Estudo apresenta detalhes de crianças em situação grave pelo novo coronavírus nos EUA
A maioria dos 48 pacientes estudados tinham condições médicas pré-existentesÀ medida que cresce a preocupação com o possível potencial das crianças ficarem gravemente doentes com a Covid-19 (doença causada pelo novo coronavírus), um novo estudo mostra um quadro mais detalhado de crianças que foram tratadas em unidades de terapia intensiva nos Estados Unidos durante a pandemia.
Em São Paulo, foi confirmada a morte de uma criança de apenas 4 anos nesta segunda-feira, 11. Estes casos têm chamado a atenção de pesquisadores em todo o mundo, com casos registrados em países como a China, EUA e Inglaterra, dentre outros.
Estudo da Jama Pediatrics
No estudo, nenhuma das crianças do estudo, publicado na segunda-feira (11) na revista JAMA Pediatrics, foi afetada pela nova e misteriosa síndrome inflamatória multissistêmica pediátrica (Síndrome de Kawasaki) ligada ao coronavírus, que pode causar problemas cardíacos com risco de vida em crianças. Elas sofreram com a principal linha de ataque do vírus: os graves problemas respiratórios que atingiram dezenas de milhares de adultos.
O estudo analisou 48 casos de 14 hospitais, em crianças e jovens de até 21 anos, durante o final de março e o início de abril. Duas das crianças morreram. Dezoito foram colocadas em ventiladores/respiradores e duas permaneceram nos aparelhos respiratórios por um período superior a um mês, de acordo com a Dra. Lara S. Shekerdemian, chefe de cuidados intensivos do Hospital Infantil do Texas e autora do estudo.
No geral, o estudo reforça a evidência de que apenas uma pequena porcentagem de crianças será severamente afetada pelo vírus, e confirma que algumas podem ficar devastadoramente doentes.
“Você pode ler isso como um copo meio vazio ou meio copo cheio”, disse Daniele De Luca, presidente da Sociedade Europeia de Terapia Intensiva Pediátrica e Neonatal, que não participou do estudo. “No final do dia, temos que perceber que essa doença pode realmente ser grave em crianças. Não é como no começo, quando algumas pessoas diziam: OK, isso nunca vai acontecer”, afirmou.
Crianças em estado grave tinham condições pré-existentes
A grande maioria dos pacientes – 40 crianças (ou 80%), incluindo as duas que morreram – tinha condições médicas pré-existentes. Quase metade desses pacientes apresentava distúrbios complexos no desenvolvimento, como paralisia cerebral ou tratamentos que envolvem traqueostomias ou tubos de alimentação. Outros problemas de saúde pré-existentes incluíam câncer e sistemas imunológicos suprimidos de transplantes de órgãos ou condições imunológicas.
Estudo não identificou a “Síndrome de Kawasaki”
Nenhuma das crianças do estudo exibiu a síndrome inflamatória pediátrica multissistêmica (ou Síndrome de Kawasaki), que os especialistas acreditam poder ser uma condição latente que se desenvolve semanas após a infecção inicial por coronavírus e ataca o sistema circulatório de uma criança com inflamação ao invés de atacar diretamente os pulmões. No fim de semana, o governador Andrew M. Cuomo, de Nova Iorque, relatou que três crianças no estado morreram dessa doença e, na semana passada, o jornal científico Lancet registrou uma morte na Inglaterra.
O novo estudo também sugere que, pelo menos neste momento da pandemia, “ninguém sabe qual é o tratamento adequado para essas crianças muito doentes”, disse o Dr. Nigel Curtis, professor de doenças infecciosas pediátricas da Universidade de Melbourne, que não esteve envolvido na pesquisa.
Tratamentos
Os hospitais usaram muitos métodos de suporte respiratório, bem como medicamentos não comprovados, como hidroxicloroquina, remdesivir e tociluzimab para tratar as crianças. Outras abordagens incluem óxido nítrico inalado e plasma sanguíneo.
“Eles receberam uma variedade de tratamentos diferentes de uma maneira não sistemática, porque, é claro, é compreensível que esses médicos em terapia intensiva façam o melhor possível por essas crianças e, portanto, tentem diferentes terapias potenciais”, disse o Dr. Curtis, que também é chefe de doenças infecciosas no Royal Children’s Hospital de Melbourne, na Austrália.
O estudo foi conduzido por membros de uma colaboração internacional de mais de 300 especialistas em terapia intensiva pediátrica e doenças infecciosas formados para estudar o coronavírus em crianças e fazer recomendações.
Quarenta e seis hospitais concordaram em participar do estudo, que incluiu pacientes com infecções confirmadas por coronavírus que foram admitidos em UTI pediátricas na América do Norte entre 14 de março e 3 de abril, disse a Dra. Shekerdemian, que também é vice-presidente de pediatria do Baylor College of Medicine, no Texas. Mas apenas 16 dos hospitais tiveram casos durante esse período e apenas 14 informaram dados a tempo da publicação, disse ela. A baixa incidência de casos neste grupo de pacientes é mais um problema que a pandemia trouxe. Esta situação exigirá uma cooperação entre vários centros de pesquisa, de diferentes regiões do mundo, para identificar e analisar protocolos, exames e resultados.
Impacto nas crianças segue sendo estudado
Os cientistas também estão estudando por que a maioria das crianças parece menos afetada do que os adultos, uma pergunta que pode ajudá-los a aprender mais sobre como o vírus funciona em geral. As teorias incluem que as células que revestem os vasos sanguíneos e o coração mudam à medida que envelhecemos ou que as células pulmonares das crianças expressam níveis mais baixos de proteínas que ajudam o vírus a entrar nas células e a se replicar.
Os médicos enfatizam a necessidade de abordagens padronizadas de tratamento para crianças. “É fundamental que tentemos todas essas terapias de maneira sistemática”, disse Curtis. “Os médicos temem que, porque haja um pequeno número de crianças, elas sejam deixadas de fora dos ensaios clínicos, mas é importante que as crianças sejam incluídas”.
Doença de Kawasaki
A doença de Kawasaki afeta principalmente crianças de até cinco anos de idade e causa inflamação das paredes das artérias, resultando em febre, descamação da pele e dor nas articulações. O prefeito de Nova Iorque, Bill de Blasio, manifestou “tremenda preocupação” com um aumento nos casos de uma síndrome pediátrica que os cientistas suspeitam estar ligados à Covid-19.
Bill de Blasio disse no domingo, 10 de maio, que foram detectados 38 casos de síndrome de Kawasaki na cidade de Nova Iorque, com outros nove casos suspeitos aguardando confirmação.
O Serviço Nacional de Saúde da Grã-Bretanha soou o alarme no mês passado, alertando sobre um pequeno aumento em crianças infectadas com o coronavírus que têm “características sobrepostas da síndrome do choque tóxico e da doença atípica de Kawasaki”. A França também relatou vários casos.
Embora assustador, a maioria se recupera sem problemas sérios. O que preocupa bastante é que muitos países já estão liberando as aulas para crianças pequenas, o que poderia potencializar a infecção neste grupo, requerendo leitos de UTI para tratamentos, hoje vitais, para pessoas com mais idade e com comorbidades importantes.