Estatísticas e Análises | 29 de agosto de 2020

Covid-19: os diferentes riscos conforme a distância física, ventilação e tempo de exposição ao vírus

Confira o Guia do risco de transmissão em diferentes situações
Covid-19 os diferentes riscos conforme distância da outra pessoa, ventilação e tempo de exposição ao vírus

O distanciamento físico é uma parte importante entre as medidas para controlar o crescimento de casos de Covid-19, mas não está claro exatamente a que distância e por quanto tempo o contato é seguro, em diferentes situações. Em artigo publicado no periódico The BMJ (British Medical Journal), do Reino Unido, dados apresentados mostram se as regras de 2 metros de distanciamento são seguras, além de abordar os riscos de contaminações em diferentes contextos (uso de máscara, ventilação do local, quantidade de pessoas reunidas etc). Ainda, o texto aponta que a carga viral do emissor, a duração da exposição e a suscetibilidade de um indivíduo à infecção também são fatores importantes.


“Em vez de regras únicas e fixas relacionadas à distância física, propomos recomendações graduadas que refletem de melhor forma os vários fatores que se combinam para determinar o risco. Isso proporcionaria maior proteção nos ambientes de maior risco, mas também maior liberdade em ambientes de menor ameaça, potencialmente permitindo um retorno à normalidade levando em conta alguns aspectos da vida social e econômica”, diz o texto.


O vírus pode se espalhar além dos dois metros de distância recomendados

A matéria aponta que oito de dez estudos (80%) mostraram projeção horizontal de gotículas respiratórias além de 2 metros. Em um dos estudos, a dispersão de gotículas foi detectada em 6 a 8 metros. Esses resultados sugerem que o SARS-CoV-2 pode se espalhar além de 2 metros recomendados, por meio de tosse ou espirros.

A regra que estipula uma distância física específica, geralmente de 1 ou 2 metros, entre os indivíduos é baseada em experiências com vírus anteriores e evidências desatualizadas, argumentam os cientistas do estudo.

Propagação de partículas aerotransportadas de SARS-CoV-2

Doenças transmitidas por partículas transportadas pelo ar, como sarampo e varicela, podem viajar muito mais longe, e em nuvens concentradas, do que aquelas transmitidas por gotículas grandes, que caem das nuvens mais rapidamente. Eles podem, portanto, expor outras pessoas rapidamente e a uma distância maior e podem precisar de diferentes medidas de saúde pública, incluindo distanciamento físico prolongado. Estudos laboratoriais também sugerem que as partículas virais dos coronavírus conhecidos (SARS-CoV-1, SARS-CoV-2 e MERS-CoV) são estáveis em amostras transportadas pelo ar, com o SARS-CoV-2 (vírus da Covid-19) podendo se manter persistente por mais tempo (até 16 horas).

Em uma pesquisa bibliográfica com base em estudos que usaram técnicas de amostragem do ar para detectar partículas virais em torno de pacientes com Covid-19, foram encontrados nove estudos com análise em hospitais e dois em ambientes comunitários. Sete dos estudos de hospitais relataram que pelo menos uma amostra transportada pelo ar testou positivo para SARS-CoV-2, embora a proporção de amostras positivas entre os estudos variasse entre 2% e 64%. Apenas dois relataram resultados positivos em relação à distância de um paciente infectado (um a 2 metros e outro a 4 metros ou mais no corredor). Dos dois estudos de hospitais que não encontraram partículas de SARS-CoV-2 em amostras de ar, um coletou amostras positivas de unidades de ventilação no quarto do paciente, o que é consistente com a disseminação de gotículas no ar.

Espirro_Covid

Nenhum estudo da comunidade (fora do ambiente hospitalar) relatou amostras de ar positivas, embora um tenha coletado amostras até 17 dias após os portadores de Covid-19 terem deixado a sala e o outro não relatou o tempo de amostragem desde a limpeza ou distância de amostragem da pessoa infectada. Esses estudos negativos, portanto, ficam longe de provar que a propagação aerotransportada não ocorre.

Apenas dois dos estudos de amostragem aerotransportados mediram diretamente se o SARS-CoV-2 nas amostras permanecia infeccioso, ao invés de apenas analisar a presença de RNA viral. Nenhum vírus viável (ativo) foi encontrado nesses estudos, embora um tenha encontrado sinais de capacidade viral de se replicar. Além disso, nenhum estudo encontrou vírus viáveis em superfícies.

O texto ressalta que esses estudos eram pequenos, observacionais e heterogêneos em termos de ambiente, participantes, coleta de amostras e métodos de manuseio, possuindo algumas limitações (poucas pessoas podem lembrar com precisão o quão próximos eles chegaram dos outros quando solicitados a lembrar posteriormente). Em geral, esses estudos parecem apoiar a possibilidade de disseminação do SARS-CoV-2 pelo ar, mas não confirmam que haja risco de transmissão da doença.

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Força de emissão, ventilação, tempo de exposição

Expirar, cantar, tossir e espirrar geram nuvens de gás quente, úmido e de alto impulso de ar expirado contendo gotículas respiratórias. Isso move as gotículas mais rápido do que os fluxos normais de ventilação, mantendo-as concentradas e pode estender seu alcance para até 7 a 8 metros em alguns segundos.

Essas descobertas de estudos de dinâmica de fluidos ajudam a explicar por que em uma prática de coral nos EUA, uma pessoa sintomática infectou pelo menos 32 outros cantores, com mais 20 casos prováveis, apesar do distanciamento físico. Também foram relatados casos de contaminações em academias de ginástica, centrais de atendimento e igrejas, onde as pessoas podem cantar, ofegar ou falar alto. Curiosamente, houve poucos relatos de surtos em aviões, que podem refletir o baixo volume atual de passageiros, falta de rastreamento de contato ou relativamente baixo risco pela fala limitada no local.

A respiração ofegante de correr e outros esportes produz expirações de maior impulso. Isso aumenta a distância alcançada pelas gotículas presas dentro da nuvem exalada e sustenta a necessidade de um distanciamento maior durante exercícios físicos. No entanto, as gotículas respiratórias tendem a ser mais rapidamente diluídas em ambientes externos bem arejados, reduzindo o risco de transmissão (uma pré-impressão do Japão relata um risco maior de transmissão em ambientes internos do que ao ar livre).

Padrões específicos de fluxo de ar, e não apenas ventilação média e mudanças de ar, dentro de edifícios também são importantes para determinar o risco de exposição e transmissão. Um relato de caso de um surto em um restaurante na China descreveu 10 pessoas em três famílias infectadas ao longo de uma hora, a distâncias de até 4,6 metros e sem contato físico direto. O padrão de transmissão foi consistente com o padrão de fluxo de ar da ventilação localizada interna.

O texto destaca que poucos estudos examinaram como os padrões de fluxo de ar influenciam a transmissão viral; a maioria dos estudos relata (se houver) apenas taxas médias de ventilação interna. De acordo com os autores, negligenciar a variação no fluxo de ar localizado dentro de um espaço simplifica e subestima a modelagem de risco. No fluxo homogêneo, os padrões são conhecidos por emergir em espaços internos ocupados que dependem do ar condicionado, sistema de ventilação ou localização, ocupação do espaço, recirculação de ar e filtração.

Diferentes situações que definem os riscos

As influências ambientais são fatores decisivos. Por exemplo, como observado em frigoríficos, onde os surtos foram atribuídos à combinação de altos níveis de contágio do trabalhador, má ventilação, condições de trabalho apertadas, ruído de fundo (que leva a gritos) e baixa adesão ao uso de máscara. Situações de riscos semelhantes podem ocorrer em outros ambientes fechados, lotados e barulhentos, como bares e restaurantes com música ao vivo.

Guia do risco de transmissão em diferentes situações

As regras de distanciamento físico seriam mais eficazes se refletissem os níveis graduais de risco. A Figura abaixo apresenta um guia de como o risco de transmissão pode variar com o ambiente, o nível de ocupação, o tempo de contato e o uso de coberturas faciais. Essas estimativas se aplicam quando todos são assintomáticos. Nas situações de maior risco (ambientes internos com pouca ventilação, altos níveis de ocupação, tempo de contato prolongado e sem coberturas faciais, como um bar lotado ou boate), o distanciamento físico além de 2 metros e minimizando o tempo de ocupação deve ser considerado. É provável que um distanciamento menos rigoroso seja adequado em cenários de baixo risco. Pessoas com sintomas (que devem, em qualquer caso, isolar-se) tendem a ter alta carga viral e exalações respiratórias (como tosse) mais frequentes.

Os níveis de risco na fig. 3 são relativos, não absolutos, especialmente em relação aos limites de tempo e ocupação, e não incluem fatores adicionais, como suscetibilidade dos indivíduos à infecção, padrões de fluxo de ar interno e onde alguém é colocado em relação à pessoa infectada. A umidade também pode ser fator importante.

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De acordo com a matéria, são necessários mais estudos que coloquem três questões ainda incertas em perspectiva: a duração das exposições ao vírus em relação à condição interna, ocupação e nível de eliminação viral; o estudo detalhado dos padrões de fluxo de ar em relação à fonte infectada e sua relação com a ventilação média; e os padrões e propriedades das emissões respiratórias e da infectividade das gotículas durante várias atividades físicas.

O distanciamento físico deve ser visto como apenas uma parte de uma estratégia mais ampla de saúde pública para conter a Covid-19. Ele precisa ser implementado juntamente com estratégias combinadas que levem em conta a ocupação de pessoas, ventilação do ambiente e medidas preventivas, que incluem higiene das mãos, limpeza, ocupação e gerenciamento de espaço interno e ar, e equipamentos de proteção adequados, como máscaras.

Baixe a tabela traduzida aqui. 

 

 



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