Gestão e Qualidade | 11 de maio de 2018

Hospitais apresentam práticas de segurança do paciente e gestão de risco no Seminários de Gestão

Clínicas, Ernesto Dornelles e São Lucas-PUC apresentaram cases no evento
Hospitais apresentam práticas de segurança do paciente e gestão de risco no Seminários de Gestão

Melhor comunicação interna, práticas centradas no paciente e compreensão de todos os processos decisórios. Estes tópicos estiveram presentes nos três cases apresentados na 6ª edição do evento Seminários de GestãoSEGURANÇA DO PACIENTE, promovido pela Federação dos Hospitais e Estabelecimentos de Saúde do RS (FEHOSUL), Sindicato dos Hospitais e Clínicas de Porto Alegre (SINDIHOSPA) e Associação dos Hospitais do Rio Grande do Sul (AHRGS),  no Hotel Continental, em Porto Alegre, na sexta-feira (4).

As três apresentações ficaram por conta do Dr. Ricardo Kuchenbecker (Gerente de Risco do Hospital de Clínicas de Porto Alegre); da enfermeira Cassiana Gil Prates (Coordenadora de Epidemiologia e Gerenciamento de Riscos do Hospital Ernesto Dornelles/RS) e da Dra. Renata Farinon (Gerente de Linha de Contato do Paciente e Médica do Núcleo de Qualidade e Segurança do Paciente do Hospital São Lucas da PUCRS). Ferando Torelly (Diretor Executivo do Hospital Sírio-Libanês) também participou da atividade, cedendo cordialmente depoimento em vídeo gravado direto de evento realizado na Europa.

Lotação máxima em mais um Seminários de Gestão

Lotação máxima em mais um Seminários de Gestão

 

Os patrocinadores deste encontro foram o Banrisul e Pixeon. O portal Setor Saúde é o veículo de comunicação oficial do evento e a Fasaúde/IAHCS é a instituição de Ensino Superior responsável pela emissão dos certificados do evento, com apoio do IAHCS Acreditação.

Dr. Ricardo Kuchenbecker

O primeiro case apresentado teve o tema “Desafios à gestão proativa de riscos assistenciais”.  O Gerente de Risco iniciou afirmando que a qualidade assistencial é um compromisso de todos numa instituição de saúde. De acordo com Kuchenbecker, para alcançar uma boa qualidade assistencial é importante, além do comprometimento de todos na instituição, melhores práticas, avaliação permanente e transparência de informações.

Ricardo Kuchenbecker do Hospital de Clínicas de Porto Alegre

Ricardo Kuchenbecker do Hospital de Clínicas de Porto Alegre

 

Kuchenbecker explicou o percurso realizado pelo HCPA, entre 2009 e 2017, para consolidar a qualidade e segurança no atendimento. Entre os fatores, destacam-se: acreditação; gerenciamento de risco; gestão documental; padronização de processos; desenvolvimento de lideranças; gestão de operações; gestão dos indicadores (incluindo avaliação de performance clínica); e aproximação da clínica com o processo administrativo.

O Gerente de Risco também frisou a importância das 16 subcomissões de segurança que existem hoje no Clínicas. “Uma estrutura complexa de governança da estrutura da gestão da segurança do paciente. Essas subcomissões vão desde a UTI até áreas de fora do prédio principal da instituição. São mais de 150 profissionais que, de alguma forma, doam seu tempo para auxiliar na segurança do paciente”, destacou. Kuchenbecker abordou as ações tomadas nos últimos anos, enfatizando , entre outras, a parceria feita pelo Clínicas com a área de Engenharia de Produção da UFRGS, para desenvolver uma consultoria interna formadora de lideranças.

De acordo com o Gerente de Risco, nos últimos anos foi valorizada a importância de utilização da grande base de dados que o Hospital de Clínicas possui e, a partir de apropriadas análises de dados, entender melhor os padrões e perfis para, além de auxiliar os projetos de pesquisa, aprimorar a qualidade de assistência.

Em 2017, para adequação da instituição às atuais legislações de saúde sobre segurança do paciente, foi criada uma coordenadoria de gestão de risco corporativo. “A Gerência de Risco, o programa Qualis e esta comissão somadas fazem parte de toda esta estrutura de governança da gestão da segurança do Hospital”, disse.

Foram notificados 3.458 eventos adversos no Hospital de Clínicas em 2017. Destes, apenas 23 (0,7%) foram eventos adversos graves. Entre as causas: falha no processo diagnóstico; troca de paciente em procedimento diagnóstico; reação transfusional hemolítica aguda; tentativa de homicídio de familiar do paciente; tentativa de suicídio na unidade de internação; PCR no Serviço de Ambulatório.

O Gerente de Risco ressaltou que os números são importantes, porém é necessário compreendê-los. Ele enfatizou a importância de compreender os processos de transição do cuidado entre equipes. “Contar não é suficiente, é importante entender melhor. O mais importante é entender como ocorre a rotina da equipe do paciente”, asseverou.

“Ou somos capazes de entender o trabalho humano ou ele nos devora”

“Ou somos capazes de entender o trabalho humano ou ele nos devora”

 

Para explicar o processo de entendimento dos dados e das ocorrências de eventos adversos, Kuchenbeker citou dois modelos, a Segurança 1.0 e a Segurança 2.0. “A partir da segurança 1.0, podemos analisar eventos e tirar aprendizado disso. Porém, quando olhamos os eventos adversos, estamos falando de uma situação que não é usual. Pode ser até eventualmente frequente, mas não é como a equipe funciona no dia-a-dia. Quando olhamos os eventos adversos, estamos observando apenas uma dimensão. O mais importante é entender como funciona a rotina das equipes no dia-a-dia. Isso é a Segurança 2.0, que entende um pouco melhor como se dão os processos decisórios”, explicou.

De acordo com o Gerente de Risco, o que ele e sua equipe buscam compreender no HCPA como estratégia proativa de gerência de risco é como as equipes tomam decisões. “Ou somos capazes de entender o trabalho humano ou ele nos devora”, alertou. Kuchenbecker explicou que os processos decisórios ocorrem em múltiplas dimensões, e que o desafio é compreendê-los com todas as complexidades presentes. “Entender melhor como pensa o sujeito, que decisões ele toma, são aspectos fundamentais para construir uma gestão adequada de segurança”.

De forma geral, a palestra de Kuchenbecker apresentou um alerta: a segurança do paciente depende do engajamento das equipes e se caracteriza por uma série de ações proativas das direções para incentivar internamente a construção deste cenário dentro das organizações hospitalares.

Enfermeira Cassiana Gil Prates

O case seguinte foi apresentado pela enfermeira Cassiana Gil Prates, que apresentou “Na busca pela cultura da segurança do paciente: experiência do Hospital Ernesto Dornelles”.

A enfermeira iniciou a sua apresentação relembrando um conhecido episódio ocorrido em 2008 no Ernesto Dornelles, onde teria ocorrido a amputação de uma perna errada de um paciente. “Eu me arrisco a dizer que, em todas as instituições aqui presentes, um fato como esse ou semelhante já aconteceu. Cada um de nós como profissional de saúde temos uma triste realidade como essa para contar. A diferença está em como cada uma vai lidar com isso”, relatou.

Cassiana Gil Prates

Cassiana Gil Prates, do Hospital Ernesto Dornelles

 

De acordo com Prates, uma importante ação posterior foi a criação do Serviço de Epidemiologia e Gerenciamento de Riscos (Seger) no HED, para ter maior controle dos riscos. A enfermeira também citou a importância estratégica da instituição na área assistencial: além de implementar a pesquisa, o ensino e a educação continuada e fortalecer a gestão assistencial; o Ernesto Dornelles também enfatiza a consolidação da cultura pela segurança do paciente.

“O Seger visa garantir a segurança do paciente através do gerenciamento dos riscos envolvidos nos processos assistenciais, técnicos e administrativos, implementando a cultura pela segurança e instituindo práticas de excelência no HED”, contou. Outro órgão importante citado pela enfermeira é  o Núcleo de Segurança do Paciente (NUSP).

As estratégias para segurança do paciente foram destacadas na apresentação. De acordo com a enfermeira, há oito tópicos bem definidos: cultura pela segurança do paciente; gerenciamento dos incidentes assistenciais; protocolos de segurança do paciente; protocolos clínicos e assistenciais; rede sentinela da Anvisa; grupos técnicos para segurança do paciente; matriz de indicadores assistenciais; e mapa de riscos assistenciais.

A palestra enfatizou que a cultura pela segurança do paciente em uma instituição consolida-se em um processo em que a maturidade consolida-se com o tempo. Há cinco fases na consolidação deste processo: patológica (“Por que desperdiçar tempo com segurança?”); reativa (“Fazemos alguma coisa quando temos algum incidente”); burocrática (“temos sistemas para gerenciar todos os riscos identificados”); proativa (“estamos sempre alertas para os riscos que podem emergir”); e geradora (“a gestão de risco é parte de tudo o que fazemos”). “Hoje, nos encontramos entre a fase reativa e burocrática”, explicou.

Para mudar a cultura, precisamos de calor humano, empatia, criação de valor. E é fundamental que as coisas façam sentido"

“Para mudar a cultura, precisamos de calor humano, empatia, criação de valor. E é fundamental que as coisas façam sentido”

 

A enfermeira ressaltou as dificuldades iniciais de implementação, porque não havia uma cultura dentro da organização voltada à segurança do paciente, e o desafio agora é consolidar este processo. De acordo com Prates, a cultura pela segurança do paciente deve ser justa, educativa e transparente.

A necessidade de compreender os aspectos práticos também foi enfatizado na apresentação. “Desenvolver planos de ação para correção e melhorias, este é o momento que devemos enfatizar, é isso o que vale. Sentar com o técnico de enfermagem para investigar o que está acontecendo: é isso que vai nos trazer o aprendizado, para saber de fato o que está acontecendo. Temos que sair do nível gerencial e tático se quisermos de fato fazer o gerenciamento de incidentes”, frisou.

Entre as estratégias estabelecidas, o protocolo de cirurgia segura foi uma das pioneiras, implantado em 2009. Um check-list auxilia a identificar as práticas cirúrgicas estabelecidas. “Após a implantação, houve uma drástica redução na taxa de infecção em cirurgia limpa”, disse. Hoje, uma vigilância de processos de controle de infecções identifica se o check-list está sendo corretamente realizado.

No final, Cassiana reforçou a importância de haver confiança, relato e busca contínua pela melhoria. Para que isso ocorra, é necessário que os profissionais conversem mais entre si, com empatia entre todos. “Para mudar a cultura, precisamos de calor humano, empatia, criação de valor. E é fundamental que as coisas façam sentido. Se a segurança do paciente não faz sentido para aquele colaborador que está lá na ponta, ele não vai atender a meta de segurança. Se ele não enxergar a cultura de segurança na direção do hospital, ele não vai conferir a pulseira no leito. A segurança do paciente vai acontecer se fizer sentido para todas as pessoas”, destacou.

Dra. Renata Farinon

O último case foi apresentado pela Dra. Renata Farinon sob o título um “Novo olhar sobre a qualidade e segurança do paciente”. Assim como as duas apresentações anteriores, foi enfatizada a importância de promover mudanças na instituição de saúde para consolidar melhores práticas de segurança.

A médica instigou os presentes, colocando em questão quais mudanças devem ser feitas. Então, Farinon destacou três ações que devem ser realizadas: encarar a realidade, buscar novos modelos e identificar a diferença entre o desempenho atual e o desejado.

Renata Farinon do Hospital São Lucas da PUCRS

Renata Farinon do Hospital São Lucas da PUCRS

 

No São Lucas, o maior problema identificado pela médica “foi a fragmentação. Era um hospital totalmente compartimentado, que não conversava entre si. Nós precisávamos mudar nosso modelo de gestão, sair do patamar bom que estávamos para a excelência”.

Uma das primeiras ações, durante a busca pelas certificações, foi a reestruturação do Núcleo de Qualidade e Segurança do Paciente  (NQSP), hoje composto por cinco profissionais: enfermeira coordenadora da Qualidade e Segurança do Paciente; enfermeira do Gerenciamento de Riscos; médica do Núcleo de Qualidade e Segurança do Paciente; analista de Planejamento e Controle; e uma analista de sistema.

Com o NQSP, a meta inicial foi integrar o hospital. “O hospital estava muito perdido. Cada setor com seus indicadores, seus protocolos, e os setores não se conversavam”, explicou. Também ocorreu a estruturação dos protocolos assistenciais, conscientização sobre notificações e eventos, a disseminação da cultura de segurança aos colaboradores, auditorias internas, gestão de processos, entre outras medidas.

Farinon ressaltou que em junho, mês em que foi reestruturado o NQSP, estavam registradas 101 notificações, e o número passou a aumentar a cada mês. Em dezembro, foram 428 casos notificados pelo Núcleo.

Entretanto, a médica enfatizou a necessidade de compreender profundamente os processos de segurança ocorridos no hospital. De acordo com Farinon, é preciso transformar os cuidados centrados na doença para que o paciente seja o centro dos cuidados. “Temos que parar de olhar a doença e olhar o paciente”, ressaltou.

Foram desenvolvidas linhas de cuidado, fazendo com que todos os setores se interligarem e todas as pessoas que trabalham se conversarem para oferecer o melhor cuidado. “É cuidar do paciente em toda a trajetória dele dentro da instituição”, explicou.

O plano terapêutico de gestão do paciente desenvolvido baseia-se em estratégias como identificar as necessidades do paciente, estabelecer a relação da necessidade do paciente com as comorbidades, definir a equipe multidisciplinar para desenvolver o processo, estabelecer indicadores de resultados bem específicos, promover a integração, avaliar resultados, entre outros.

“Temos que parar de olhar a doença e olhar o paciente”

“Temos que parar de olhar a doença e olhar o paciente”

 

A médica finalizou a sua apresentação salientando a importância de um novo olhar para o tema da segurança do paciente. Ela voltou a pontuar a necessidade do cuidado ser centrado no paciente, com a linha de cuidado durante todo o processo; disseminar e consolidar a cultura de segurança; análise contínua de indicadores e busca de melhorias; busca pela Acreditação Internacional com foco assistencial Qmentum (modelo de Acreditação canadense); e inserção do tema qualidade e segurança nas Escolas de Medicina e Saúde.

Ao final das palestras, foi apresentando um vídeo gravado pelo diretor executivo do Hospital Sírio-Libanês (SP/DF), Fernando Andreatta Torelly, apresentando as últimas tendências direto do The International Forum on Quality and Safety in Healthcare realizado entre os dias 2 e 4 de maio em Amsterdam. Torelly é um dos idealizadores do Seminários de Gestão, série de eventos que iniciou em 2016. Veja o vídeo:

Logo após, Antonio Quinto Neto – colunista do portal Setor Saúde e diretor do Hospital Banco de Olhos – comandou uma rodada de debates, oportunizando ao público interagir com os palestrantes.

O presidente do SINDIHOSPA, Henri Siegert Chazan, fez uma comparação com aviação para a área da saúde sempre aprimorar seus métodos. Chazan lembrou que os conceitos de check-list, comunicação integrada e gerenciamento de equipes são adotados para um voo decolar e pousar tranquilamente. ” A análise de acidentes aeronáuticos, por exemplo, existe mais para entender o porquê do acidente do que uma medida punitiva. A ideia é evitar a sua repetição” comparou o presidente do SINDIHOSPA.
Allgayer, Kuchenbecker, Farinon, Quinto, Flávio Borges, Rohsig e Chazan

Allgayer, Kuchenbecker, Prates, Farinon, Quinto, Flávio Borges, Rohsig e Chazan

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