Mundo | 29 de janeiro de 2021

Alemanha lança dúvidas em vacina da AstraZeneca para idosos, mas especialistas britânicos defendem o imunizante

Fábrica da AstraZeneca foi inspecionada em meio a conflito de atraso na entrega das doses contra a Covid
Alemanha não recomenda vacina da AstraZeneca para idosos, mas especialistas britânicos apoiam o imunizante

O comitê de vacinas da Alemanha informou que o imunizante contra a Covid-19 desenvolvido pela farmacêutica AstraZeneca, feito em parceria com a Universidade de Oxford (vacina já autorizada emergencialmente no Brasil) deve ser aplicado apenas em pessoas com idade entre 18 e 64 anos, pois, de acordo com o comitê, não há dados suficientes sobre eficácia nas demais faixas etárias. Entretanto, especialistas britânicos se manifestaram a favor do imunizante.

A recomendação alemã foi feita na quinta-feira (28), às vésperas de o órgão regulador da Europa julgar se a vacina poderá ser utilizada nos países do continente.  A Agência Europeia de Medicamentos (EMA, na sigla em inglês) deve decidir na sexta-feira se aprova a vacina para uso em toda a União Europeia (UE).


“Atualmente, não há dados suficientes disponíveis para avaliar a eficácia da vacina a partir dos 65 anos de idade”, informou o Comitê Permanente de Vacinação do Instituto Robert Koch, também conhecido como Stiko, em nota aprovada pelo ministério da saúde alemão. “A vacina AstraZeneca, ao contrário das vacinas de mRNA, só deve ser oferecida a pessoas com idade entre 18 e 64 anos”, acrescentou.


A avaliação da Stiko foi baseada nos mesmos dados de teste publicados pela revista médica The Lancet em 8 de dezembro. Também em dezembro, a União Europeia aprovou o desenvolvimento da vacina da Pfizer, que é feita em parceria com o laboratório alemão BioNTech, e, em janeiro, autorizou a aplicação do imunizante da Moderna.

A AstraZeneca ainda não comentou a recomendação feita pelos alemães. Na segunda-feira (25), a farmacêutica negou que sua vacina não seja eficaz para pessoas com mais de 65 anos. A declaração foi feita depois após cientistas declararem na imprensa alemã que temiam que a vacina não fosse aprovada na União Europeia para uso em idosos.

O ministério da Saúde alemão disse que das 341 pessoas vacinadas no grupo com 65 anos ou mais, apenas uma foi infectada com o coronavírus, o que significa que o painel de especialistas em vacinas não conseguiu obter uma declaração estatisticamente significativa sobre essa faixa etária.


O presidente-executivo da AstraZeneca, Pascal Soriot, disse que a empresa tinha menos dados do que outras farmacêuticas sobre os idosos porque começou a vacinar este grupo mais tarde. “Mas temos dados sólidos que mostram uma produção muito forte de anticorpos contra o vírus em idosos, semelhante ao que vemos em pessoas mais jovens”, disse Soriot ao jornal Die Welt em entrevista no início desta semana.


Atrasos

A Alemanha também enfrenta o problema com doses limitadas de vacina depois que a Pfizer e a AstraZeneca anunciaram atrasos nas entregas nas últimas semanas. O ministro da Saúde, Jens Spahn, alertou que a escassez duraria até abril.

Em dezembro, o Reino Unido se tornou o primeiro país a aprovar o uso da vacina desenvolvida pela AstraZeneca. O governo do país disse que não recomendaria uma vacina em vez de outra para diferentes grupos da população, embora os dados sobre a eficácia da vacina AstraZeneca em idosos sejam atualmente limitados.

O imunizante começou a ser aplicado em janeiro, em uma campanha que tem como alvo pessoas mais velhas. Mais de 7 milhões de pessoas já receberam a primeira dose. A Grã-Bretanha também tem usado a vacina desenvolvida pela Pfizer/ BioNTech.

Britânicos apoiam imunizante da AstraZeneca

O primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, e o órgão Public Health England (PHE) defenderam o uso da vacina da AstraZeneca/Oxford após o anúncio da Alemanha de recomendar o imunizante somente para menores de 65 anos.


A Dra Mary Ramsay, da PHE, disse que a vacina oferece “altos níveis de proteção” contra a Covid-19, particularmente contra doenças graves. Já Boris Johnson disse que não estava preocupado com a recomendação da Alemanha.

Ramsay, que é chefe de imunizações da PHE, disse: “Ambas as vacinas AstraZeneca e Pfizer-BioNTech são seguras e fornecem altos níveis de proteção contra Covid-19, particularmente contra doenças graves. Houve muito poucos casos em pessoas mais idosas nos ensaios da AstraZeneca para observar níveis precisos de proteção neste grupo, mas os dados sobre as respostas imunológicas foram muito robustos”, disse.


Fábrica inspecionada na Bélgica

Ainda nesta quinta-feira (28), inspetores de saúde visitaram uma fábrica da AstraZeneca, na Bélgica, a pedido da Comissão Europeia, depois que a empresa farmacêutica reduziu a entrega de doses para o bloco europeu em cerca de 60% na última semana.

A fábrica está localizada na cidade de Seneffe, ao sul de Bruxelas, e as autoridades inspecionaram “dados e documentos”, informou a porta-voz da Agência Federal de Medicamentos e Produtos de Saúde da Bélgica (FAGG), Ann Eeckhout. Um porta-voz da Comissão Europeia explicou à AFP que “os resultados da inspeção serão analisados com peritos de outros Estados-membros e partilhados com a Comissão Europeia”.

No cerne do problema estão os atrasos de produção nas fábricas belgas que produzem as vacinas da Pfizer/BioNTech e da AstraZeneca/Oxford. Muitos países europeus esperavam que as doses da AstraZeneca acelerassem o ritmo da vacinação, já que são mais baratas e mais fáceis de armazenar que as da Pfizer. Na semana passada, no entanto, a AstraZeneca disse à Bruxelas que irá entregar apenas 31 milhões das 80 milhões de doses que o bloco esperava até março.

Em paralelo, funcionários europeus afirmam que a AstraZeneca, sediada em Londres, enviou propositalmente para o Reino Unido doses que deveriam ser direcionadas para a União Europeia (UE). A empresa, em resposta, diz que todas as doses vendidas para os britânicos foram produzidas no território do próprio país.

O CEO da AstraZeneca, Pascal Soriot, disse que a UE se atrasou para fechar um contrato de fornecimento, então a empresa não teve tempo suficiente para resolver os problemas de produção em uma fábrica de vacinas administrada por um parceiro na Bélgica. O imunizante deve receber um aval de emergência do órgão sanitário do bloco europeu nesta sexta-feira — um mês depois do Reino Unido conceder a autorização.

A FAGG já havia realizado uma inspeção de rotina no local e também analisado uma ampliação de capacidade planejada a pedido da Comissão Europeia no início deste mês.

AstraZeneca não tem doses para mercado privado

Na terça-feira (26), a AstraZeneca informou que não tem doses disponíveis do imunizante para o mercado privado, após empresários brasileiros sinalizarem interesse em uma compra.

“No momento, todas as doses da vacina estão disponíveis por meio de acordos firmados com governos e organizações multilaterais ao redor do mundo, incluindo da Covax Facility, não sendo possível disponibilizar vacinas para o mercado privado”, diz a nota. A Covax Facility é um consórcio internacional do qual o Brasil faz parte, para garantir a distribuição de vacinas a países mais pobres.

Mais cedo, ao participar de um seminário sobre investimentos na América Latina, o presidente Jair Bolsonaro disse que apoiaria uma iniciativa de empresários de importar, por conta própria, vacinas contra a Covid-19 para imunizar seus funcionários.

AstraZeneca se compromete a produzir 100 milhões de doses no Brasil

Na nota, a Astrazeneca informa ainda que, como parte do acordo com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), mais de 100 milhões de doses da vacina Oxford/AstraZeneca estarão disponíveis ao Brasil, em parceria com o governo federal. “Nos últimos 7 meses, trabalhamos incansavelmente para cumprir o nosso compromisso de acesso amplo e equitativo no fornecimento da vacina para o maior número possível de países ao redor do mundo”, afirmou.

Até o momento, o Brasil já distribuiu 2 milhões de doses da vacina da AstraZeneca/Oxford. Estão previstas mais 10 milhões de doses importadas até o dia 8 de fevereiro.

A Fiocruz, que produzirá no Brasil as doses da AstraZeneca, também espera receber no próximo mês o primeiro lote do IFA da vacina AstraZeneca/Oxford, que possibilitaria a produção de 7,5 milhões de doses. A instituição afirmou que a carga está pronta para o embarque e que há uma sinalização de envio no dia 8 de fevereiro, mas ainda sem confirmação, “já que a licença para exportação, a ser concedida pelas autoridades chinesas, segue pendente”.

Com informações da Reuters, Agência Brasil, BBC News Internacional e O Globo. Edição do Setor Saúde



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