A diretora presidente do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), professora Nadine Oliveira Clausell é a primeira entrevistada da série especial do portal Setor Saúde, iniciativa que apresenta a análise de lideranças de hospitais e operadoras do Rio Grande do Sul sobre temas que envolvem a gestão e o setor da saúde.

Nadine analisa como foi o ano de 2022 e aponta projetos e áreas que receberão investimentos em 2023. A diretora presidente detalha ainda sobre os movimentos mais recentes da organização que ajudam a evidenciar os esforços com foco na busca por eficiência, além de indicar as principais diretrizes e eixos estratégicos definidas para o ciclo 2023. As tendências, inovações e os principais gargalos que devem ser foco de atenção dos governos e das organizações de saúde, completam o rol de assuntos abordados. Confira.

Principais desafios enfrentados e as conquistas mais relevantes

A retomada dos serviços represados em virtude da pandemia ditou a atenção das áreas assistenciais e de gestão durante o ano de 2022. Entre as conquistas mais relevantes elencadas, o selo ouro da acreditação internacional Joint Commission (JCI) e a melhoria da estrutura interna.

“O grande desafio de 2022 foi a retomada de todos os atendimentos das diversas especialidades que ficaram de alguma maneira represados com todo o tempo de pandemia, ainda que os investimentos nas teleconsultas tenham auxiliado muito neste período. Muitos dos casos tornaram-se mais graves no período, aumentando não só a demanda, mas também a complexidade. Destaco ainda a busca pela retomada mais forte dos transplantes de órgãos. ”

“Esse cenário todo tornou nossas conquistas ainda maiores. Com todas as dificuldades, em novembro, passamos pelo rigoroso processo de acreditação e conquistamos o selo de ouro da Joint Commission International. Isso evidencia o comprometimento de todas nossas equipes nas entregas de excelência a qualquer tempo e é algo fantástico para todos nós, pois repercute diretamente na qualidade da assistência que prestamos à população e no padrão elevado que repassamos a quem tem no HCPA seu local de aprendizado sobre como cuidar das pessoas. ”

“Tivemos neste período avanços também em nossas estruturas, com destaque para novos equipamentos na hemodinâmica, aparelhos de Ressonância Magnética e Tomografia, estruturação de espaços de descompressão para equipes, inauguração de áreas em novos blocos e uma qualificação em nosso laboratório de simulação. ”

“Esse fim de ano, com aumento de casos da covid, nos evidencia que ainda há muitos desafios pela frente e que precisamos continuar atentos e nos protegendo. O Clínicas tem sido incansável na assistência e continuaremos atuantes em todas as frentes necessárias, sempre ao lado do que a sociedade precisar. ”

Investimentos previstos para 2023

Uma série de planos de ocupações dos novos blocos, adaptações e ampliações estão programados para 2023. Nadine ressalta que a busca por recursos, com vistas a possibilitar as entregas planejadas, já vem sendo trabalhada.

“Continuamos evoluindo em nosso planejamento da ocupação dos novos blocos. Escalonada e responsavelmente, queremos implantar no bloco C o Centro Oncológico e a Hemodiálise, por exemplo. No Bloco B, seguem as adaptações para o Bloco Cirúrgico. Há muito por fazer e estamos trabalhando por recursos que viabilizem diferentes áreas. Cabe destacar ainda nossa busca institucional pela ampliação da Pediatria, com mais leitos e capacidade de atendimentos. ”

Sustentabilidade e eficiência

“A sustentabilidade, seja no campo econômico, financeiro ou ambiental, sempre foi estratégica no HCPA. Recentemente lançamos nosso Plano de Logística Sustentável, um documento que norteia e congrega ações de toda instituição para atingir melhores resultados. Lançamos ainda, em parceria com o Instituto Caldeira, o primeiro Desafio de Sustentabilidade (foto abaixo), mobilizando diversas startups e grupos de pesquisa. ”

“Nossos indicadores são permanentemente monitorados e abrangem os mais diferentes aspectos da instituição, todos estabelecidos a partir de nosso Plano de Negócios e Gestão Estratégica em um amplo processo colaborativo. No centro de todos estes movimentos está o cuidado centrado no paciente, nosso compromisso maior. ”

Gestão e eixos estratégicos

Nadine falou sobre as principais diretrizes e eixos estratégicos estipulados para o ciclo 2023, em termos de gestão e assistência. A instituição hospitalar e educacional, trabalhará sob o guarda-chuva de três eixos estratégicos. A professora ressalta que o ano de 2023 será desafiador. Segundo ela, o HCPA precisará, mais do que nunca, ter foco na estratégia e olhos bem atentos aos resultados.

“Para 2023 nossas prioridades estratégicas estão divididas em 3 eixos integrados e complementares: Cuidado centrado no paciente, Otimização de recursos e espaços e Sustentabilidade. ”

“Para o Cuidado Centrado no Paciente, ainda em 2022 conquistamos o selo da JCI, mas nossa responsabilidade com a qualidade e segurança dos processos só aumenta; maximizar o valor entregue ao paciente de forma segura e eficiente com uma assistência coordenada em linhas de cuidado são nossos grandes objetivos. Seguiremos perseguindo a redução de eventos adversos e infecções, bem como a ampliação de ações para adesão às metas internacionais de segurança. Além disso, temos cinco protocolos assistenciais estratégicos que monitoramos de perto: AVC, Dor Torácica, Dor em Adultos, Sepse e Acessos Vasculares. É fundamental considerar que também o ensino e a pesquisa fazem parte do cuidado do nosso paciente, e assim aqui também acompanhamos por indicadores a nossa produção científica e nossa preceptoria da residência médica.

“Dentro da prioridade sustentabilidade, tão relevante para nós como para toda sociedade, destaco as ações de sustentabilidade ambiental com a implementação do compêndio de ações do nosso Plano de Logística Sustentável bem como o projeto de Economia Circular. Temos também como objetivo implementar fortes ações de governança, buscando transparência, ética e fomento de uma cultura institucional onde nossos colaboradores possam ser ouvidos e cuidados para poder cuidar. Ainda todas essas ações precisam ser apoiadas por uma sólida gestão de recursos, baseada no cumprimento das metas com nosso gestor, mas também na prestação de serviços à saúde suplementar, na realização de parcerias estratégicas e inovadoras, e sem nunca perder de vista a gestão de custos. ”

“Dentro da prioridade otimização de recursos e espaços nosso hospital busca melhoria contínua dos processos, trazendo resultados para nossos pacientes como, por exemplo, reduzindo a média de permanência, o cancelamento de cirurgias por causas hospitalares, e o tempo de permanência de pacientes na Emergência, enquanto buscamos aumento do giro de leitos na Pediatria. Essa prioridade se desdobra em indicadores também na Pesquisa e no Ensino: perseguimos um índice desafiador de aprovação de projetos para o próximo ano, e excelente avaliação da qualidade das nossas residências médicas e multiprofissionais. Dentro desta prioridade se encaixa a estruturação de um centro de ciência de dados, fundamental para apoiar a assistência, ensino e pesquisa, e a ocupação eficiente das nossas áreas físicas – tanto as novas, dos novos blocos B e C, como as que se liberam aqui no Bloco A.”

“Temos um ano desafiador pela frente, onde mais do que nunca precisamos ter foco na estratégia e olhos bem atentos aos nossos resultados, sem perder nosso propósito de sermos vidas que fazem mais pela vida. ”

Tendências e inovações

Nadine apontou como a instituição vem atuando para gerar uma cultura voltada para a inovação. Teleconsultas, aplicativos, ESG, Núcleo de Inovação e Transferência de Tecnologia, pesquisas e receitas oriundas de convênios foram apontadas como alguns dos alinhamentos da instituição pública e universitária.

“Sem dúvidas as teleconsultas são um aspecto da inovação que estará a cada dia mais presente no cotidiano da saúde. Desenvolvemos também o aplicativo Meu Clínicas, que traz muitas facilidades e funcionalidades para os pacientes, permitindo que mais serviços sejam acessados de casa, sem necessidade de deslocamento aos pacientes. Isso é também um aspecto que remete a sustentabilidade global, impactando nas emissões de carbono. Tais questões alinham-se à ESG para contribuir com as evoluções que são não apenas um compromisso, mas um real valor a ser percebido pela sociedade. ”

“E, falando em inovação, nosso Núcleo de Inovação e Transferência de Tecnologia (Nitt) tem desenvolvido uma série de ações. Dentre elas, a participação em edital da Finep em que a proposta de implantação do Parque Tecnológico e de Inovação em Saúde do Hospital de Clínicas de Porto Alegre foi uma das vencedoras e permitirá a implantação do parque e consolidação da incubadora de tecnologia em saúde. ”

“No campo da pesquisa, temos longa tradição em desbravar fronteiras e expandir conhecimentos. As pesquisas clínicas e experimentais aqui desenvolvidas têm estofo para contribuir com novas soluções para muitas questões e nisso é fundamental citar as possibilidades que nosso biobanco traz em sua esteira. ”

“Percebemos ainda a necessidade de qualificar ainda mais nossos atendimentos para convênios privados, passos que estamos dando estrategicamente pois estas receitas contribuem para qualificar nossa instituição toda, repercutindo positivamente também para a assistência SUS. ”

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Gargalos e ineficiências que devem ser foco de atenção dos governos e das organizações de saúde em 2023

Para Nadine, os atendimentos pós-covid seguirão tendo repercussão e precisarão de uma atenção dos governos. Além disso, a retomada dos investimentos em pesquisas e a adoção de modelos que remunerem melhor aqueles que obtêm resultados assistenciais superiores precisam fazer parte do centro das atitudes.

“Como coloquei no ano anterior, os atendimentos pós-covid ainda demandam de muita atenção. Estabelecer a rede para estes pacientes exige um grande esforço, para ser conciliado com todas as outras situações de assistência e casos agravados das demais enfermidades. A própria retomada dos transplantes ainda precisa ser acelerada. ”

“A injeção de recursos na pesquisa precisa ser encarada como uma pauta estratégica, pois é através dela que se constroem os novos caminhos da saúde. Questões relativas às tabelas de remuneração da assistência deveriam ser permanentemente reavaliadas. Sabemos de todas as dificuldades e diuturnamente o Clinicas dá o seu melhor em todos os cenários, mas, sem dúvidas, há necessidade de um incremento nos recursos para que se possa continuar evoluindo e mantendo a excelência da assistência, oferecendo o que há de melhor em material humano e tecnológico. ”

“A lógica de remuneração pelos serviços prestados deve urgentemente ser revisada (inclusive no SUS). Hospitais como o HCPA que oferecem atendimentos de alta complexidade e que tem desfechos melhores que a média dos hospitais deveriam ser remunerados de acordo com estes resultados”, finaliza.

Série Especial

Pelo quinto ano consecutivo, o portal Setor Saúde apresenta a série especial de entrevistas com executivos da saúde do Rio Grande do Sul. Neste ano, as matérias serão publicadas a partir do dia 27 de dezembro. Acompanhe as nossas redes sociais (facebook, twitter, linkedin) para ficar atualizado sobre as publicações ou acesse www.setorsaude.com.br.