Hospital Moinhos de Vento realiza procedimentos complexos e inéditos em cardiologia pediátrica no RS
Paciente de 10 anos passou por um implante de valva Edwards em posição pulmonar nativaO Hospital Moinhos de Vento larga na frente mais uma vez com a realização de um procedimento cardíaco inédito. O Serviço de Pediatria conduziu o primeiro implante de uma valva Edwards em posição pulmonar nativa realizado no Rio Grande do Sul, e o quarto do país. O paciente, Enzo Lisboa Bernardo, de 10 anos, possuía Tetralogia de Fallot, uma condição rara causada por uma combinação de quatro defeitos cardíacos presentes no nascimento.
No final do ano passado, a instituição protagonizou o primeiro implante de valva pulmonar bilateral do Brasil em outra criança, também com dez anos. Segundo o cardiologista intervencionista do Núcleo de Cardiopatias Congênitas, João Luiz Langer Manica, os pacientes possuem características muito comuns. “No primeiro ano de vida, eles foram submetidos a uma cirurgia para ampliar a artéria pulmonar, que é estreita e obstruída, e retiraram a válvula pulmonar. Isso, aparentemente, não provocava outros sintomas”, explicou.
Porém, estudos realizados nos últimos 20 a 30 anos comprovaram que o fato desses pacientes não possuírem uma válvula pulmonar acaba sobrecarregando o coração. Os meninos ficaram com suas capacidades físicas limitadas, com dilatação do órgão e predisposição a arritmias, inclusive fatais, morte súbita e cansaço progressivo.
Enzo já tinha passado por cirurgia anterior devido a intercorrências e enfrentou um pós-operatório muito traumático: teve parada cardíaca, necessidade de implante de marcapasso e infecção. O histórico representava uma contraindicação para nova cirurgia. Diante desse quadro, Manica optou pelo implante de uma valva Edwards em posição pulmonar nativa. O procedimento foi realizado após reconstrução da artéria pulmonar com stents, também implantados com cateterismo. A opção é amplamente difundida como uso da válvula aórtica.
De acordo com o cirurgião, os benefícios da técnica são superiores. “Em uma cirurgia, nós temos toratocomia — operação em que a parede torácica é aberta para visualizar os órgãos internos —, parada circulatória com o coração parando de bater e com o sangue correndo em uma máquina e, quando o órgão volta a bater, ele percebe esse sangue como uma reação inflamatória”, enumera o cardiologista. Além disso, o pós-operatório é prolongado. “Esses pacientes não ficam menos de sete a dez dias internados, com drenos no coração, maior risco de infecção e necessidade de marcapasso, além de dor”, alerta.
A expectativa com o implante da válvula em Enzo é que o coração volte ao seu tamanho normal, diminua a sobrecarga que ele sofre e o risco de arritmias fatais e de morte súbita seja diminuído de forma importante, ou até abolido. “Está comprovado que os pacientes que permanecem sem a válvula por mais de duas décadas têm uma expectativa de vida menor, sofrem de arritmias atriais e ventriculares, que são fatais, têm cansaço muito maior e redução importante da capacidade física”, informa. O especialista observa ainda que, há três anos, esse tipo de procedimento era “impensável” no país. “Estamos promovendo o que há de melhor e mais complexo no campo da cardiologia pediátrica, servindo como hospital referência no setor”, acrescenta.
Enzo ficou internado por 48h apenas por precaução, pois ele já estava bem e apto para alta hospitalar em 24h. Segundo o chefe do Serviço de Pediatria, João Ronaldo Krauzer, apostar em procedimentos percutâneos — como é o caso do cateterismo como uma possibilidade não-invasiva, minimiza muito o risco e facilita na recuperação e no tempo de internação hospitalar. “Com isso, conseguimos atender casos mais complexos, diversificar procedimentos e não prolongar o tempo de internação. Se for comparar uma cirurgia via cateterismo com um procedimento de peito aberto, a recuperação passaria de 48h para pelo menos dez dias de hospitalização”, constata o especialista.
Caso Enzo
Hoje com onze anos — o aniversário foi comemorado no dia 29 de novembro —, Enzo nasceu de parto normal, com 39 semanas, e sua má formação cardíaca foi descoberta dois dias depois. Na época, não era obrigatória a realização de ecografia morfológica. A mãe, Sandra Lisboa, lembra que foi orientada a procurar um cardiologista e, desde então, o menino passou por diversos procedimentos e intercorrências. Com três meses, foi submetido à primeira cirurgia para a correção total da Tetralogia de Fallot. “Foram 60 dias internado e 24 dias na UTI. Durante esse processo, o Enzo teve várias intercorrências, entre elas uma parada cardíaca”, relembra.
Com um ano e três meses, ele passou por outra cirurgia para recuperação parcial de uma estenose. Apesar de ficar pouco tempo hospitalizado, um dos grampos junto ao peito (já que o órgão precisou ser aberto devido à cirurgia) quebrou e o outro foi rejeitado pelo organismo. Com quatro anos sofreu uma bradicardia e precisou colocar marcapasso. A correção de problemas no coração através da valva de Edwards veio como um alívio para que Enzo não precisasse mais passar por intervenções que exigissem a abertura da caixa torácica, medida contraindicada pelos próprios médicos. “A recuperação foi rápida e sem problemas”, comemora a mãe.
Caso João Guilherme
João Guilherme nasceu com a síndrome do tórax asfixiante, caracterizada pela má formação das costelas e tórax muito estreito, gerando problemas respiratórios. Ao longo da vida, ele passou por mais de 40 cirurgias, que permitiram a ampliação da caixa torácica com costelas protéticas, feitas de titânio. Para avançar no tratamento, no entanto, era necessário corrigir uma cardiopatia, que tornava qualquer cirurgia altamente arriscada.
Para repor a válvula pulmonar — responsável por regular o fluxo de sangue para os pulmões — e com a contraindicação de uma cirurgia de peito aberto pelo risco, a opção foi por um implante de duas válvulas Melody nas artérias pulmonares. O procedimento foi realizado há um ano, no Hospital Moinhos de Vento, e contou com a participação do cardiologista Carlos Pedra, do HCor, de São Paulo. Foi o primeiro deste tipo no Brasil e um dos únicos registrados na literatura médica mundial.
Crédito da foto anexa: Divulgação Hospital Moinhos de Vento