciosas, como insuficiência renal aguda, infecções sexualmente transmissíveis ou cistite não infecciosa a partir da presença de um cateter na bexiga, podem resultar em piúria.

 

Mito 6: A urina tem presença de nitratos. Meu paciente tem ITU.
Verdade: Nitratos na urina não devem ser utilizados isoladamente para diagnóstico ou terapia.

Nitrato na urina tem uma alta taxa positiva para bacteriúria, mas isso não define uma ITU clinicamente significativa. O diagnóstico de infecção urinária deve ser considerado em um paciente com nitrato elevado na urina na presença de sinais e sintomas clínicos.

 

Mito 7: Todos os resultados de bactérias em uma amostra de urina cateterizada devem ser diagnosticados como ITU.
Verdade: Praticamente 100% dos pacientes com um cateter foley são colonizados com 2 a 5 organismos. A contagem de colônias define bacteriúria, mas deve ser analisada em um contexto clínico para o diagnóstico de ITU. Quase 100% dos pacientes com cateter tinham bacteriúria e 77% eram polimicrobiana. O intervalo médio entre episódios de bacteriúria com novos organismos foi de 1,8 semana. Bacteriúria e piúria em pacientes cronicamente cateterizados devem ser tratadas apenas na presença de sinais e sintomas de infecção, quando avaliáveis (por exemplo, febre, leucocitose, dor suprapúbica e maciez). Piúria ou bacteriúria, por si só, não são indicações para a terapia antimicrobiana. Embora os antibióticos possam retardar o início de bacteriúria em pacientes cateterizados, em última análise, essa estratégia é mais indicada para microorganismos resistentes. Profiláticos anti-infecciosos não são recomendados para pacientes com cateteres crônicos, mas podem ser considerados para uso em curto prazo (até duas semanas), para atrasar o início da bacteriúria em casos selecionados, onde os benefícios da profilaxia superam os riscos.

 

Mito 8: Pacientes com bacteriúria irão progredir para uma infecção urinária e, portanto, devem ser tratados.
Verdade: Bacteriúria não estabelece um diagnóstico de ITU. Terapia antimicrobiana não deve ser iniciada em pacientes assintomáticos. A prevalência de bacteriúria em pacientes idosos, internados, sem cateteres permanentes, varia de 25% a 50% para as mulheres e 15% a 49% para homens, e aumenta com a idade. Bacteriúria e piúria em idosos são condições esperadas. Infecção urinária sintomática é, substancialmente, menos comum do que bacteriúria assintomática. Esta não foi associada a resultados negativos em longo prazo, tais como pielonefrite, sepse, insuficiência renal ou hipertensão. Piúria, leucócitos esterase ou nitrato, individualmente, acompanhados de bacteriúria assintomática não são, necessariamente, uma indicação para tratamento. Algumas exceções incluem: gravidez e qualquer procedimento urológico com sangramento, como a colocação de stent no trato urinário. Evidências recentes sugerem que em mulheres mais jovens com ITU recorrente, a bacteriúria pode ser “protetora” para futuras infecções urinárias com organismos mais patogênicos.

 

Mito 9: Quedas e alterações do estado mental em pacientes idosos são, geralmente, causadas por infecção do trato urinário.
Verdade: Alterações do estado mental e quedas em idosos são causados por muitos fatores. Evidências (febre, leucocitose) ou outros sinais e sintomas de infecção do trato urinário, especialmente disúria, devem estar presentes para fazer o diagnóstico em pacientes sem cateter. Os sintomas de infecção em pacientes cateterizados são mais difíceis de avaliar. Pacientes idosos com alterações no estado mental acompanhadas por bacteriúria e piúria, sem instabilidade clínica ou outros sinais ou sintomas de infecção urinária, podem ser observados por 24h a 48h sem antibióticos, enquanto outras causas de confusão são investigadas. Em todos os pacientes idosos, alterações no estado mental e declínio funcional são manifestações clínicas de várias circunstâncias, incluindo desidratação, hipóxia e reações adversas à  polifarmácia. O diagnóstico de ITU deve ser correlacionado com outros sinais de inflamação sistêmica. No paciente sem cateter, alterações agudas no estado mental são associadas com bacteriúria mais piúria, em pacientes com suspeita clínica de ITU. No entanto, essas duas descobertas são vistas também frequentemente em pacientes idosos com bacteriúria assintomática. Atribuir o estado mental alterado à bacteriúria pode resultar em incapacidade de identificar a verdadeira causa. Quedas sem identificação de sintomas urinários não foram associados com bacteriúria e piúria. Idosos doentes, especialmente aqueles com demência ou cateteres foley, têm altas taxas de bacteriúria. O diagnóstico da infecção/sepse de uma fonte urinária com bacteriúria assintomática não é recomendado, a menos que outras fontes de infecção sejam excluídas, e os doentes atendam aos critérios de suspeita de infecção urinária. O diagnóstico no paciente cateterizado deve sempre ser de exclusão por investigar outras causas de alteração do estado mental.

 

Mito 10: Fungo na urina, principalmente em pacientes com cateteres vesicais de demora, indica uma candidúria e precisa ser tratada.

Verdade: A ocorrência de candidúria no paciente cateterizado é comum, especialmente na UTI, e, na maioria das vezes, reflete colonização ou infecção assintomática. O tratamento de cândida na urina deve ocorrer apenas em situações raras, tais como sinais e sintomas claros de infecção e nenhuma fonte alternativa de infecção. O tratamento de candidúria assintomática em pacientes não neutropênicos cateterizados não demonstrou ser eficaz. O tratamento de candidúria  deve, primeiro, incluir a substituição/remoção de instrumentos do trato urinário. Exceto em pacientes selecionados de maior risco de transplante, ou hospedeiros imunocomprometidos que receberam esteroides, ou cenários clínicos para pacientes com alto risco de candidíase sistêmica, candidúria tem uma baixa incidência de complicações sistêmicas e observação conservadora é, geralmente, indicada. O isolamento do fungo cândida na urina de pacientes sem cateter deve levantar preocupações sobre contaminação externa ou vaginal. Se uma amostra confiável é, repetidamente, obtida com cândida e o paciente é sintomático, a consideração de tratamento antifúngico pode ser justificada.

 Conclusão

Usando dados clínicos de histórico e de laboratório, além de compreender as evidências por trás desses mitos comuns, os profissionais de saúde serão mais capazes de fazer um diagnóstico preciso. Isso resultará em aumento da segurança dos pacientes e diminuição dos custos de cuidados de saúde.

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