Mundo | 13 de outubro de 2020

Manifesto de cientistas pede fim das atuais políticas de isolamento social

Por outro lado, Ministro de Saúde da Inglaterra ataca a Declaração Great Barrington que sugere que pessoas fora do grupo de risco devem voltar à rotina normal
Manifesto de cientistas pede fim das atuais políticas de isolamento social

Um manifesto assinado por cientistas de renome mundial e profissionais de saúde expressa preocupação com os efeitos das estratégias de restrição de deslocamento social, como as quarentenas e lockdowns, utilizadas em vários países do mundo para combater o aumento de casos de Covid-19. A Declaração de Great Barrington é assinada por especialistas como o Dr. Martin Kulldorff, professor de medicina da Universidade de Harvard; a epidemiologista Dra. Sunetra Gupta, da Universidade de Oxford; e o epidemiologista Dr. Jay Bhattacharya, da Stanford University Medical School. Para eles, “aqueles que não são vulneráveis devem ser imediatamente autorizados a retomar a vida normal.”

No dia 10, David Nabarro, o consultor do gabinete do diretor-geral da Organização Mundial de Saúde declarou: “parem de usar o confinamento como medida primária de controle”. As novas manifestações demonstram uma mudança de posicionamento da comunidade científica. Por outro lado, o ministro de saúde da Inglaterra atacou os especialistas que defendem a estratégia de imunidade coletiva (de rebanho) para o coronavírus (ver no final da matéria).

Gret Barrington

A carta sugere a “Proteção Focalizada”, em que as medidas de proteção sejam concentradas nos mais vulneráveis, e que pessoas fora dos grupos de risco possam viver sem tantas restrições.

A Declaração de Great Barrington é um movimento iniciado nos Estados Unidos, que já conta com milhares de assinaturas de pesquisadores e cidadãos. O movimento acredita que as atuais medidas de restrição representam piora nos cuidados de pessoas com doenças crônicas, que estão indo consultando com menos frequência desde o início da pandemia, além de diminuição da vacinação infantil.

Ou seja, os impactos na economia e na saúde da população podem ser ainda maiores se o isolamento for uma medida adotada à toda a população, sem uma abordagem que equilibre os riscos e benefícios de alcançar a imunidade de grupo, permitindo que aqueles que estão em risco mínimo de morte vivam normalmente a sua vida para construir imunidade ao vírus através da infecção natural, ao mesmo tempo que protege melhor aqueles que estão em maior risco.

David Nabarro, da OMS

“Nós, na Organização Mundial de Saúde, não aconselhamos os confinamentos como medida primária de controle deste vírus”, afirmou David Nabarro, enviado especial do gabinete do diretor-geral da OMS para o combate à pandemia do novo coronavírus, em declaração emitida no dia 11 de outubro (sábado). “Os confinamentos têm uma consequência que nunca deve ser subestimada: tornam as pessoas pobres muito mais pobres”, acrescentou o especialista médico, em entrevista ao The Spectator, revista semanal britânica.

As declarações se alinham ao que foi indicado na semana passada pelo diretor-executivo da OMS, Michael Ryan, que afirmou que o fechamento da economia é uma situação a ser evitada pois gera consequências negativas nas populações, principalmente aquelas em que a economia está em crise.

Ganhar tempo

“O único motivo que acreditamos que justifica um confinamento é para ganhar tempo para reorganizar, reagrupar, equilibrar os recursos; proteger os profissionais de saúde, que estão esgotados”, disse, acrescentando, porém, que “no geral, preferimos não o fazer”, defendeu Nabarro.

Confira a Declaração De Great Barrington

Como epidemiologistas de doenças infecciosas e cientistas da saúde pública, temos sérias preocupações sobre os impactos prejudiciais para a saúde física e mental das políticas prevalecentes da Covid-19, e recomendamos uma abordagem a que chamamos Proteção Focalizada.

Viemos tanto da esquerda como da direita, e de todo o mundo, e temos dedicado as nossas carreiras à proteção das pessoas. As atuais políticas de confinamento estão produzindo efeitos devastadores na saúde pública a curto e longo prazo. Os resultados (para citar alguns) incluem taxas mais baixas de vacinação infantil, agravamento dos prognósticos das doenças cardiovasculares, menos exames oncológicos  e deterioração da saúde mental – levando a um maior excesso de mortalidade nos próximos anos, com a classe trabalhadora e os membros mais jovens da sociedade a carregar um fardo mais pesado. Manter os alunos fora da escola é uma grave injustiça.

Manter estas medidas em vigor até que uma vacina esteja disponível causará danos irreparáveis, com os mais desfavorecidos sendo prejudicados.

Felizmente, a nossa compreensão do vírus está crescendo. Sabemos que a vulnerabilidade à morte para Covid-19 é mil vezes maior nos idosos e doentes do que nos jovens. De fato, para as crianças, a Covid-19 é menos perigosa do que muitas outras doenças, incluindo a gripe.

À medida que a imunidade se desenvolve na população, o risco de infecção para todos – incluindo os vulneráveis – diminui. Sabemos que todas as populações acabarão por atingir a imunidade de grupo – ou seja, o ponto em que a taxa de novas infecções é estável – e que isto pode ser assistido por (mas não depende de) uma vacina. O nosso objetivo deve ser, portanto, minimizar a mortalidade e os danos sociais até atingirmos a imunidade de grupo.

Uma abordagem mais compassiva que equilibra os riscos e benefícios de alcançar a imunidade de grupo, é permitir que aqueles que estão em risco mínimo de morte vivam normalmente a sua vida para construir imunidade ao vírus através da infecção natural, ao mesmo tempo que protege melhor aqueles que estão em maior risco. Chamamos de Proteção Focalizada.

A adoção de medidas para proteger os vulneráveis deve ser o objetivo central das respostas de saúde pública à Covid-19. A título de exemplo, os lares devem utilizar pessoal com imunidade adquirida e realizar testes PCR frequentes a todos os visitantes. A rotação do pessoal deve ser minimizada. Os aposentados que vivem em casa devem mandar entregar alimentos e outros bens essenciais ao seu domicílio. Quando possível, devem encontrar-se com membros da família no exterior e não no interior. Uma lista abrangente e detalhada de medidas, incluindo abordagens a famílias de várias gerações, pode ser implementada, e está bem dentro do âmbito e da capacidade dos profissionais de saúde pública.

Aqueles que não são vulneráveis devem ser imediatamente autorizados a retomar a vida normal. Medidas simples de higiene, tais como a lavagem das mãos e a permanência em casa quando estão doentes devem ser praticadas por todos para reduzir o limiar de imunidade de grupo. As escolas e universidades devem estar abertas ao ensino presencial. As atividades extracurriculares, como o esporte, devem ser retomadas. Os jovens adultos de baixo risco devem trabalhar normalmente, e não a partir de casa. Restaurantes e outras empresas devem ser abertos. As artes, música, esportes e outras atividades culturais devem ser retomadas. As pessoas que estão mais em risco podem participar se desejarem, enquanto a sociedade como um todo terá proteção conferida aos vulneráveis por aqueles que acumularam imunidade de grupo.

Críticas à imunidade de rebanho

O ministro de saúde da Inglaterra atacou os especialistas que defendem a estratégia de imunidade coletiva (de rebanho) para o coronavírus, descrevendo-a como uma “meta falha”. Os comentários de Matt Hancock foram feitos após o lançamento da Declaração do Great Barrington, em um encontro com parlamentares. “Se deixarmos este vírus continuar sem controle, a perda de vidas seria simplesmente grande demais para ser contemplada”, disse aos parlamentares.


“Primeiro, diz que se um número suficiente de pessoas contrair COVID, alcançaremos a imunidade coletiva. Isso não é verdade”, disse o ministro de saúde. “Muitas doenças infecciosas nunca alcançam a imunidade coletiva, como sarampo, malária, Aids e gripe, e com evidências crescentes de reinfecção, não devemos ter confiança de que alcançaremos a imunidade coletiva contra COVID, mesmo que todos contraiam… A imunidade do rebanho é uma meta falha sem uma vacina, mesmo se pudéssemos alcançá-la, o que não podemos. A segunda alegação central defendida é que podemos separar os idosos e os vulneráveis em nosso caminho para a imunidade coletiva. Isso simplesmente não é possível”, completou Hancock.


 



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