Empregabilidade e Aperfeiçoamento, Gestão e Qualidade | 11 de outubro de 2016

Como melhorar a comunicação na área da saúde

A importância do fluxo de informações entre profissionais e pacientes para alcançar bons resultados
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Os profissionais de saúde não falam o suficiente entre si. Os membros da equipe médica – médicos, enfermeiros, assistentes sociais e até mesmo cuidadores – não utilizam adequadamente o tempo para se comunicarem  sobre as necessidades do paciente, e o tempo que a equipe passa com o paciente, muitas vezes não é satisfatório. As necessidades cada vez mais complexas de pacientes, a explosão de conhecimento médico e grandes mudanças em sistemas de saúde já criaram um cenário onde uma comunicação mais eficaz é necessária e indispensável .

Processos e rotinas estabelecidas, muitas vezes, priorizam mais o tempo gasto no preenchimento de prontuários – o que deve ocorrer também -, mas não estabelecem a necessidade de fazer a comunicação de fato fluir.

Como diz o artigo “Let’s talk about improving communication in healthcare” da Columbia Medical Review, assinado por lideranças do New York-Presbyterian Hospital (foto) – o presidente Robert Kelly*, a vice-presidente sênior Emme Deland, e o diretor Jonathan Gordon – o “sucesso” exige abordagens baseadas em equipes que estejam centradas em uma estreita colaboração entre os fornecedores de toda a cadeia da prestação de serviços.

Como resultado, conseguir melhorar a qualidade, reduzir os custos e melhorar a experiência do paciente, só será possível com uma estratégia de comunicação significativamente diferente e melhorada. A instituição possui cerca de 19 mil colaboradores, o que requer um abrangente e complexo mix de processos de comunicação.

Desafios

Um relatório de 2012, do Institute of Medicine (IOM), ilustra alguns dos desafios. “Todos os anos, o paciente idoso médio vê sete médicos (cinco especialistas e dois médicos de atendimento básico) de 4 práticas diferentes. Médicos da área privada que atendem pacientes do Medicare (sistema de saúde público dos EUA, destinado a uma parcela da sociedade, basicamente constituída por idosos) interagem com até 229 outros médicos em 117 práticas diferentes a cada ano. A média que um paciente que se submeteu a cirurgia é ser visto por 27 profissionais de saúde diferentes, enquanto estiver no hospital”.

Um exemplo da complexidade da assistência ao paciente foi descrito pelo médico Matthew Press, Weill Cornell Medical College. O especialista em medicina interna descreveu as interações que ele tinha com um paciente, a quem ele havia designado para ressecção do tumor. Foram documentadas quarenta (40) comunicações com onze (11) outros prestadores de cuidados (nove médicos, uma assistente social e um profissional de laboratório), e seu paciente realizou cinco (5) procedimentos e onze (11) consultas ao longo dos 80 dias a partir da data do diagnóstico até a conclusão da ressecção do tumor.

“Nem todos os problemas de comunicação na área da saúde podem ser atribuídos à complexidade sistêmica. Os pacientes lutam para lembrar o que lhes dizem; um estudo mostrou que os pacientes só lembraram de 40% das informações que foram dadas, e quase a metade do que eles pensavam que lembrava estava incorreto. Mesmo quando eles entendem as orientações, menos da metade dos pacientes não-cirúrgicos são acompanhados nos seus cuidados primários”.

Ouvir

Os médicos também têm oportunidades para melhorar uma importante ferramenta de comunicação: ouvir. Um antigo estudo publicado (em 1984) no Annals of Internal Medicine descobriu que, durante uma consulta, “os médicos interromperam as declarações iniciais dos pacientes em 77% das vezes, e que o tempo médio de interrupção do médico era de apenas 18 segundos. Isto culmina com um grande número de oportunidades perdidas para oferecer maior qualidade e um atendimento mais rentável.”

O já citado relatório da IOM estima que US$ 765 bilhões em despesas de saúde foram desperdiçadas em 2010, com mais da metade atribuível aos serviços desnecessários e ineficientemente prestados, bem como oportunidades de prevenção perdidas. Embora nem todos estes custos possam ser atribuídos a comunicação ineficaz (ou inexistente), os dados indicam claramente que a comunicação desempenha um papel significativo.

Exemplos positivos e teach-back

“Felizmente, a literatura também está repleta de exemplos positivos dos efeitos da comunicação. Melhorar a comunicação entre a equipe de cuidados tem sido eficaz para aumentar significativamente a compreensão da equipe em termos de metas de atendimento e para diminuir a duração da internação. O uso de ferramentas de educação como o método teach-back (ensine de volta, em tradução livre), que pede que pacientes expliquem a um membro da equipe de cuidados as informações que acabaram de receber, tem conseguido uma melhor compreensão e retenção de informações pelos pacientes. Além disso, a comunicação de alta qualidade entre profissionais e pacientes tem demonstrado ter uma influência positiva sobre os resultados de saúde dos pacientes”, alega o artigo da Columbia Medical Review.

Como resultado, os provedores estão trabalhando para identificar e implementar programas para melhorar a comunicação. “Organizações sem fins lucrativos e até mesmo empresas de tecnologia estão criando novas iniciativas e novas ferramentas para facilitar a comunicação entre a equipe de cuidados e para conduzir melhores resultados aos pacientes”.

Papel dos prestadores

Os prestadores devem estar na vanguarda do desenvolvimento de novos programas e ferramentas para promover a comunicação. “Prestadores inovadores têm buscado as melhores práticas de outras indústrias, como a aviação, que também dependem criticamente de uma comunicação eficaz. Um exemplo é a adoção da lista de verificação, popularizado pelo trabalho de Peter Pronovost (médico diretor do Instituto Armstrong para a Segurança e Qualidade do Paciente na Universidade Johns Hopkins e vice-presidente sênior da Johns Hopkins Medicine). “Esta ferramenta pode ser usada em muitos ambientes clínicos diferentes para garantir que toda a equipe tenha a mesma compreensão da situação. Como a cultura é um dos principais motores da melhoria dos cuidados, muitas organizações têm adotado uma ‘cultura justa’, em que os funcionários são incentivados a falar sobre suas próprias ações e as ações dos outros sem medo de represálias, permitindo assim a identificação adequada de falhas”.

Esses esforços começaram a dar frutos. “Erros médicos estão declinando conforme médicos e hospitais têm aceito e abraçado a responsabilidade da segurança do paciente. Em 2013, o New York-Presbyterian Hospital lançou um esforço para criar uma organização segura e altamente confiável, centrada na criação de uma cultura justa. Isto incluiu tanto assegurar que todos os funcionários se sentissem livres para falar se eles viram algo que sentiram que poderia afetar negativamente a assistência ao paciente, quanto a comunicação com e entre o pessoal da equipe sobre a natureza e as causas de erros que são descobertos”.

Com base nesta cultura de segurança no trabalho, a instituição de Nova York, o Columbia College of Physicians e a Weill Cornell Medical College trabalharam para criar e implementar o MCB – Making Care Better (Desenvolvendo os Melhores Cuidados, em tradução livre), que foi lançado em janeiro de 2014. O MCB, instituiu 13 elementos centrais (ver aqui mais informações na publicação da Weill Cornell Medical College), projetado para fornecer a mais alta qualidade, o cuidado mais seguro e confiável para os pacientes, melhorando a comunicação e a colaboração entre a equipe de cuidados e os pacientes. Além de reforçar a abertura e a comunicação sobre erros, o MCB acrescenta uma abordagem interdisciplinar diária, estruturada para garantir a comunicação entre os profissionais.

O uso de um organograma para dar alta (discharge bundle), assegura que todos os profissionais prestadores de serviços que são relevantes no caso, sejam informados sobre as necessidades do paciente no momento da alta, e o teach-back é usado para melhorar a compreensão e retenção de instruções de alta do paciente. “Finalmente, informar os pacientes sobre a escolha de cuidados paliativos, que é outro elemento dos cuidados em saúde, exige que a equipe tenha conversas abrangentes, em profundidade com os pacientes e suas famílias. Já em fase II de seu desenvolvimento, os dados internos mostram que o MCB começou a fornecer melhorias na comunicação que, ao longo do tempo, são esperados para conduzir a melhores resultados”.

Transparência de preços

Os esforços para promover e melhorar a comunicação na área da saúde são, em grande parte, voltados para lidar com as necessidades clínicas. “Mesmo que as despesas de saúde sejam importante causa de insolvência individual, os custos têm sido vistos como uma questão secundária nos cuidados de saúde. Com o advento dos planos de saúde dedutíveis e intercâmbios de seguro de saúde, a responsabilidade média anual do paciente é superior a US$ 5 mil (Dados do portal Health Pocket, relacionados aos EUA. Disponível em www.healthpocket.com).

A transparência de preços está, atualmente, no centro da prestação de serviços. “Infelizmente, nem o paciente nem os membros da equipe de cuidados têm uma compreensão sólida da despesa financeira de seus cuidados. A organização sem fins lucrativos Cost of Care trabalha para aumentar a conscientização sobre a questão, solicitando histórias de ambos, pacientes e membros de equipes de cuidados, que ilustram como a má comunicação levou a gastos inesperadamente altos para os pacientes”.

Juntamente com a American Board of Internal Medicine e a campanha Choosing Wisely, da Cost of Care (Custo do Cuidado, em tradução livre), está construindo materiais didáticos e ferramentas para ajudar os profissionais a se comunicarem com os pacientes sobre os custos, algo que não faz parte, neste momento, do aprendizado de enfermagem, de faculdades de medicina ou em currículos de residência.

O projeto Choosing Wisely tem como base discussões e estudos com prestadores e pacientes, e apresenta recomendações baseadas em evidências e materiais que podem promover a redução de procedimentos e exames desnecessários (http://www.choosingwisely.org/doctor-patient-lists/). Mais de 70 parceiros lançaram recomendações com a intenção de facilitar decisões sábias sobre o atendimento mais adequado com base em situações individuais dos pacientes. Cada lista apresenta informações para situações rotineiras que envolvem a decisão médica ou do paciente, informando a fonte de referência e a metodologia utilizada para a conclusão.

Tecnologia

A tecnologia também está começando a desempenhar um papel importante no reforço da comunicação, melhorando a conectividade e facilitando o fluxo de informações. Enquanto registros de saúde eletrônicos e o intercâmbio de informações de saúde têm fornecido um acesso mais robusto e consistente das informações de pacientes, os provedores têm sido lentos para mudar sua prática de maximizar essas oportunidades, visando inclusive, o alcance de uma vantagem competitiva.

Startups de tecnologias em saúde estão fechando esta lacuna ao criar plataformas de mensagens seguras para permitir que a equipe de cuidados se comunique facilmente, mantendo as proteções de privacidade necessárias. Startups como Noom criaram ferramentas de engajamento do paciente para aumentar a frequência e consistência das interações entre paciente e médico, ajudando a melhorar a taxa de conformidade com os regimes de tratamentos. O aplicativo propõe a criação de rotinas para os usuários. “Você vai começar cada dia com uma lista personalizada de medidas a tomar para chegar mais perto de seu objetivo”, destaca o site. 

Melhorar a comunicação é essencial para transformar os sistemas de saúde. “Embora existam muitas barreiras estruturais e culturais a serem superadas, a boa notícia é que existem pacientes, prestadores de serviços, administradores e empresários que trabalham em conjunto para alcançar esse objetivo. Para fazer isso, teremos de definir métricas claras para o sucesso, identificar as melhores, construir um consenso e interagir com base na experiência. Não vai ser uma jornada curta, mas pelo menos teremos alguma coisa para conversar ao longo do caminho”, conclui o artigo.

 

* Robert Kelly deixou o cargo de presidente em 2015. 

 

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