Gestão e Qualidade | 19 de outubro de 2017

O tratamento do “mau colesterol” e a remuneração baseada em resultados

Conheça os 6 pontos a serem considerados numa negociação
O tratamento do “mau colesterol” e a remuneração baseada em resultados

Em 2015, os medicamentos Repatha (evolucomab), da empresa biofarmacêutica Amgen, e Praluent (alirocumab), da Sanofi/Regeneron, foram aprovados pela agência reguladora de medicamentos dos Estados Unidos, a Food and Drug Administration (FDA). Estes medicamentos são inibidores da proteína PCSK9, e atuam para baixar o colesterol de lipoproteínas de baixa densidade (LDL-C), conhecido popularmente como “mau colesterol”.

Diversos estudos alertam que os dois medicamentos deveriam custar menos, face às respostas práticas em pacientes. Estas situações são elementos que ajudam a evidenciar a necessidade de rever conceitos frente à fixação do preço do medicamento e a barganha que deve ser estudada para a aquisição dos mesmos, principalmente pelas operadoras e hospitais junto à indústria farmacêutica.

A aprovação pela FDA foi baseada em ensaios clínicos que mostraram que os inibidores de PCSK9 reduziram os níveis do “mau colesterol” em cerca de 60% dos casos. Os mesmos ensaios apresentaram redução do risco de eventos cardiovasculares em cerca de 36% a 39% dos casos. O custo médio do tratamento com os medicamentos que tratam o colesterol é avaliado em 14 mil dólares por ano.

Já em março de 2017, foram publicados os resultados do estudo FOURIER, o primeiro de quatro grandes ensaios clínicos realizados para avaliar a eficácia dos inibidores de PCSK9 na prevenção de eventos cardiovasculares maiores.

O estudo concluiu que o evolocumab, inibidor de PCSK9, reduziu o risco de eventos cardiovasculares maiores, incluindo morte cardiovascular, infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral, hospitalização por angina instável e revascularização coronária, em 15%. O inibidor de PCSK9 também registrou redução de 27% no risco de infarto do miocárdio e 21% no risco de acidente vascular cerebral. Estes resultados ficaram abaixo das expectativas anteriores.

Enquanto os especialistas sugeriram que a Amgen teria que reconsiderar o preço do evolocumab, a empresa anunciou sua disposição em oferecer modelos de remuneração de contratos com novos conceitos para remover barreiras de acesso ao medicamento. Especificamente, a empresa ofereceu reembolsar as fontes pagadoras pelo custo do evolocumab para pacientes que tiveram infarto do miocárdio ou acidente vascular cerebral durante a utilização do medicamento.

O tratamento do “mau colesterol” e a remuneração baseada em resultados

 

Os impactos da remuneração baseada em resultados propostas pela Amgen para o tratamento do “colesterol ruim” é tema de pesquisa realizada por Inmaculada Hernandéz, professora assistente da Faculdade de Farmácia da Universidade de Pittsburgh, nos EUA. Em uma pesquisa recente da JAMA Internal Medicine, Hernandez simulou o impacto que esses contratos teriam sobre o preço do evolocumab para demonstrar que eles diminuiriam o preço anual em apenas 2% a 3%. Esses reembolsos seriam consideravelmente menores do que os descontos atuais oferecidos pelo evolocumab que, de acordo com a Amgen, gira em média entre 30% e 35%.

Mesmo após a aplicação de descontos atuais e reembolsos baseados em resultados, o preço anual da terapia com evolocumab seria de cerca de 9 mil dólares, o que é de 2 a 3 vezes o preço no qual o evolocumab seria rentável.

A pesquisa realizada por Hernandez levanta seis pontos importantes a serem considerados ao elaborar contratos baseados em resultados:

 1) os pagadores devem exigir que os fabricantes garantam uma quantidade de risco que compense os custos administrativos da implementação desses contratos. Os reembolsos propostos pela Amgen para evolocumab se traduziriam em uma redução de preço aproximadamente de 2,15% em todos os pacientes. Esta pequena porcentagem pode não ser suficiente para as seguradoras incorrerem em custos relacionados aos esforços administrativos necessários para implementar esses contratos.

2) as fontes pagadoras e os fabricantes também terão de negociar se os pagamentos do paciente também serão reembolsados (coparticipação), além dos custos garantidos pelo pagador. No último caso, os pagadores e os fabricantes terão que compartilhar informações.

3) um aspecto importante na negociação desses contratos será a seleção de resultados. De preferência, os resultados devem ser rastreáveis e capturar os pontos finais significativos, e não os resultados substitutos.

4) as negociações para contratos baseados em resultados também terão que considerar a duração do custo da terapia a ser reembolsada. Por exemplo, se um paciente tivesse um acidente vascular cerebral após o uso de evolocumab por cinco anos, não está claro se o pagador seria reembolsado pelo valor que corresponde aos cinco anos de terapia ou apenas um ano. Além disso, os fabricantes provavelmente tentariam estabelecer regras que tendem a favorecer a ´segurança´ financeira, ou seja, definiriam um tempo menor do que o ideal para que sejam ´penalizados´. Esses períodos variam em áreas terapêuticas e devem refletir um tempo adequado que permita que o medicamento em negociação demonstre eficácia clínica. Por exemplo, o contrato baseado em resultados entre Amgen e a operadora de planos de saúde Harvard Pilgrim para evolocumab exige que os pacientes utilizem o evolocumab por pelo menos seis meses antes de exigirem descontos no caso de um infarto de miocárdio ou um acidente vascular cerebral.

5) ao se engajar nesses contratos, os pagadores também terão que decidir se outros medicamentos na mesma classe terapêutica serão excluídas do formulário, ainda serão cobertas e reembolsadas por meio de modelos padrão, ou serão gerenciadas através de outros contratos baseados em resultados. É particularmente notável no caso da companhia de seguros Cigna, que se envolveu em contratos separados baseados em resultados para os dois inibidores de PCSK9 disponíveis.

6) finalmente, o estudo destaca que os pagadores e os fabricantes também terão que debater o papel dos intermediários, ou gerentes de benefícios farmacêuticos (Pharmacy Benefit Manager, ou PBM). Nesses contratos, é necessário determinar se os PBM´s também terão risco financeiro para os custos dos medicamentos na hora de definir os parâmetros da negociação. O conceito PBM é muito utilizado nos EUA (ainda incipiente no Brasil). Na prática, serve como um integrador entre a indústria farmacêutica, pacientes, seguradoras e governos, auxiliando na escolha de melhores usos de medicamentos levando em conta volume, preço, eficácia e outros indicadores.

A pesquisadora afirma que, para que os acordos de preços baseados em resultados se traduzam em um aumento do valor no uso e nos gastos farmacêuticos, sua formulação deve ser cuidadosamente projetada para explicar as peculiaridades da gestão dos benefícios farmacêuticos, bem como a relação custo-eficácia da terapia em avaliação.

Com informações do The American Journal of Managed Care.

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