Estatísticas e Análises | 3 de abril de 2017

Pesquisadores associam remédio para bexiga à demência

Oxibutinina preocupa por estar ligada à deficiência cognitiva e demência em idosos
Pesquisadores associam remédio para bexiga à demência

Uma nova pesquisa levanta preocupações sobre as altas taxas de prescrição nos EUA de um medicamento comum usado para tratar a bexiga hiperativa. O medicamento, a oxibutinina, quando tomado por via oral, está consistentemente ligado à deficiência cognitiva e demência em idosos. Uma análise feita por um grupo internacional de pesquisadores mostra que a oxibutinina é prescrita em mais de um quarto dos casos de bexiga hiperativa (27,3%), embora outros medicamentos estejam disponíveis. A pesquisa foi apresentada na conferência da Associação Europeia de Urologia, em Londres, onde também estão sendo expressas preocupações sobre a falta de financiamento às alternativas para a oxibutinina na Europa.

A bexiga hiperativa (BH) é extremamente comum em pessoas com mais de 65 anos. O tratamento inicial é feito normalmente através de mudanças comportamentais, que podem ser seguidas por tratamento médico de primeira linha, como medicamentos antimuscarínicos, incluindo oxibutinina. Os fármacos antimuscarínicos são compostos sintéticos, originalmente derivados de cogumelos, que bloqueiam a atividade do receptor muscarínico da acetilcolina. Eles têm vários usos, incluindo o controle da bexiga hiperativa. A oxibutinina é o antimuscarínico mais barato usado para BH e, assim, tende a ser a droga mais escolhida. No entanto, um conjunto de evidências tem mostrado que a oxibutinina está associada a um maior declínio cognitivo no idoso.

Um grupo internacional de clínicos, liderado pelo Dr. Daniel Pucheril (Vattikuti Urology Insitute, Hospital Henry Ford, Detroit/EUA), analisou evidências da National Ambulatory Medical Care Survey (Pesquisa Nacional de Cuidados Médicos Ambulatoriais, em português), em que 1.968 pacientes tinham recebido medicamentos antimuscarínicos. Eles descobriram que a oxibutinina foi prescrita a 27,3% dos pacientes com mais de 65 anos que receberam nova prescrição antimuscarínica para bexiga hiperativa. Além disso, apesar da recomendação do FDA(equivalente à ANVISA nos Estados Unidos) de que os pacientes que iniciam a oxibutinina sejam monitorados de perto quanto a efeitos colaterais adversos no sistema nervoso central, os autores do estudo descobriram que apenas 9% dos idosos receberam um exame neurológico no momento da prescrição do fármaco. Cerca de 16% dos adultos americanos sofrem de bexiga hiperativa, o que se traduz em dezenas de milhões de pacientes nos Estados Unidos.

Conforme explicou Dr. Pucheril para a Associação Europeia de Urologia, “olhamos para uma amostra representativa, mas quando você extrapolar para a população dos EUA os números são enormes. Nós estimamos que, ao longo dos seis anos de nossa análise, 47 milhões de indivíduos nos EUA estavam tomando vários tipos de drogas antimuscarínicas para a BH, com cerca de 55% das novas prescrições indo para os mais de 65 anos. Após modificações no estilo de vida, os medicamentos antimuscarínicos constituem as terapias de primeira linha mais comuns. Nos Estados Unidos, a maioria dos idosos são segurados pelo Medicare. Planos de seguro de Medicare têm muitas vezes formulários de medicamentos escalonados para minimizar as despesas de drogas. A oxibutinina é o fármaco antimuscarínico menos dispendioso disponível, mas as suas propriedades farmacológicas podem causar efeitos colaterais cognitivos significativos em pessoas idosas. Apesar da evidência desses efeitos colaterais, os médicos não estão comumente verificando efeitos cognitivos naqueles que usam esses medicamentos “.

O Dr. Pucheril continuou: “Não estamos dizendo que todo mundo deve mudar de oxibutinina para outra droga – ela ainda tem seus usos, e sair da droga sem supervisão médica não é recomendado. No entanto, os médicos precisam olhar atentamente para os níveis de prescrição. Mais do que qualquer outra coisa, os organismos de financiamento têm de tornar mais fácil para os médicos prescrever antimuscarínicos mais recentes, que são muito menos prováveis de causar disfunção cognitiva”.

Comentando sobre a situação europeia, o professor Helmut Madsbacher (fundador da Unidade de Neuro-Urologia do Hospital Universitário de Innsbruck, na Áustria) afirmou que o “novo trabalho dos EUA destaca um problema mais geral que também existe aqui na Europa. Na Europa, o uso de oxibutinina varia de país para país. O que descobrimos é que quando uma gama de remédios antimuscarínicos é financiada, como acontece, por exemplo, na Alemanha, na Áustria e na Suíça, o uso de oxibutinina é baixo, em cerca de 5% a 7%. Em alguns países, porém, só a oxibutinina é financiada, e isso cria um problema. Por exemplo, o único antimuscarínico financiado pelas autoridades sanitárias italianas é a oxibutinina, o que leva a algumas áreas com cerca de 70% das prescrições”.

A professora Andrea Tubaro (Sapienza Università, Roma) acrescentou que “se uma droga alternativa não é financiada pelo sistema de saúde, então, torna-se demasiado cara para um paciente para comprar. Na Itália, a oxibutinina genérica custa cerca de 5 euros por mês, mas alguém que deseje pagar por um antimuscarínico diferente ou uma alternativa mais atual, como um agonista β3 (beta 3) vai acabar pagando cerca 50 euros por mês. Mesmo em termos estritamente econômicos, não há sentido em poupar alguns euros em uma droga que tem o risco de piorar a demência, uma das condições mais caras que a medicina pode tratar. Este é um problema na Itália, mas os financiadores em todos os países realmente precisam apoiar o uso de uma gama de drogas”.

No Brasil, a oxibutinina é facilmente encontrada nas farmácias, e possui preço médio de 25 reais a caixa com 30 comprimidos. Bem como os pesquisadores europeus afirmaram, os outros medicamentos para tratar a bexiga hiperativa possuem valores muito mais altos do que a oxibutinina. Aqui no país, a solifenacina pode ser encontrada nas farmácias por 130 reais, em média. Já a toltenodina e a darifenacina saem por 200 reais a caixa.

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