Gestão e Qualidade | 17 de novembro de 2016

Os médicos devem ser penalizados pelos resultados do paciente?

Como melhorar a adesão e os resultados dos tratamentos
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À medida que o pagamento médico começa a mudar para pagamentos baseados em valor (value-based payments), as medidas de qualidade dos serviços de saúde vão passar, aos poucos, de processos para resultados. Isso é um alívio para alguns profissionais que nunca se sentiram confortáveis para relatar as medidas em processos ao invés de serem avaliados pelos seus resultados.

Mas essa transformação também apresenta um novo desafio: o médico poderá ser responsabilizado pelos pacientes que não melhoram porque não estão seguindo o plano de tratamento recomendado. Como relata em artigo do portal Medscape, o cardiologista Kevin Campbell, da Universidade da Carolina do Norte, “a maioria dos médicos não se importa de sere avaliado pela sua qualidade de atendimento”. “Mas se o médico fez tudo certo para o paciente, e o paciente não adere ao que é proposto, isso deve refletir mal sobre o clínico?”, questiona.

A resposta de alguns especialistas em aderência é “sim”, embora essa resposta seja contestada por muitos médicos. Garantir a adesão dos pacientes é tanto uma questão de ser um bom médico quanto elaborar um plano de tratamento bem-sucedido, diz Stephen Wilkins, ex-executivo do hospital que dirige a Mind The Gap Academy, um grupo de San Jose, na Califórnia, que busca melhorar resultados através de um melhor envolvimento entre médico e paciente.

Mesmo quando os pacientes decidem não seguir o plano de tratamento, Wilkins acredita que os médicos devem assumir alguma responsabilidade financeira pelo resultado ruim gerado. “Os médicos devem verificar as ‘taxas de abastecimento e reabastecimento’ de prescrição, ou tomar medidas semelhantes”, diz ele.

Por outro lado, muitos médicos consideram que os pacientes devem ter um grande grau de responsabilidade por suas próprias decisões relacionadas à saúde. Por que um médico deve pagar o preço por um paciente que continua a beber demais, continua fumando, ou desconta suas frustrações comendo batata frita? Outros, entretanto, sentem que com aplicativos e as comunicações eletrônicas de hoje, tornou-se menos oneroso para que os doutores exijam resultados melhores de pacientes.

O movimento rumo às medidas de resultado

Ser responsável pelos resultados ainda é bastante raro, mas está se tornando um ingrediente importante nas avaliações de qualidade. “O Medicare’s Physician Quality Reporting System (Sistema de Registro de Qualidade Médica do Medicare, do governo norte-americano) exige que os médicos relatem medidas de processo – por exemplo, a porcentagem de pacientes com doença arterial coronariana para os quais o médico receitou aspirina ou clopidogrel. O sistema permite aos médicos selecionar entre um pequeno número de medidas de resultado (por exemplo, a porcentagem de pacientes que necessitam intubação após cirurgia de revascularização do miocárdio), mas eles não são obrigados a fazê-lo”.

No próximo ano, os EUA irão implementar a Performance de Qualidade (Quality Performance – QP) do Sistema de Pagamento por Incentivo Baseado em Mérito (Merit-Based Incentive Payment System – MIPS). Sob as medidas do MIPS e QP, que começam em janeiro de 2017, os médicos terão de escolher uma medida de qualidade de um total de seis medidas para relatar. Além disso, espera-se que os médicos eventualmente assumirão o risco financeiro de reduzir os custos e garantir a qualidade. “Esses arranjos incluem uma poupança compartilhada do programa Acountable Care Organizations (ACO), pacotes de pagamentos e episódios de cuidados. Todos esses programas dependerão de uma melhor aderência do paciente, o que pode ser assustador para muitos médicos. De acordo com uma meta-análise de 2005, as taxas de não-adesão podem exceder 40%”, constatou o artigo do Medscape.

Etapas para melhorar a adesão

Conseguir pacientes engajados em regimes médicos e de saúde é a melhor maneira de melhorar resultados. O portal Medscape consultou especialistas de diferentes áreas – advogado do paciente, lideranças hospitalares, médicos acadêmicos e clínicos – para elaborar algumas abordagens-chave para ajudar a melhorar os resultados.

Fornecer lembretes aos pacientes. Podem ser telefonemas, emails e lembretes nas caixas de medicamentos. Isso vale para pacientes com problemas de esquecimento, que respondem por 25% da não-adesão. Mesmo uma ligação amigável de um assistente pode afetar um paciente que intencionalmente não se engaja no tratamento.

Simplifique a dosagem. Reduzir o número de vezes que os pacientes devem tomar uma droga – e, se possível, o número total de medicamentos que devem tomar – é um fato que melhora a adesão. Pesquisas descobriram que essa abordagem pode aumentar a adesão de 8% a 19,6%.

Envolva os pacientes na tomada de decisões. Muitos pacientes não engajados decidem não tomar seus remédios devido a efeitos colaterais que são notados, mas não ditos para os médicos. Uma maneira de lidar com esse problema é ajudar os pacientes a se envolverem mais na escolha da terapia e na compreensão dos efeitos colaterais através de folhetos explicativos, vídeos e outros materiais usados como auxílios para a decisão. Um programa no Hospital Geral de Massachusetts, em Boston, usa essa abordagem. “A ajuda à decisão promove discussões mais ricas e permite um uso mais eficiente do tempo de consulta”, diz Leigh Simmons, diretora médica do programa. Em uma pesquisa, os médicos do hospital disseram que achavam que essa abordagem melhorava a qualidade dos cuidados.

Ajudar os pacientes a aceitarem altos custos de medicamentos. Os pacientes muitas vezes não querem pagar por um medicamento caro, porque acham que é menos importante para suas vidas do que outras coisas. Dra. Simmons diz que a ajuda para decisões e discussões com os pacientes podem ajudar os pacientes a entenderem por que a droga é importante.

Melhorar a interação com o paciente. Alguns médicos podem melhorar os resultados, alterando a maneira como interagem com os pacientes, diz Anthony Jerant, médico da família na Universidade da Califórnia. Ele desenvolveu o projeto SEE IT (Self-Efficacy Enhancing Interviewing Techniques), um método de entrevista que se destina a aumentar a confiança dos pacientes no gerenciamento de sintomas de doenças crônicas. “O objetivo é capacitar e motivar os pacientes”, diz ele.

Técnicas de adesão podem ser simples

Formas eficazes de adesão não precisam ser tão complexas como muitos especialistas estão recomendando, diz Steven R. Feldman, dermatologista em Winston-Salem, Carolina do Norte. Embora o médico não acredite que a adesão possa chegar a 100%, ele diz que melhorou suas próprias taxas de aderência, tomando os seguintes procedimentos:

Faça da adesão sua responsabilidade. “Sua suposição básica deve ser que os pacientes não seguirão o tratamento, a menos que você faça o esforço necessário para convencê-los disso”, diz ele.

Construa a confiança dos pacientes. Isto é feito de muitas maneiras simples, como ter abundância de vagas no estacionamento, uma sala de espera limpa, e um pessoal educado, e lidar pessoalmente com pacientes de forma respeitosa, sem pressa.

Selecione os tratamentos que os pacientes vão realmente usar. Por exemplo, “unguentos e cremes podem ser o tratamento preferido, mas se os pacientes não gostam, você vai precisar oferecer outra coisa”, diz ele. Para muitas condições, geralmente há outros tratamentos que são basicamente tão bons quanto.

Prepare os pacientes para efeitos colaterais. Se um medicamento está incomodando, “digo aos pacientes que é um sinal de que está funcionando”, diz o Dr. Feldman. “Então, quando eles sentem desconforto, eles vêem isso como uma experiência positiva, de que está funcionando”.

Peça aos pacientes que voltem em 3 dias. Se os pacientes são convidados a entrarem em contato com o médico logo após a prescrição, eles são motivados a começarem imediatamente a usar o medicamento, diz o especialista. E uma vez que aderem, vão começar a ver resultados positivos e que irão motivá-los a continuar o uso. Quanto mais tempo se passar, menos os pacientes estarão propensos a iniciar a medicação, diz ele.

Dr. Feldman insiste que suas técnicas não tomam mais tempo, mesmo durante a visita ao consultório. Se isso tomasse tempo, ele acredita que a maioria dos médicos não iria querer adotar, porque simplesmente não há tempo a se acrescentar em uma visita do paciente. Ele acredita que prestar atenção à adesão é uma habilidade essencial do médico, comparável ao diagnóstico e à seleção de um plano de tratamento. “Se você fizer o diagnóstico certo e selecionar um plano de tratamento eficaz, não significa nada se o paciente não segui-lo”, exemplifica.

Visando melhores resultados em Diabetes e Oncologia

Concentrar-se em melhores resultados envolve trabalho diferente para diferentes grupos de pacientes. “Para diabetes, uma condição crônica, a motivação do paciente pode fluir e retroceder ao longo do tempo. O modelo de cuidados crônicos, que é frequentemente usado para pacientes com diabetes, tem como objetivo melhorar a adesão do paciente”, de acordo com Kevin M. Pantalone, endocrinologista da Cleveland Clinic. “Se o paciente tem uma dor de cabeça alguns dias depois de iniciar um novo medicamento, pode parar de tomar o medicamento e não avisar o médico”, diz ele.

“Sob o modelo de cuidados crônicos, coordenadores de enfermagem entram em contato com os pacientes após a consulta para se certificar que eles estão começando o tratamento e que está funcionando bem. Esta abordagem de cuidado em equipe permite que um médico consiga adesão do paciente e permite que o profissional recomende um tratamento diferente, ou trabalhe com o paciente, para incentivá-los a ser ativo no seu próprio tratamento”.

Oncologia também ruma para a medição de resultados

Pagamentos e cuidados oncológicos, como em muitas outras especialidades, está se movendo em direção à medição de resultados. Em julho, 195 especialistas norte-americanos aderiram ao Oncology Care Model, um programa de cinco anos que torna os oncologistas responsáveis pela eficácia e eficiência dos cuidados oncológicos. Médicos estão envolvidos em modelos de pagamento que incluem responsabilidade financeira e de desempenho para episódios de cuidados envolvendo a administração de quimioterapia para pacientes com câncer.

Os Centros de Serviços de Medicare e Medicaid fornece uma taxa de administração mensal de US$ 160 para cada paciente, que pode ser usado para pagar coordenadores de enfermagem para melhorar a adesão. Os médicos com pontuações de alta qualidade que economizam dinheiro durante um tratamento de seis meses também podem receber pagamentos extras.

Oncologistas estão começando a abraçar este conceito de pagamento, diz Stephen Grubbs, vice-presidente de assuntos clínicos da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (American Society of Clinical Oncology) . “Inicialmente houve alguma resistência, mas acho que os médicos entenderam que a mudança está chegando”, diz ele. Dr. Grubbs aconselha que quando os resultados são medidos, fornecer serviços dentro da codificação da Classificação Internacional de Doenças, torna-se crucial. “Para estabelecer seu risco e ser graduado no nível correto de gravidade, você precisa colocar os códigos de comorbidade corretamente”.

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