Estatísticas e Análises | 6 de outubro de 2016

O papel protetor das estatinas no manejo das doenças cardiovasculares

Benefícios estão bem estabelecidos e são superiores aos riscos de efeitos colaterais
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As doenças cardiovasculares são a causa principal de morte no Brasil. A estimativa da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) é de que cerca de 950 pessoas morram diariamente no País devido às doenças cardiovasculares.

Na maioria dos casos, são causadas pela combinação de fatores como hipertensão arterial, diabetes, tabagismo, obesidade e colesterol alto no sangue. Os fatores de risco podem ser relacionados a condições médicas; estilo de vida e, fatores hereditários. Como forma de prevenção dessas doenças e redução da mortalidade, as estatinas são usadas no país desde a década de 1980 por milhões de pessoas com colesterol elevado. Essas drogas (como a sinvastatina, a atorvastatina e a rosuvastatina) bloqueiam no fígado a enzima responsável pela produção do colesterol e podem “atrasar” a fabricação de LDL ( o ” mau colesterol”). Assim, leva ao aumento da produção de HDL ( o ” bom colesterol”).

LDL e HDL são lipoproteínas responsáveis em transportar o colesterol do fígado para os tecidos (LDL) e dos tecidos para o fígado (HDL). Concentrações elevadas de LDL podem se depositar nas camadas internas da parede arterial. Junto com outras substancias presentes no sangue, formam a placa aterosclerótica, responsável pela obstrução das artérias e que causa a aterosclerose. Já o HDL protege contra o infarto do miocárdio. Concentrações  baixas de HDL (inferiores a 40 mg/dl), aumentam o risco de doença cardiovascular.

Um artigo do jornal Folha de São Paulo, assinado por Roberto Kalil Filho (diretor geral do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP e do Centro de Cardiologia do Hospital Sírio-Libanês) e Raul Santos (diretor da unidade de lípides do Instituto do Coração e assessor do Centro de Medicina Preventiva e do Hospital Israelita Albert Einstein, presidente eleito da Sociedade Internacional de Aterosclerose), aborda o papel protetor das estatinas, salientando que seu efeito “foi demonstrado em robustos estudos que incluíram mais de 170 mil indivíduos com variados fatores de risco para a doença cardiovascular”.

Recentemente a revista britânica The Lancet publicou um extenso e complexo artigo sobre os benefícios e efeitos colaterais das estatinas. “Como todo tratamento preventivo na cardiologia, seu benefício demonstrou ser proporcional ao grau de risco de eventos cardiovasculares. Indivíduos de maior risco, como os que já apresentaram um problema cardiovascular ou aqueles com vários fatores de risco, têm o maior benefício. É sabido que os benefícios das estatinas decorrem principalmente de sua capacidade em baixar o LDL-colesterol do sangue, apesar da existência de outros efeitos desses medicamentos”.

Durante os últimos 20 anos, a indústria farmacêutica transformou as estatinas em um dos fármacos mais vendidos, com milhões de usuários diários. Porém, também é crescente o aumento de relatos de efeitos colaterais que se manifestam meses após o início da terapia.

Um artigo publicado no American Journal of Cardiovascular Drugs, citou cerca de 900 estudos sobre os efeitos adversos das estatinas. Entre as complicações mais recorrentes estão os problemas musculares, cognitivos, sexuais e de memória, além de dor ou dormência nas extremidades.

Os especialistas do InCor, mesmo admitindo o risco de efeitos colaterais, frisam que “estudos mostram claramente que uma diminuição do LDL-colesterol de 80 mg/dL é altamente eficiente para proteger o sistema cardiovascular principalmente de pessoas com doença cardíaca prévia, reduzindo a ocorrência de infartos, acidentes vasculares cerebrais isquêmicos (AVC) e morte”.

O uso de estatinas pode ocasionar miopatia (fraqueza ou aumento importante de enzimas musculares), dores musculares, diabetes (em pessoas predispostas à desenvolver a doença) e um baixo número de casos de sangramento cerebral.

“Uma simples aritmética mostra claramente que o benefício supera em muito os riscos do tratamento e que as estatinas prolongam a vida quando bem indicadas. O medo dos efeitos colaterais desses medicamentos e sua suspensão, secundários à descrença sobre o papel do colesterol como causa da aterosclerose, dogma dos chamados céticos do colesterol, pode causar efeitos colaterais graves como 25% mais chance de se ter um infarto do miocárdio, e 18% mais chance de morte, como mostrado em um estudo realizado na Escandinávia”, diz o artigo da Folha. “As estatinas devem ser prescritas após uma extensa avaliação do risco de problemas cardiovasculares, e mantidas continuamente, pois o benefício será proporcional ao tempo de seu uso. Uma boa notícia é que em nosso país todas as estatinas são genéricas e pelo menos duas delas são fornecidas pelo SUS”.

Uma nova classe de anticorpos monoclonais para baixar o colesterol foi recentemente aprovada pela Anvisa. São as moléculas que atacam o alvo molecular PCSK9, impedindo que ele prejudique a remoção do LDL-colesterol da corrente sanguínea por células do fígado. “Contudo, além dos elevados custos, esses novos fármacos precisam ainda percorrer um grande percurso para mostrarem-se superiores às estatinas na prevenção das doenças cardiovasculares e em sua segurança”.

Estudos controversos sobre estatinas

A pesquisa Provete-It, de 2008, patrocinada pela Bristol Myers-Squibb, afirmava que não existe limite para baixar o colesterol. O estudo comparou duas drogas: Lipitor (Pfizer) e Pravachol (Bristol Myers-Squibb). Foram acompanhados 4.162 pacientes que tiveram infarto ou angina instável. Metade tomou Lipitor e metade tomou Pravachol. Os que tomaram Lipitor tiveram uma redução maior do LDL (62 contra 95). No grupo Lipitor houve uma redução de 32% no LDL e 16% em todas as causas de mortalidade. Mas, os tais 16% foram uma redução do risco relativo e não risco real. A redução absoluta da taxa de mortalidade em ambos os grupos foi de 1% – uma queda de 3,2% para 2,2% em dois anos. Ou 0,5% ao ano. No entanto, a redução do risco absoluto de morte em 0,5% usou a taxa de 16%, uma taxa relativa, ocultando dados dos efeitos colaterais: alteração das enzimas hepáticas em 3,3%; e a descontinuação do tratamento durante a pesquisa por efeitos colaterais em 33%.

Em 2003, médicos do Beth Israel Medical Center, em Nova York, examinaram a placa coronariana em 182 pacientes que tomavam estatina. Um grupo usava doses altas (mais de 80mg), enquanto outro usava doses habituais. Através de tomografias, avaliou-se o tamanho das placas antes e depois do tratamento. Mesmo com a redução do LDL, não houve diferença entre os grupos. Ao contrário, houve um incremento na ordem de 9,2% no aumento da placa em ambos os grupos.

Uma advertência oficial, feita no final de 2014 aos médicos da Grã-Bretanha, solicitava que os profissionais não iludissem os pacientes em relação aos benefícios das estatinas e amenizando a preocupação com a interrupção do tratamento com esta droga. O documento destacava uma pesquisa feita pela Pfizer, baseada em dados públicos, onde se concluiu que o risco de morte após interrupção do uso da droga, mesmo para pacientes diagnosticados com doença do coração, é de 1 em 150 mil.

Segundo pesquisa publicada em 2015 na Expert Review of Clinical Pharmacology, pessoas que tomam as drogas (12 milhões de britânicos, ou um em cada quatro adultos) estão mais propensas a sofrerem o endurecimento das artérias, uma das principais causas de problemas cardíacos. Os investigadores descobriram que estas drogas bloqueiam um processo que protege o coração, o que pode causar ou piorar a insuficiência cardíaca.

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