Estatísticas e Análises | 27 de junho de 2020

Desabastecimento de medicamentos essenciais no combate à Covid-19 preocupa hospitais

No RS, alguns hospitais já relatam problemas de abastecimento
Desabastecimento de medicamentos essenciais no combate à Covid-19 preocupam hospitais

Entidades representativas de hospitais estão preocupadas com a falta de medicamentos para sedação, usados no processo de intubação (ou entubação) em pacientes com complicações decorrentes do coronavírus (Covid-19). O problema tem afetado hospitais que atendem ao SUS e a rede privada. Segundo o Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass), secretarias estaduais de saúde relatam ter dificuldade de abastecimento desses remédios nas últimas três semanas. O portal Setor Saúde falou com representantes do segmentos hospitalar e de hospitais no Rio Grande do Sul.

Das 25 secretarias que responderam ao levantamento do conselho, feito no começo de junho, 24 apontaram falta do bloqueador muscular, um dos medicamentos listados pela entidade. Ainda segundo a pesquisa, mais da metade das secretarias estão com falta pelo menos de 11 dos 13 medicamentos com desabastecimento relatado. Na lista, há medicamentos sedativos, anestésicos e bloqueadores neuromusculares utilizados na intubação orotraqueal.

CNSaúde: faltam 17 tipos de sedativos

A Confederação Nacional de Saúde (CNSaúde) também recebeu relatos, nas últimas duas semanas, apontando para a falta de sedativos. “Temos recebidos informações de grandes redes que têm tido dificuldade de comprar esse tipo de medicamento”, afirma Bruno Sobral, secretário-executivo da confederação. Segundo ele, a indústria se queixa do preço dos princípios ativos, geralmente importados, que subiu com o aumento do dólar e com a alta demanda mundial por esses tipos medicamento. Nesse cenário, a indústria não está conseguindo comprar e vender pelo preço estipulado, explica Sobral.

A CNSaúde contabilizou 17 tipos de sedativos em falta baseada nas informações recebidas. “Os hospitais precisam desse medicamento porque não conseguem fazer a intubação. Faz-se um esforço enorme para criar leitos, comprar respiradores, e aí não consegue entubar? ”, diz ele.

Ações

Ao Portal Setor Saúde, a CNSaúde disse estar atenta e acompanhando a questão muito de perto. Nesta semana, representantes da instituição participaram de reuniões no Congresso Nacional sobre este assunto e, na próxima semana, a entidade irá promover uma reunião com representantes da indústria farmacêutica e de distribuição, justamente para buscar soluções ágeis para o desabastecimento destes insumos.

“A gente acredita que tanto a indústria quanto as autoridades sanitárias estão cuidando disso e que haverá uma solução para o caso em breve”, avalia o secretário executivo da CNSaúde, Bruno Sobral.

Norte e nordeste

A CNSaúde registra um maior número de relatos de falta de medicamentos no Norte e no Nordeste do país, regiões que ficam mais distantes de São Paulo e Rio de Janeiro, principais centros logísticos do país e por onde costumam chegar os insumos no Brasil. No entanto, mesmo nesses últimos dois estados, há registro de falta do medicamento.

Segundo o Conass, o Ministério da Saúde respondeu a solicitação de apoio que a própria instituição fez e afirmou ter iniciado adoção de medidas para regularizar os estoques desses medicamentos.

Sedativos ficam escassos e até 287% mais caros, dizem hospitais privados

Além de dificuldade para encontrar medicamentos essenciais para sedar e entubar pacientes graves da Covid-19, hospitais privados apontam aumento no valor destes fármacos durante a pandemia. Segundo levantamento realizado entre associados da Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp), o valor dos sedativos cloreto ou maleato de midazolam, por exemplo, subiu 287,44% e 64%. Mas agora, é a dificuldade de abastecimento que mais preocupa, pois ambos são vitais para ajudar os pacientes a enfrentarem o tratamento (intubação) em ventilação mecânica.

O medicamento mais escasso é o besilato de cisatracúrio, segundo a entidade. Além do aumento de 50% no valor, 83% dos hospitais ligados à Anahp têm encontrado dificuldade para a compra deste produto em função da escassez do mesmo no mercado. Os dados foram coletados em 27 de maio.

A Associação elencou 7 produtos usados no procedimento de entubar pacientes. O aumento de preços de três destes produtos está acima de 100%.

A entidade afirma que hospitais privados vão notificar a Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED), caso o valor do fármaco ultrapasse o preço tabelado pelo governo.

No RS, alguns hospitais já relatam problemas de abastecimento

No Rio Grande do Sul, os relatos variam, dependendo de cada instituição. Em duas recentes entrevistas concedidas ao Portal Setor Saúde, diretores do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) e do Grupo Hospital Conceição (GHC) relataram situações distintas.

O diretor administrativo do HCPA, Jorge Bajerski, disse que, com a pandemia, a situação da distribuição de medicamentos ficou mais crítica. “Medicamentos específicos, principalmente para pacientes na UTI que estão entubados, que incluem analgésicos, relaxantes musculares, anestésicos, começamos a ter dificuldade de falta no mercado. Já sinalizamos a situação para o Ministério da Saúde e para todos os órgãos que fazem a gestão da saúde no país para ajudarem com isso”, destaca.

Bajerski citou o encaminhamento de uma planilha, no dia 22 de junho, solicitada pela Federação dos Hospitais e Estabelecimentos de Saúde do Rio Grande do Sul (FEHOSUL), que em parceria com o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), está identificando a falta de itens nos estoques para que sejam feitas interlocuções junto a órgãos do governo, indústria farmacêutica e distribuidoras. O presidente da FEHOSUL, Cláudio Allgayer, vem conversando com parlamentares para buscar uma solução aos problemas: “estamos em contato diário com lideranças da indústria e com o governo, dentre eles parlamentares que possam articular soluções junto ao Ministério da Saúde. Acredito que é situação momentânea, mas não menos preocupante”, disse.

A situação está controlada no Grupo Hospitalar Conceição, como aponta o diretor técnico Francisco Paz, “No Hospital Nossa Senhora da Conceição não há falta de nenhum medicamento. Nós fizemos um grande estoque preventivo de todos os medicamentos já no início da pandemia”, disse.

Além do Clínicas e do GHC, outras instituições gaúchas foram consultadas pelo Portal Setor Saúde sobre o abastecimento em suas instituições. Confira:

Hospital Divina Providência: “Identificamos problemas de desabastecimento, em especial de bloqueadores neuromusculares e acionamos planos de contingência. O setor de Compras já está fazendo orçamentos com outros fornecedores”, afirma Willian Dalprá, diretor técnico do Divina Providência.

Hospital Santa Lúcia, de Cruz Alta: O Hospital relata que está com “com muita dificuldade de abastecimento”. A instituição enviou uma lista com 11 medicamentos que estão em falta, entre eles fentanila, dopamina e ketamina.

O Hospital de Caridade de Erechim:  De acordo com a Instituição, há falta de medicamentos voltados a anestesia e sedação de pacientes. No entanto, a instituição afirma que ainda está conseguindo administrar os estoques sem comprometer o atendimento dos pacientes. “A demanda nacional tem sido muito grande e os laboratórios estão com problemas para aumentar sua produção nessa proporção. Com a entrada do Ministério da Saúde  nesta análise, talvez seja possível acelerar importações e resolver isso com mais rapidez. Porém, o que vemos hoje é um consumo muito grande com a aceleração da pandemia no Sudeste. Monitoramos diariamente nossos estoques e buscamos alternativas junto aos profissionais médicos quando percebemos sinais de risco”, destacou Vanderlei Kusiak, gerente de suprimentos do Hospital de Caridade de Erechim.

Hospital Virvi Ramos, de Caxias do Sul: O hospital da serra gaúcha não apresenta desabastecimento, porém, há preocupação com os próximos dias, caso as internações aumentem. “No momento não estamos com falta de medicamentos, em função de planejamento antecipado de compras que realizamos no início do ano e também pelo fato que não tivemos a UTI 100% ocupada com pacientes diagnosticados com a Covid-19. Porém, temos muita preocupação, pois a medida que as UTIs aumentarem a ocupação, aumentará o consumo e estamos com dificuldades de adquirir e repor alguns insumos, já que a indústria farmacêutica relata falta de matéria prima. Atualmente há pouca oferta e preços abusivos. Já enviamos ofício para a secretaria municipal e estadual de saúde, que estuda uma maneira de viabilizar a reposição destes medicamentos indispensáveis ao tratamento de pacientes com a Covid-19″, disse Cleciane Doncatto Simsen, diretora executiva do Hospital Virvi Ramos, de Caxias do Sul.

Assim como o GHC e Virvi Ramos, os hospitais Moinhos de Vento e São Lucas da PUCRS afirmam que o abastecimento segue em situação normalizada nas instituições.



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