Emergências na França vivem situação delicada
Caso do tradicional e cêntrico L'Hotel-Dieu reflete o momento de sobrecarga das unidadesMeses antes das eleições municipais francesas, que devem ocorrer no primeiro semestre de 2014, o futuro do serviço de emergência do Hotel-Dieu, hospital localizado a 50 metros da Catedral de Notre Dame, tornou-se um tema polêmico e assunto forte na campanha. A unidade é exemplo da atual situação delicada pela qual passa todo o setor hospitalar e seus serviços de urgência.
O sistema de emergências da França vive momento de mudanças. Há quatro anos, a assistência pública transformou 42 hospitais em 12 grupos hospitalares e essa fusão preocupa a maioria dos médicos do país. O conflito nos hospitais de assistência pública de Paris fica evidente com o fechamento da emergência do tradicional Hotel-Dieu. A polêmica irrompeu com o anúncio feito pela ministra da Saúde do atual governo socialista Marisol Touraine, de adiar para maio de 2014 o encerramento do serviço de urgência, inicialmente prevista para este novembro.
O Ministério da Saúde francês argumenta que não se trata de uma “doutrina financeira” na união das emergências, mas é uma medida necessária “para evitar concorrência entre as equipes profissionais”, racionalizando o atendimento.
De acordo com a Comissão Médica da APHP (Assistência Pública dos Hospitais de Paris), a decisão do Ministério da Saúde em adiar o fechamento da unidade é um esforço para passar as eleições municipais e evitar maiores danos eleitorais.
“O que vai acontecer entre novembro e maio na sala de emergência do Hotel-Dieu? Este serviço é destinado a acomodar os pacientes que necessitam de internação hospitalar, em alguns casos com tratamento imediato. No entanto, já não há praticamente mais hospital, cuidados intensivos e ortopedia. Esta decisão é perigosa em termos de saúde pública. Os pacientes em estado grave serão encaminhados para uma instituição fantasma, em que não haverá mais do que um Departamento de Medicina Interna”, relatou a entidade para o jornal Le Figaro.
O caso do Hôtel-Dieu resume a situação da assistência pública nos hospitais de Paris. Com serviços sendo fechados, o atendimento nos demais fica saturado. A cidade possui 2,2 milhões de habitantes e 12 serviços de emergência, incluindo quatro centros de trauma. O projeto do governo é fazer quatro grandes centros em Paris, que seriam Lariboisière, Mercy, St. Anthony e Pompidou.
Em março, já havia sido anunciado o fechamento da emergência em Wattrelos (norte de Paris) durante a noite e nos finais de semana, e previsão do fim total das atividades em 2014. Em julho, o presidente François Hollande, eleito pelo Partido Socialista, anunciou que os hospitais de Bichat, no norte de Paris, e Beaujon, em Clichy, seriam fechados e reabertos em um único local.
“É necessário criar um novo hospital no norte da Grande Paris. A Assistência Pública deve iniciar imediatamente os trabalhos visando o novo hospital e um ambiente universitário”, disse François Hollande, na ocasião.
Em 2012, no entanto, a Inspecção-Geral de Assuntos Sociais apresentou um relatório altamente crítico sobre a fusão de hospitais e serviços de emergência. O documento diz que, nos últimos 15 anos, 9% das unidades de saúde pública se fundiram. No entanto, a ligação entre o tamanho do hospital e a qualidade do atendimento é relativa. Em termos financeiros, a fusão não é a ferramenta mais apropriada para reduzir déficits hospitalares, que exigem, especialmente para as instituições em questão, um esforço de reorganização interna. Por causa das dificuldades e dos riscos, o estudo ressalta que a fusão não ser a norma rotineira mas a exceção.
Investigações confirmam que, ao longo dos últimos 20 anos, as emergências parisienses enfrentam indiscutível sobrecarga. Pesquisa recente mostra que 43% dos pacientes optam por ir a uma emergência, especialmente à noite e nos fins de semana, porque não encontram médicos de plantão nos serviços mais próximos de suas residências.
Em hospitais onde as emergências estão constantemente lotadas, uma alternativa seria criar centros de consultas médicas 24 horas nas proximidades, o que aliviaria o fluxo de pacientes e as emergências poderiam se concentrar nos casos efetivamente mais graves e que demandam maior concentração tecnológica e de recursos humanos.