Estatísticas e Análises | 29 de dezembro de 2017

A importância e as controvérsias da medicina baseada em evidências

Termo divide profissionais que entendem o conceito e a prática de maneira diferente
A importância e as controvérsias da medicina baseada em evidências

Na medicina, o termo “baseado em evidências” causa mais discussões do que alguém de fora do mercado poderia imaginar. Essa ideia é surpreendentemente recente. Antes da sua chegada, grande parte dos medicamentos receitados baseava-se na experiência clínica. Os médicos tentavam descobrir o que funciona por tentativa e erro e passavam seus conhecimentos para os novos profissionais, segundo constatou artigo publicado na The New York Times, do professor de pediatria da Indiana University School of Medicine, Dr. Aaron E. Carroll.

Segundo o professor, muitos profissionais foram introduzidos pela primeira vez utilizando o termo “medicina baseada em evidências” através do manual de David Sackett, chamado Evidence-Based Medicine: How to Practice and Teach EBM, publicado pela primeira vez em 1997.

 “O livro me ensinou a usar as características, como sensibilidade e especificidade, para interpretar testes médicos. Ensinou-me a compreender o risco absoluto versus o risco relativo. Ensinou-me as formas adequadas de usar estatísticas no diagnóstico e tratamento, e na pesagem de benefícios e danos”, relata. Aaron também destaca a importância de ensaios controlados aleatórios e o grande potencial de meta-análises, que agrupam os ensaios individuais para maior impacto.

Entretanto, a medicina baseada em evidências é muitas vezes descrita de forma bastante diferente. Segundo o Pediatra, muitos de seus apoiadores dizem que o uso de medicamentos baseados em evidências pode resolver problemas de custo, qualidade e acesso. Criando uma ideia de que “se todos concordarmos com as melhores práticas – com base em dados e pesquisas – podemos reduzir os cuidados desnecessários, economizar dinheiro e levar melhores resultados para as pessoas”.

Já os críticos da medicina baseada em evidências apontam que há evidências fracas e muitas diretrizes. De acordo com o especialista, alguns profissionais acreditam que a medicina é mais uma “arte” do que uma “ciência” e que limitar a prática a uma abordagem sistemática remove o foco individual no paciente. Outro termo muito utilizado recentemente é a medicina personalizada, que olha com um olhar mais individualizado para os tratamentos.

“Alguns desses críticos se preocupam que as diretrizes alinhem as ideias de empresas farmacêuticas e radiologistas para que exijam mais medicamentos e exames. Outros se preocupam com o fato de que a medicina baseada em evidências torna mais difícil para os planos de saúde pagarem os cuidados necessários. Já as companhias se preocupam que as recomendações baseadas em evidências utilizem o tratamento com o menor valor”, explica.

Segundo Aaron, os dois lados estão um pouco certos e errados, ao mesmo tempo. “Esta batalha não é nova, já vem acontecendo por algum tempo. É a velha guarda contra a nova. É o paciente versus o sistema. É liberdade versus racionamento”, diz.

O médico enfatiza que os benefícios da medicina baseada em evidências, quando aplicados corretamente, são óbvios, possibilitando usar características de teste e resultados para fazer melhores diagnósticos. “Podemos usar evidências de tratamentos para ajudar as pessoas a fazerem melhores escolhas…. Podemos elaborar pesquisas para nos dar a informação que está faltando para melhorar vidas. E, quando temos estudos suficientes disponíveis, podemos examiná-los juntos para fazer recomendações com mais confiança”, defende.

Pesquisas de qualidade 

Entretanto, quando a medicina baseada em evidências não é aplicada corretamente, pode causar danos. Diretrizes inadequadas são promovidas como “baseadas em evidências” para interesses específicos ou controlar provedores de saúde. “Muitas vezes tratamos todas as provas como equivalentes. Perdi o número de vezes que me disseram que “pesquisa X” prova que eu estou errado. Nem toda pesquisa tem o mesmo peso. Existe uma hierarquia de qualidade, e temos que ter certeza na hora de escolher”, conta.

Existe uma diferença entre significado estatístico e clínico. Aaron garante que a estatística por si só não garante que o resultado alcance um significado clínico e que altere a prática dos profissionais de medicina. Mesmo quando são feitos bons estudos, com resultados clinicamente significativos, não devemos tratar como verdade absoluta. “Só porque algo funcionou em uma determinada população não significa que devemos fazer as mesmas coisas para outro grupo e dizer que temos provas disso”, afirma.

Muitos artigos e estudos são rápidos em apontar que algo provou ser perigoso para a nossa saúde, sem uma boa explicação da magnitude desse risco. Big Data, sequenciamento de genes, inteligência artificial podem nos fornecer muitas informações sobre como podemos estar em risco em relação a várias doenças. Porém, o que nos falta é conhecimento sobre o que fazer com esses dados.

“O foco da medicina baseada em evidências deve ser a equidade. Não utilizar suposições e tratar isso como verdade. Isso, provavelmente, é a razão do termo ser tão confundido”, finaliza.

Com informações de The New York Times. Edição Setor Saúde.

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