Mundo | 13 de fevereiro de 2018

Saúde francesa “atacará” ineficiência e modelo de pagamento por volume

Iniciativa prevê revisão da oferta de cuidados
Saúde francesa atacará ineficiência e modelo de pagamento por volume

Em praticamente todo o mundo, os custos crescentes e a ineficiência no setor de saúde estão sendo “atacados” pelos governos. Rever o modelo de pagamento por volume, valorizar o colaborador/prestador que atua com respeito ao controle de custos e resolutividade assistencial, e ainda, fechar os hospitais ineficientes são alguns dos desafios principais que o governo do presidente francês Emmanuel Macron pretende enfrentar, conforme deu a conhecer neste dia 13 de fevereiro. O sistema de saúde francês é conhecido por ter quase 80% dos seus custos financiados pelo governo, através do sistema de seguro nacional de saúde, conhecido como Sécurité Sociale. 

Depois de lançar e aprovar as bases para a reforma trabalhista, o chefe de governo francês Édouard Philippe iniciou o processo de modernização de outro tema igualmente sensível: o modelo de serviços e de financiamento para os hospitais franceses. No hospital do município de Eaubonne – distante 40 minutos do Centro de Paris -, e acompanhado pela Ministra da Saúde, Agnès Buzyn, o primeiro-ministro revelou um plano de ação que busca não  “ser mais um dentre tantos outros que vieram a fracassar”.

A iniciativa é apresentada como uma reforma ambiciosa do modelo de oferta de serviços de saúde na França. O plano fornece cinco grandes projetos para sair de um sistema de saúde centrado em si mesmo e com financiamento baseado em taxas de serviços que impulsionam os “volumes” e custos crescentes, disse o primeiro-ministro.

Primeiro ministro Édouard Philippe e o presidente Emanuelle Macron

Primeiro ministro Édouard Philippe e o presidente Emmanuel Macron

 

O governo de Macron e Édouard Philippe estabeleceu sua lista de prioridades, que vai desde a reforma do ensino de saúde até a revisão do financiamento hospitalar, através de uma renovação da política de recursos humanos e de uma revisão da organização territorial do sistema.

Sintomas conhecidos

Segundo o jornal Le Figaro, os males e sintomas são conhecidos. Com dificuldades financeiras, os hospitais públicos – com um déficit histórico de 1,5 bilhão de euros em 2017 – despertaram o alarme em dezembro passado.

Além disto, os funcionários estão esgotados. Jovens profissionais e estudantes não são poupados. Alguns deles até publicaram uma carta aberta denunciando uma “série muito longa” de suicídios ligados a condições de trabalho severas.

Outro ponto crucial é o cuidado ao idoso. No final de janeiro foi revelada a crise dos estabelecimentos para idosos dependentes de cuidados (Ehpad), que expôs as dificuldades de financiamento dirigidos à velhice.

Hospitais representam 40% dos gastos em saúde

A França prioriza muito o atendimento hospitalar. A participação dos hospitais no total das despesas de saúde é de 40%, em comparação com 29% na Alemanha. A França continua a ser o terceiro país da OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – com a média de permanência mais longa no hospital (10 dias, em comparação à média de 7,8 em outros lugares). A taxa de cirurgias ambulatoriais ainda permanece inferior à de seus vizinhos. O foco agora é “gastar melhor”, segundo o governo francês.

A “linha vermelha está desatualizada”, alertou em dezembro Frédéric Valletoux, presidente da Federação de Hospitais da França (FHF), que reúne hospitais públicos, alertando ao governo para a necessidade de reformas estruturais e financeiras vitais para serem iniciadas “agora”. A situação também é tensa em clínicas e instituições privadas, como afirma Lamine Gharbi, sua homóloga da Federação Hospitalar Privada (FHP).

Agnès Buzyn

Agnès Buzyn

 

Agnès Buzyn começou a dar início a uma resposta na lei de financiamento para 2018, acrescentando 1,8 bilhão de euros este ano ao orçamento dos hospitais públicos, um aumento de 2,2%. Mas, apesar deste impulso, à medida que os gastos também aumentam, os hospitais ainda alcançarão 1,6 bilhões de euros de déficit em 2018.

Agnès: ” Quero valorizar a boa medicina, os que fazem bem e deixar de valorizar os ruins, aqueles que praticam atos desnecessários”

A ministra também disse que queria rever os métodos de financiamento do hospital e “sair gradualmente do T2A”, o sistema que atualmente remunera os hospitais. Introduzido em 2004, o modelo define os recursos dos hospitais de acordo com o volume dos atos produzidos. Mas como era esperado, gerou uma inflação, com incremento no número de procedimentos médicos. ” Espero que trabalhemos coletivamente sobre a relevância dos atos cuja melhoria evitaria 30 a 40% das despesas”, explicou Agnès Buzyn em julho passado, durante a apresentação do seu plano de trabalho aos deputados franceses.

O objetivo é levar em conta a relevância das intervenções. “Todos os relatórios coletados recentemente demonstram que cerca de 25% das despesas de saúde hoje estão relacionadas a atos desnecessários ou redundantes. Resta criarmos este novo modelo de financiamento que valoriza a qualidade. É muito complicado tecnicamente. Não há modelos alternativos nas gavetas. Mas, devemos qualificar as boas práticas”, disse Agnès Buzyn.

Finalmente, será necessário colocar sobre a mesa o assunto da reestruturação do sistema, alertam especialistas, e tomar a decisão de fechar instituições com atividade insuficiente. Um assunto que sempre provoca protestos de dirigentes sindicais e políticos, já que o hospital costuma ser o principal empregador em muitas das regiões onde estão instalados.

As cinco principais ações do plano:

Uma melhor organização territorial de cuidados hospitalares integrados (grupos hospitalares regionais, comunidades de saúde e de profissionais, uso de mais equipes de atenção primária para desenvolver iniciativas de prevenção)

Uso de e-saúde (telemedicina, arquivo médico compartilhado)

Foco na relevância e na qualidade dos cuidados com uso de organizações inovadoras

A diversificação dos métodos de remuneração

Recursos humanos (otimizar agenda do médicos, reforma do ensino médico e da saúde, dar sentido e definir objetivos claros à assistência hospitalar)

Com informações Le Figaro e Los Echos. Edição e tradução SS. 

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