Política | 11 de novembro de 2020

Teste da CoronaVac no Brasil é marcado por divergências políticas

Bolsonaro e Dória protagonizam duelo em torno da vacina “chinesa”  
Teste da CoronaVac no Brasil é marcado por divergências políticas

Enquanto o mundo corre em busca de uma vacina eficaz e segura contra a Covid-19, o Brasil protagoniza uma verdadeira guerra política sobre o tema. Na segunda-feira (9), a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) suspendeu os testes da vacina CoronaVac, produzido pela farmacêutica chinesa Sinovac em parceria no Brasil com o Instituto Butantan, após alegar a ocorrência de um “evento adverso grave” – posteriormente, descobriu-se que um voluntário que tomou o imunizante morreu. Na terça-feira (10), foi divulgado que a causa da morte foi suicídio, de acordo com laudo do Instituto Médico Legal (IML), ainda em fase final de conclusão. Na quarta-feira (11), a Anvisa autorizou a retomada dos testes.

O suicídio do voluntário, de 33 anos de idade, ocorreu no dia 29 de outubro. O presidente do Instituto Butantan, Dimas Covas, afirmou que, na sexta-feira (6), foi enviada a comunicação da morte à Anvisa. Covas disse que foi pego de surpresa com a suspensão, e ressaltou que a morte do voluntário não tem relação com a vacina. O presidente do Butantan mostrou inconformidade com a decisão da Anvisa.


“Ontem, às 20h40, encaminharam um e-mail ao Butantan dizendo que haveria uma reunião hoje para tratar do evento adverso grave, mas, ao mesmo tempo, anunciava a suspensão do estudo. Oito e quarenta da noite. Vinte minutos depois, essa notícia estava em rede nacional. Não seria mais justo ligar e falar ‘a reunião amanhã é para esclarecermos’. Não seria mais justo, mais ético, mais compreensível?”, disse.

“Suspenderam estudo, causaram medo nas pessoas, fomentaram ambiente que já não é muito propício ao fato dessa vacina ser feita em associação com a China. Fomentar isso a troco de quê? Não seria mais justo ligar e falar que reunião estava marcada para esclarecer isso. Não seria mais justo, ético e compreensível?”, completou.


Em nota, a Anvisa disse que “esse tipo de interrupção é previsto pelas normas da Anvisa e faz parte dos procedimentos de Boas Práticas Clínicas esperadas para estudos clínicos conduzidos no Brasil”. Após a decisão, o estudo foi suspenso, sem que nenhum novo voluntário possa participar dos testes.

Após suspensão, Bolsonaro comemorou que “ganhou mais uma”

Após a suspensão da Anvisa, o presidente da República, Jair Bolsonaro, politizou o fato ao afirmar, em um comentário na sua página do Facebook que “ganhou mais uma” após um usuário perguntar se o Brasil poderia produzir e comprar a vacina.


Na resposta, o presidente cita os efeitos adversos da CoronaVac – embora a Anvisa não tenha detalhado quais são. “Morte, invalidez, anomalia. Esta é a vacina que o Dória queria obrigar a todos os paulistanos tomá-la. O presidente disse que a vacina jamais poderia ser obrigatória. Mais uma que Jair Bolsonaro ganha”, escreveu Bolsonaro.


Publicamente, Bolsonaro e o governador de São Paulo, João Dória, protagonizam um embate político em torno da CoronaVac. Dória anunciou, na segunda-feira (9), que 120 mil doses do imunizante chegarão a São Paulo até o dia 20 de novembro – o governador anunciou que 6 milhões de doses chegarão ao estado até o final do ano.


Enquanto isso, Bolsonaro desautorizou, em outubro, o anúncio do Ministério da Saúde de adquirir 46 milhões de doses da CoronaVac. “A vacina chinesa de João Doria, qualquer vacina antes de ser disponibilizada à população, deve ser comprovada cientificamente pelo Ministério da Saúde e certificada pela Anvisa. O povo brasileiro não será cobaia de ninguém. Minha decisão é a de não adquirir a referida vacina”, afirmou, ao anunciar a suspensão.


Medo e paralisações desnecessárias

As declarações do presidente Jair Bolsonaro contra a vacina e as interrupções precipitadas podem ter repercussão negativa no andamento e velocidade das pesquisas com a CoronaVac. Mesmo que tecnicamente a paralisação ocorrida esteja dentro do previsto, uma troca de informações mais aberta poderia ter fornecido um melhor encaminhamento da situação. Em outubro, por exemplo, a autorização de importação da insumos para a produção da CoronaVac também teve imbróglios junto a Anvisa.

Outra questão que desagrada os pesquisadores são os discursos que relegam a segundo plano a trajetória do Butantan, focando a atenção na origem do laboratório que desenvolveu a vacina. O Butantan é reconhecido mundialmente como um importante centro de pesquisa biomédica que integra pesquisas científicas e tecnológicas.

Senador solicita explicações da Anvisa e Butantan

Por sua vez o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) quer que o presidente da Anvisa, Antônio Barra, e a presidente do Instituto Butantan, Dimas Covas, deem explicações ao Congresso sobre os andamentos dos processos das vacinas contra a Covid-19.


Vieira protocolou, nesta terça-feira (10), um requerimento para que ambos sejam convidados a falar aos senadores em uma audiência no plenário. “Queremos tratar o tema com seriedade. Acabar com essa discussão infantil de piadinhas nas redes sociais e trocas de acusações pela imprensa”, diz o senador.


Lewandowski dá 48h para Anvisa explicar critérios dos testes

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, deu 48 horas para que a Anvisa dê informações sobre os critérios usados nos estudos e testes sobre a vacina CoronaVac.


“Determino à Anvisa, com fundamento no art. 6°, § 1°, da Lei 9.882/1999, que, no prazo de 48 (quarenta oito) horas, observado o âmbito de sua autonomia técnica, preste informações complementares àquelas já ofertadas pela Presidência da República e pela Advocacia-Geral da União, acerca dos critérios utilizados para proceder aos estudos e experimentos concernentes à vacina acima referida, bem como sobre o estágio de aprovação desta e demais vacinas contra a Covid-19”, diz a decisão.


Anvisa autoriza retomada de testes na quarta-feira

Na quarta-feira (11), a Anvisa anunciou que os testes da CoronaVac serão retomados no Brasil.  “A Anvisa informa que acaba de autorizar a retomada do estudo clínico relacionado à vacina Coronavac, que tem como patrocinador o Instituto Butantan”, disse a agência, em nota.

“A Anvisa entende que tem subsídios suficientes para permitir a retomada da vacinação e segue acompanhando a investigação do desfecho do caso para que seja definida a possível relação de causalidade entre o EAG [evento adverso grave] inesperado e a vacina”, diz a nota.

Programa Nacional de Imunizações

Apesar dos conflitos políticos, o Ministério da Saúde vem elaborando o Programa Nacional de Imunizações contra a Covid-19, para preparar o país para realizar a vacinação contra a doença. De acordo com a coluna de Lauro Jardim, do jornal O Globo, o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello irá apresentar o programa nacional de imunização no dia 18 de novembro.

CoronaVac

A CoronaVac é uma das quatro vacinas em Fase 3 de testes (último estágio antes da aprovação) no Brasil. O país também realiza testes com a vacina da Universidade de Oxford/AstraZeneca (há parceria com a Fiocruz para disponibilizar 165 milhões de doses no segundo semestre de 2021), com a vacina da farmacêutica belga Janssen (da Johnson & Johnson) e com a vacina da BioNTech (Alemanha), Pfizer (Estados Unidos) e Fosun Pharma (China).

Dez vacinas estão na Fase 3 de testes

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), 10 vacinas contra a Covid-19 estão na Fase 3. Nove delas precisam de duas doses – apenas a da CanSino precisa de uma única dose. Confira:

 AstraZeneca/Universidade de Oxford  – em teste no Brasil

Sinovac Biotech (China), conhecida como CoronaVac – em teste no Brasil

BioNTech (Alemanha), Pfizer (Estados Unidos) e Fosun Pharma (China) – em teste no Brasil

Janssen Pharmaceutical Companies (Bélgica), da farmacêutica Johnson & Johnson – em testes no Brasil

Gamaleya Research Institute (Rússia), conhecida como Sputnik V – o Paraná entrou em acordo e fará testes com a vacina

Sinopharm (China) e Wuhan Institute of Biological Products (China)

Sinopharm (China) e Beijing Institute of Biological Products (China)

Moderna (EUA)

CanSino Biologics (China) e Beijing Institute of Biotechnology (China)

Novavax (EUA)

 

 



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