Dia Mundial de Conscientização da Doença de Parkinson
Condição neurodegenerativa acomete cerca de seis milhões de pessoasO Dia Mundial de Conscientização da Doença de Parkinson, estabelecido pela Organização Mundial de Saúde (OMS), em 1998, é lembrado em 11 de abril. Instituída em homenagem ao cirurgião e farmacêutico inglês James Parkinson, que fez o primeiro relato da doença em 1817, a data tem como objetivo ampliar a conscientização sobre a condição neurodegenerativa que acomete cerca de seis milhões de pessoas em todo o mundo e incentivar a pesquisa e a inovação na área.
O Parkinson é uma condição crônica, sem causa conhecida, progressiva e degenerativa do sistema neurológico, que afeta os movimentos e a coordenação. Compromete a produção de dopamina, uma substancia química produzida pelo cérebro e que é responsável pela manutenção dos movimentos do corpo. Conforme avança, incapacita o paciente, fazendo com que atividades diárias simples, como tomar banho, comer e se vestir, tornem-se muito difíceis e, até, impossíveis.
Um levantamento da OMS apontou que o distúrbio atinge pelo menos 1% da população acima dos 60 anos. Embora se manifeste mais comumente após os 65 anos de idade, aproximadamente 15% das pessoas desenvolvem a doença precocemente, antes de atingirem os 50 anos. Segundo dados do Ministério da Saúde, a prevalência no Brasil é de 100 a 200 casos para cada 100 mil habitantes.
Apesar de não ter cura, os pacientes têm à sua disposição opções terapêuticas capazes de retardar o avanço da doença e prolongar a qualidade de vida. Segundo levantamento do Jornal do Brasil, estima-se que há cerca de 400 mil brasileiros com a doença, e uma parcela de casos ainda não diagnosticados.
Para a neurologista Roberta Saba, colaboradora do Departamento de Neurologia da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), a doença pode ser bem controlada por tratamentos, com pacientes convivendo com a doença por 30 anos, exemplifica. “Em muitos casos, o processo de envelhecimento e outras doenças relacionadas à idade são mais impactantes do que a progressão do Parkinson”, diz a especialista.
O objetivo do tratamento é controlar os sintomas da doença. Nos primeiros estágios, medicamentos são indicados para aliviar as manifestações motoras e não motoras, enquanto a fisioterapia ajuda a evitar a rigidez muscular. Ao longo do tempo, no entanto, os benefícios dos medicamentos frequentemente diminuem e o paciente volta a vivenciar sintomas como tremor e perda de coordenação motora. Nesses casos, quando a doença de Parkinson já está em um estágio avançado, a cirurgia para o implante de um neuroestimulador é a conduta mais indicada.
Uma possibilidade de tratamento é a cirurgia para a colocação de um dispositivo responsável pela Estimulação Cerebral Profunda (DBS, sigla em inglês para Deep Brain Stimulation).
A terapia consiste no implante de eletrodos, que levam estímulos elétricos em áreas específicas do cérebro para ajudar no controle do movimento. A terapia usa um neuromodulador – dispositivo semelhante a um marca-passo –, implantado no corpo para fornecer estimulação elétrica a regiões precisamente planejadas dentro do cérebro.
A estimulação dessas regiões permite que os circuitos do cérebro que controlam o movimento funcionem adequadamente, além de melhorar as demais complicações motoras da doença, como rigidez, lentidão e alterações do equilíbrio, e não motoras, como distúrbios do sono e dores de cãibras musculares (distonia). “Mais de 135 mil pessoas em todo o mundo já foram submetidas à cirurgia para implantação do neuromodulador, e cerca de 90% dos pacientes apresentaram melhora significativa dos sintomas”, afirma o neurocirurgião Murilo Marinho, do Departamento de Neurocirurgia da UNIFESP.
O neuroestimulador é implantado sob a pele do peito ou na área abdominal e ligado a eletrodos colocados nas partes do cérebro que controlam o movimento. A DBS é reversível e pode ser ajustada às necessidades de cada paciente. O sistema consiste de três componentes implantados:
– Eletrodo: um cabo-eletrodo é constituído de quatro finos fios isolados e enrolados com quatro eletrodos em sua ponta. O cabo-eletrodo é implantado no cérebro;
– Extensão: uma extensão conecta-se ao cabo-eletrodo e passa sob a pele desde a cabeça, através do pescoço, até a parte superior do peito;
– Neuroestimulador: conecta-se à extensão; esse dispositivo pequeno e hermeticamente fechado, semelhante a um marca-passo cardíaco, contém uma bateria e componentes eletrônicos; o neuroestimulador é geralmente implantado sob a pele, no peito, abaixo da clavícula (dependendo do paciente, um cirurgião poderá implantar o neuroestimulador no abdômen); o dispositivo produz os pulsos elétricos necessários à estimulação.
Para aprofundar o assunto, o jornal francês Le Figaro elaborou algumas questões que ajudam a entender o Parkinson e seu tratamento:
Quais são os sintomas?
A doença neurodegenerativa está relacionada com a destruição de neurônios dopaminérgicos. “Esta população de neurônios está presente em uma determinada região do cérebro chamada substância negra (porção heterogênea do mesencéfalo responsável pela produção de dopamina)”, diz o Dr. Marc Vérin, chefe do Instituto de Clínicas de Neurociência de Rennes. A dopamina é essencial para o controle dos movimentos do corpo: a redução da concentração ligada ao desaparecimento gradual dos neurônios é responsável pela doença. “Mas outros neurônios da substância negra podem ser alcançados”, diz Dr. Vérin. Isto explica em parte a heterogeneidade dos sinais clínicos. A doença de Parkinson é principalmente uma doença de movimentos. Os pacientes apresentam sintomas que prejudicam o dia a dia, mas para outras pessoas, não são visíveis. “Existem duas grandes categorias de sinais: sintomas motores, incluindo tremores bem conhecidos do público, lentidão de movimentos e rigidez, mas a doença também ocorrerá com sintomas não-motores”, diz o Dr. Luc Defebvre, neurologista do Hospital Universitário de Lille. Para a maioria das pessoas, um tremor insistente é o sinal mais conhecido. Mas esta não é a mais comum: ela afeta 64% dos pacientes, de acordo com uma pesquisa realizada pela Associação Francesa de Parkinson. O tremor de repouso, isto é, quando atinge uma parte do corpo que não está envolvida em qualquer movimento, é muitas vezes limitado a um lado do corpo e ocorre em um membro superior (braço), ou, mais raramente, em um membro inferior. O sinal mais comum é descrito pelos pacientes por um movimento lento, que afeta 88% deles. A perda de dopamina leva à perda de movimentos automáticos e, por consequência, mais lento. Como disse Jean-Martin Charcot, um famoso neurologista francês, o paciente com Parkinson está condenado ao movimento voluntário em perpetuidade. Coisas simples como atravessar uma porta, amarrar os tênis são eventos difíceis. A rigidez ou hipertensão complementa a chamada “tríade parkinsoniana”. “Eu tive cãibras que apareceram sem aviso. Então eu não podia carregar uma criança nos braços por medo de deixá-la cair. Outro exemplo, os movimentos para andar ficam mais complicados”, falou Didier Robiliard, presidente da Associação France Parkinson, diagnosticado com a doença aos 47 anos.
Quais são os sinais não motores da doença?
Sintomas não-motores são muito variados e, segundo recentes pesquisas, têm crescido nos últmos anos. É, provavelmente, o resultado do impacto da doença sobre as estruturas cerebrais não-dopaminérgicas. Exemplos são problemas de sono, salivação excessiva, sonolência diurna excessiva, fadiga, dor, constipação (que afeta 60% dos pacientes), micção urgente, depressão, alucinações , desordens cognitivas. Estes sinais podem aparecer tardiamente no curso da doença, ou ocorrer muito antes do aparecimento de sintomas motores. “A perda do olfato, constipação, fadiga, passos lentos, os transtornos de humor são os principais sinais muito precoces que podem indicar a doença de Parkinson. Mas, constatados isoladamente, eles não são muito confiáveis. É a soma de diversos fatores que gera valor preditivo”, explica a professora Marie Vidailhet, neurologista do Hospital Universitário Pitié-Salpêtrière. “No entanto, sabemos que as pessoas com distúrbio de comportamento do sono têm um risco aumentado de desenvolver Parkinson”, diz ela. Estes distúrbios são caracterizados pelo enfraquecimento muscular durante o sono. Resultado: os pacientes vivem os seus sonhos e realizam seus movimentos correspondentes à ação do sonho.
Quem é afetado pela doença?
Ao contrário da crença popular, não afeta apenas idosos. A idade média dos pacientes no primeiro diagnóstico é de 59 anos. É raro antes dos 40 anos: 10% dos casos ocorrem nesta idade. Em torno de 8 mil novos casos são diagnosticados no mundo e um total de 1% da população acima de 60 anos foi diagnosticada. Os jovens podem ser afetados por formas genéticas extremamente raras.
Quais são as causas?
Na maioria dos casos, a causa permanece desconhecida. Certamente, existe uma suscetibilidade genética, mas é relativamente baixa. Esta não é uma doença hereditária, embora haja 5% de formas genéticas. A responsabilidade de pesticidas, entre os agricultores, também é cada vez mais clara. Mas a idade é um fator de risco importante. A degeneração de neurônios dopaminérgicos seria promovida por fatores genéticos e ambientais. Não existe apenas uma doença de Parkinson, mas formas diferentes. O Parkinson idiopático é responsável por aproximadamente 80% a 90% dos casos observados, e 10% a 20% são agrupados sob o termo de síndromes parkinsonianas. O mais comum é causada por drogas como as neurolépticos (droga que exerce ação calmante sobre o sistema nervoso).
Como é diagnosticado?
“O diagnóstico é clínico e vai permanecer assim por algum tempo. É o especialista, analisando o que sente o paciente, que vai fazer esse diagnóstico”, diz Marie Vidailhet. O primeiro critério para a identificação é a presença de pelo menos dois sinais motores. Alguns deles podem aparecer muito cedo (como o fato de parar de escrever, ou ter muita dificuldade para tal), o que é uma forma de acinesia. “Gestos desportivos menos precisos ou o desempenho mais lento relacionado à execução de um movimento, como por exemplo, uma distonia (distúrbio neurológico do movimento) do pé pode ser sinal indicador”, diz o professor Dr. Luc Defebvre. Mas esses sinais sutis não sugerem automaticamente a necessidade de uma consulta especializada. Além disso, a doença pode começar por sinais não motores: O diagnóstico requer alguma perícia e testes para comprovar. “É um tsunami. A doença de Parkinson é uma dor, tanto física como moral. Especialmente aos olhos dos outros”, diz Dr. Luc Defebvre. Já para a professorea Vidailhet, o paciente deve aprender a viver em um novo ambiente. “Aconselho os pacientes se identificarem com a doença, para preservar a sua personalidade e manter uma vida social”. Nenhum exame biológico ou radiológico é útil. A ressonância magnética é muitas vezes proposta para excluir algumas das causas responsáveis pelo Parkinson. Técnicas de imagem sofisticadas podem fornecer informações, que precisam ser analisadas por especialistas. “Testes vão verificar a perda de dopamina. Mas os resultados de triagem podem expressar diferentes sintomas clínicos porque o cérebro vai compensar a perda de dopamina de maneira diferente”, alerta Dra. Vidailhet. Quando os sintomas clínicos aparecerem, de 50% a 70% dos neurônios dopaminérgicos já estão alterados: a doença está presente há vários anos. Durante este período de silêncio, o cérebro compensa a redução de dopamina através da sua plasticidade. Detectar a doença antes do aparecimento dos sinais clínicos é útil apenas como parte da investigação. No momento não há nenhum tratamento que pode parar seu progresso.
Como evolui a patologia?
Os sintomas e a taxa de alteração do estado de saúde, são muito diferentes de um paciente para outro. Mas esquematicamente, o curso natural da doença ocorre em três períodos. Uma vez diagnosticado, o tratamento é proposto. O objetivo é substituir a dopamina que desapareceu. Porque, como lembra o professor Yves Agid, diretor científico do Instituto do Cérebro e da Medula Espinhal em Paris, “na doença de Parkinson, o cérebro faz com a dopamina o que o diabetes faz com a insulina”. O tratamento é extremamente eficaz e vai corrigir a deficiência em dopamina e ajudar a controlar os sintomas da doença: tremores, rigidez e lentidão. No entanto, depois de alguns anos, o tratamento em si irá causar complicações motoras. “As oscilações de eficiência de processamento estão causando recorrência dos sintomas parkinsonianos do dia a dia e dos movimentos involuntários anormais chamados discinesia”, acrescenta o Prof. Damier. Este é o período de o assim chamado “on-off” : desconforto varia durante o dia, de forma imprevisível. Períodos de bem-estar (“on”) alternam com bloqueio movimentos períodos (“Off”) ou involuntários. O terceiro período é o mais debilitante, porque desenvolve sintomas em que o tratamento é longo. Distúrbios aumentam com a consequente perda de equilíbrio e quedas. Outros transtornos: dificuldade em falar e o surgimento ou agravamento de distúrbios cognitivos, descreve Philippe Damier neurologista do Hospital Universitário de Nantes.
Quais são os tratamentos com drogas?
Não existe atualmente nenhum medicamento para prevenir ou curar a doença. O único tratamento disponível suporta os sintomas da doença, que facilitam atividades diárias, mas não há nenhuma obrigação de tratamento. Quando os sintomas se tornam incômodos, são necessários medicamentos. “O objetivo é compensar a falta de dopamina no cérebro. Um tratamento de referência é de levodopa (ou L-Dopa), o precursor imediato da dopamina, são moléculas que imitam o efeito da dopamina nos neurônios. Outros fármacos atuam por inibição de enzimas que degradam a dopamina no cérebro. “Uma droga como a rasagilina, um inibidor irreversível de monoamina oxidase-B utilizado como uma monoterapia que destroi a dopamina, pode ter um efeito neuroprotetor”, salienta Philippe Damier. Os tratamentos são eficazes e relativamente fáceis de seguir durante o período inicial. Então, com o aparecimento de flutuações motoras e não motoras, eles se tornam mais onerosos para os pacientes que vivem com medicação que devem ser ingeridas em horários fixos a cada dia do ano, ao longo da vida. “Cada paciente tem seu perfil progressivo”, pondera o Dr. Luc Defebvre. “Mas nenhum desses remédios nos leva a uma vida confortável”, explica Didier Robiliard. Além disso, estes tratamentos nem sempre são eficazes sobre os sintomas não-motorizados não relacionados com perturbações da dopamina. Quando os sintomas motores são resistentes ao tratamento, a solução cirúrgica por estimulação cerebral profunda pode então ser proposta sob certas condições. Se houver contra-indicações para a cirurgia, as alternativas estão sendo desenvolvidas, como a “bomba de apomorfina”, subcutaneamente injetada com um agonista da dopamina. A administração contínua intestinal de levodopa é menos comum porque requer a instalação permanente de sensores.
Quais são os efeitos secundários dos medicamentos?
Em relação a uma pessoa doente que passou pelos três estados e já parou seu tratamento, em 45% dos casos esta pausa foi ligada a efeitos colaterais. A levodopa, droga de referência, é conhecida por causar após alguns anos de monitorização, perturbações do movimento ou discinesias. Um terço (1/3) dos pacientes, em média, sofre com discinesias. Mas isso é raros quando é usado um agonista da dopamina. Portanto, quando colocados no mercado, estas moléculas foram muitas vezes prescritas como primeira linha de tratamento. Mas estes medicamentos alcançaram os holofotes e estavam ligados à pacientes viciados. “Hoje sabemos que 15% dos doentes com agonistas da dopamina tem um transtorno do controle de impulso que é difícil de prever”, diz Dr. Damier. Ataques de ciúme incessantes, desejo sexual incontrolável, o vício relacionado ao jogo. Essas doenças podem transformar a vida do paciente e da sua família em um inferno. “Há provavelmente uma predisposição genética. Mas, por ora, apenas o histórico do paciente dá alguma pista”, diz o neurologista. Os especialistas estão mais atentos e quando os pacientes têm um histórico de dependência do tabaco, álcool, bulimia, ou hiperatividade profissional. Quando os efeitos secundários se generalizam, é o momento de ajustar as dosagens e parar o tratamento.
Qual é o papel da reabilitação?
A doença de Parkinson é uma causa comum de incapacidade. Portanto, a reabilitação ocupa um lugar importante na sua recuperação. Três quartos (3/4) dos pacientes usaram a fisioterapia em algum momento, de acordo com dados publicados no “Livro Branco” publicado pela Associação Francesa de Parkinson. “A fisioterapia é eficaz desde que mantida a atividade física regular. Esta é a responsabilidade do paciente, continuar praticando atividade física, além de fisioterapia”, diz Vidailhet. No entanto, estudos têm demonstrado que pacientes com Parkinson adotam espontaneamente um estilo de vida menos ativo. “No entanto, os exercícios minimizam os sintomas e deixam o paciente mais sensível ao tratamento”, revela Dr. Marc Vérin.
Onde está a investigação?
“Estamos passando por uma revolução na compreensão das doenças neurodegenerativas, em particular o Parkinson”, confirma Dr. Vérin. Há uma série de pesquisas interessadas no papel de uma proteína, a alfa-sinucleína. “Esta proteína leva a uma disputa anormal. Estes acúmulos, presentes em pacientes com demência com corpos de Lewy (DCL – uma doença neurodegenerativa progressiva que pode afetar a qualquer tipo de pessoa, sendo mais comum a ocorrência em idosos), são distribuídos de um neurônio para outro, o que poderia explicar a progressão da doença”, diz o pesquisador. Este trabalho pode conduzir à utilização de anticorpos dirigidos contra esta proteína anormal, bloqueando a doença. Outras estudos focam: o papel de mitocôndrias em degeneração neuronal ou na inflamação do cérebro. A descoberta de genes responsáveis por formas familiares da doença também irá ajudar a compreender melhor os mecanismos do Parkinson.
Como conclui o texto do Le Figaro, “o remédio que irá superar a doença será múltiplo”. Provavelmente será “uma terapia que combinará vários mecanismos ao mesmo tempo”, resume o professor Yves Agid.
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