Geral | 23 de julho de 2013

Lúpus – uma doença de difícil diagnóstico

Patologia ganha notoriedade graças à novela Amor à Vida
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O Lúpus é uma patologia que requer muitos cuidados. Em diversos casos necessita de transplante renal e, embora mais raramente, transplante hepático. O assunto passou a ser de conhecimento da grande população brasileira graças à novela Amor à Vida, na qual a personagem Paulinha possui a doença. No entanto, é preciso saber diferenciar a realidade da ficção.

Conforme dados fornecidos pelo Serviço de Reumatologia do Hospital Mãe de Deus, em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico (LES) o sistema imunológico ataca e destrói tecidos saudáveis por entender que há um “agente inimigo” no corpo que precisa ser combatido, mas que na verdade não existe. Qualquer parte do organismo corre o risco de ser atingida.

Por esta característica híbrida, os sintomas da doença são diversos, como febre, aumento dos linfonodos, cansaço, manchas na pele que pioram com exposição solar, queda de cabelo, dor nas juntas, dor no peito que piora com a respiração, urina escura e espumosa, inchaço nas pernas, anemia, diminuição das plaquetas e alterações neuropsiquiátricas. Motivo pelo qual não existe um exame específico para diagnosticar o lúpus, o que gera um grande desafio para os médicos.

Em entrevista para o Portal Setor Saúde o Dr. Ordilei Monticielo, do Serviço de Reumatologia do HMD, dá mais detalhes sobre o LES, analisa o caso criado na novela e fala da importância da exposição midiática que a patologia tem recebido.

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Dr. Odirlei Monticielo

 

Setor Saúde – É possível afirmar que a doença é de causa desconhecida?

Dr. Odirlei Monticielo – Eu diria que a doença tem uma causa pouco conhecida. Não há um único fator associado com o desenvolvimento do lúpus eritematoso sistêmico (LES). Na verdade, a pessoa apresenta alterações genéticas que lhe conferem uma maior suscetibilidade. Esta pessoa, frente a estímulos ambientais como infecções, luz UV, tabagismo e até mesmo algumas medicações, pode começar a desenvolver o quadro clínico de LES. Além dos fatores genéticos e ambientais, a presença do hormônio estrogênio, típico de mulheres na idade reprodutiva, atua como um facilitador. Certamente há outros fatores que ainda desconhecemos e que podem ser importantes neste contexto.

Setor Saúde – O caso apresentado na novela é raro?

Dr. Odirlei Monticielo – O caso apresentado na novela é raro principalmente por dois motivos: 1. Trata-se de uma criança. Sabemos que o LES é muito mais prevalente em adultos jovens, especialmente mulheres dos 20-40 anos, onde chega a alcançar uma razão de nove mulheres para cada homem acometido. Em geral, o surgimento da doença ocorre entre 16 e 55 anos em mais de 65% dos casos, abaixo dos 16 anos em cerca de 20% dos casos e acima dos 55 anos em 15% dos casos.

2. A necessidade de transplante hepático assim de forma tão abrupta é muito raro. O transplante que mais vemos no LES é o renal. E mesmo assim, geralmente naqueles casos de longa evolução com envolvimento renal e que não foi tratado de forma adequada.

Setor Saúde – Existe um perfil (seja de comportamento, genético, etc.) para esse paciente?

Dr. Odirlei Monticielo – A doença pode ser diferente em cada paciente. Geralmente nos primeiros 3-5 anos de doença é que ocorrem as principais manifestações clínicas, nos dando uma ideia de como este paciente pode evoluir ao longo dos anos.

Setor Saúde – Como são os casos mais comuns?

Dr. Odirlei Monticielo – A apresentação clínica do LES geralmente ocorre com sintomas constitucionais, tais como febre, emagrecimento, aumento dos linfonodos, cansaço e perda do apetite. Podem surgir manchas na pele que pioram com exposição solar, queda de cabelo, dor nas juntas, dor no peito que piora com a respiração. O surgimento de anemia e contagens baixas de leucócitos é bastante comum. O envolvimento renal, caracterizado muitas vezes por urina escura e espumosa, além de inchaço nas pernas, determina uma doença mais grave, cujo tratamento precisa ser mais intenso. Outros achados que também determinam uma doença mais grave são a presença de alterações neuropsiquiátricas e diminuição significativa das plaquetas com sangramento.

Setor Saúde – Tendo como base o lúpus, o destaque que doenças ganham por meio de novelas é algo positivo, por levar informação à população? Ou a ficção fica devendo em termos de conhecimento médico?

Dr. Odirlei Monticielo – Sempre acaba sendo positivo, pois traz informação à população. Utilizo como exemplo a caso desta novela. Apesar de não retratar uma forma comum de manifestação e evolução da doença, fez como que despertasse o interesse da mídia, culminando com o surgimento de inúmeras reportagens e entrevistas com médicos especialistas, o que certamente contribuiu muito para divulgação de importantes informações sobre esta doença.

ENTENDA ALGUMAS CARACTERÍSTICAS DO LÚPUS E COMO COMBATÊ-LO:

– Fatores relacionados com seu surgimento: Alterações genéticas, fatores ambientais (infecções virais, radiação solar, tabagismo) e fatores hormonais como o estrogênio, o que ajuda a explicar a maior prevalência em mulheres.

– Perfil dos pacientes: as mulheres são mais afetadas, especialmente na idade reprodutiva. Também pode ocorrer em crianças, onde costuma ser mais grave, e em idosos, onde geralmente é mais branda.

– Tratamento: não existe cura, mas existe tratamento que mantém a doença em remissão. Um dos mais importantes medicamentos é a hidroxicloroquina, que atua como imunomodulador, o que objetiva regular as alterações do sistema imune. O glicocorticóide é muito utilizado no controle das manifestações agudas, mas não deve ser mantido por toda a vida, devido a seus potenciais eventos adversos, tais como aumento da pressão arterial, diabetes, catarata, aumento de peso, estrias na pele e muitos outros. E, em situações mais graves, lançamos mão de medicações que suprimem o sistema imune, ou seja, fazem as defesas hiperativadas serem diminuídas. Dentre estas medicações, a Azatioprina, o Metotrexato e a Ciclofosfamida são as mais utilizadas. Recentemente, novas drogas tem sido descobertas para o tratamento do LES e também poderão ser integradas ao nosso uso. Jamais faça uso de medicações sem a orientação médica.

– Hábitos saudáveis, como dieta balanceada, a prática de exercícios físicos, evitar tabagismo, repor vitamina D e evitar exposição a radiação solar (também lâmpadas fluorescentes) são importantes aliados. Também é necessário fazer as vacinas conforme calendário vacinal e manter acompanhamento psicológico das pacientes. Uma outra dica é evitar a reposição hormonal e o uso de anticoncepcionais com estrogênio.

– A gestação no Lúpus é possível, desde que a doença esteja sob controle por pelo menos 6 meses e a paciente não esteja usando medicação que possa causar problemas ao feto.

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