Gestão e Qualidade | 7 de junho de 2020

Como os Serviços de Saúde podem se reconectar aos seus pacientes

Mohamed Parrini, Evandro Tinoco, Francisco Balestrin e Henrique Salvador debateram o tema em Webinar
Como os Serviços de Saúde podem se reconectar aos pacientes pós pandemia

O Colégio Brasileiro de Executivos em Saúde (CBEXs) promoveu a webinar Reconectando os Pacientes aos Serviços de Saúde, para debater estratégias que reconduzam os pacientes à nova realidade dos hospitais ocasionada pela pandemia da Covid-19. O evento, que teve mediação do presidente do Conselho de Administração do CBEXs, Francisco Balestrin, contou com a presença do presidente do Capítulo Rio de Janeiro do CBEXs, Evandro Tinoco, do presidente da Rede Mater Dei de Saúde, Henrique Salvador, e do CEO do Hospital Moinhos de Vento, Mohamed Parrini.

Dentre os assuntos discutidos ressaltam-se as oportunidades que surgem com a pandemia, a diminuição de atendimentos e o impacto nos hospitais, telemedicina, comunicação, papel da operadoras e o grave impacto nos caixas dos hospitais e as possíveis consequências para a sustentabilidade das instituições a médio e longo prazo. Confira o que foi abordado por cada um dos participantes.

EVANDRO TINOCO

“Não deixar ninguém para trás” 

A estratégia que um hospital deve adotar é a de “não deixar ninguém para trás”, ao se referir aos pacientes não Covid que passaram a ter receio de frequentarem o ambiente hospitalar em virtude de algum risco de contaminação. Desde o início da pandemia, os hospitais, mundialmente, tiveram uma queda geral acentuada de atendimentos para doenças cardíacas, diabetes e câncer, entre outras. Esta realidade exige, segundo Tinoco, uma maior integração dentro e fora do setor da saúde.

Oportunidade para a telemedicina 

Tinoco ressaltou que a telemedicina ganhou ainda mais importância no momento atual, por ser uma ferramenta que garante atendimento rápido e seguro. Porém, lamentou que não foi utilizada com maior ênfase no momento atual. “A grande ferramenta que poderíamos usar e deixamos de usar, por não estarmos preparados, é a telemedicina. A telemedicina era e é a oportunidade de uma reconexão rápida e com menor risco para os pacientes”, destacou.

Evandro Tinoco (foto Conexs/Cbexs)

Evandro Tinoco (foto Conexs/Cbexs)

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Adaptação dos hospitais baseadas em 4 pilares 

Para Tinoco, os hospitais precisarão se balizar em quatro pilares para se adaptarem aos novos tempos após a pandemia, com novas estratégias para reconectar com os pacientes: a consolidação de um “novo normal” no modelo assistencial; reestruturação econômica; o surgimento de um “novo paciente”, já inserido em uma nova realidade de teleconsultas; e um novo profissionalismo na saúde, com ênfase na tomada de decisão dos gestores pautada pela eficiência.

“Temos um paciente novo, que começa a enxergar os benefícios das teleconsultas, da telemedicina. Nada substitui a telemedicina responsável, com médicos, hospitais, clínicas e médicos de família responsáveis. Ou seja, todo o ecossistema da saúde passa a ter como papel a gestão de risco”, destacou.

“Profissionais de saúde que não se adequem ao contexto da gestão de risco e sistemas de acreditação serão substituídos pelos que focarem na gestão de risco, nos cuidados centrados no paciente e no cuidado com os profissionais”, completou Tinoco.

CBEXs: 5 domínios de segurança 

Tinoco explica que o CBEXs aponta cinco domínios (de segurança) para o retorno da confiança entre profissionais e pacientes e família: segurança física (estabelecer fluxos e controle); segurança assistencial (mudança de protocolos), segurança legal (documentos que possam embasar os procedimentos de forma segura e transparente), segurança informacional (“nós convocamos em cada evento do CBEXs um jornalista para entender o seu papel, de levar informação correta para a reaproximação e ajudar o ecossistema a voltar a fazer o seu papel fundamental: garantir acesso aos pacientes);  e segurança psicológica.henri

HENRIQUE SALVADOR

Oportunidades de novas conexões 

Para o presidente da Rede Mater Dei, de Minas Gerais, com a pandemia, os hospitais passaram a ter uma maior evidência da sua importância dentro da sociedade, o que sinaliza a força que o setor possui para a garantia da saúde e como alicerce para a economia.

“Essa crise trouxe a necessidade de um modo diferente de gerir as organizações e estar mais próximo das pessoas. O Evandro Tinoco abordou a telemedicina, nós lançamos a nossa plataforma de telemedicina de forma mais generalista, mas a conectividade com o paciente de forma remota passa a ser uma realidade cada vez maior. Essa é uma transformação que já vinha ocorrendo, e hoje temos procurado novas maneiras de estar perto das pessoas e apoiar os indivíduos em questões relacionadas à saúde”, disse.

De acordo com Salvador, a nova realidade imposta, se por um lado deixou os pacientes receosos de frequentarem o ambiente hospitalar, por outro garantiu, por uma série de possibilidades de aproximação e conectividade com o paciente. “Essa conectividade passa a ser uma realidade cada vez maior”, diz. Para ele, a crise do coronavírus gerou uma série de oportunidades para a saúde, sendo uma dessas a de novas formas de gerir os hospitais, tendo como foco maior proximidade dos pacientes.

Salvador, detalhou mais sobre as oportunidades. “Foi acelerada uma série de medidas para conectar o paciente que vinham engatinhando. O monitoramento remoto de diabéticos, hipertensos, nefropatas, com as linhas de cuidado com os respectivos dispositivos para monitorar esses pacientes. Na Rede Mater Dei, fomos para dentro das empresas: em algumas, montando ambulatórios de saúde corporativa, para integrar assistência à medicina do trabalho, duas questões que muitas vezes andam separadas. Por exemplo, nós temos ambulatório dentro da Localiza ( empresa de aluguel de veículos) para apoiar a saúde do trabalhador nesse momento de crise. Também montamos uma UTI, também conectando o paciente no Pará, num Hospital da Vale do Rio Doce. Trago esses exemplos para dizer que há muitas oportunidades”, salientou.

Retardamento de atendimento e interrupção de tratamentos

Um dos pontos abordados pelo presidente do Mater Dei é a consequência, a longo prazo, do retardamento ou da não procura de atendimentos importantes relacionados a doenças crônicas. “Haverá um risco dos pacientes que deixaram de ir aos hospitais de terem quadros agravados”, ressalta, complementando o custo mais elevado diretamente relacionado à condição de saúde: pacientes mais graves demandam um maior número de intervenções e cuidados.

Henrique Salvador (arquivo)

Henrique Salvador (arquivo)

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Para o enfrentamento da pandemia, Salvador aponta que foi instituído no Mater Dei um Comitê de Crise (curto prazo e diretamente ligado ao coronavírus), mas salientou que a gestão se manteve atenta ao Comitê de Inovação (médio e longo prazo), citando como exemplo a vertical de saúde lançada pela Mater Dei em parceria com a aceleradora de conexões Órbi Conecta. “É importante, neste momento, não perdermos  de vista esses comitês com projetos de médio e longo prazo, porque são eles que dizem respeito à nossa sustentabilidade”, destaca.

Novos fluxos

 O presidente do Mater Dei ressaltou que foram instituídos fluxos diferenciados no ambiente hospitalar, separando em alas os pacientes com Covid-19 de pacientes não Covid. “Arrisco dizer que ir num hospital pode ser mais seguro do que ir em muitas lojas”, disse, salientando a importância das instituições garantirem segurança aos seus pacientes.

Importância da comunicação

A comunicação é um eixo fundamental de reconexão, na visão de Salvador. “A comunicação adequada aos diversos públicos que temos é fundamental. O público interno, com o corpo clínico, o público externo, as operadoras de planos de saúde. Comunicar o que tem sido feito nas nossas organizações e a segurança que existe hoje para que essa reconexão ocorra de maneira segura e adequada. Tem que ser investido nisso, temos inúmeras ferramentas que permitem isso, seja pelas mídias sociais ou em comunicação direta. Hoje, estamos longe das pessoas, mas não podemos estar distantes das pessoas. Nós, como líderes, precisamos estar próximos, disponíveis e acolher as pessoas”, enfatizou.

Integração entre os setores público e privado

 O presidente do grupo Mater Dei ressaltou a importância da integração entre os sistemas público e privado, observado no momento em que o sistema de saúde ficou sobrecarregado. “Importante ressaltar a integração no momento do SUS com iniciativas privadas, a partir da ativação de leitos em hospitais, implementação de hospitais de campanha. Nós, por exemplo, fornecemos andares do Mater Dei Betim-Contagem, que não estavam operando, em uma iniciativa muito interessante: um grupo de empresários de Minas Gerais, com a Federação das Indústrias do Estado, se responsabilizaram por equipar os leitos. Ao final da pandemia, os leitos serão doados para o Estado”, detalhou.

MOHAMED PARRINI

Novos protocolos e impacto financeiro

O CEO do Hospital Moinhos de Vento, de Porto Alegre, destacou que, inicialmente (março), a primeira preocupação da instituição foi com a proteção dos funcionários e pacientes.

Entre as medidas tomadas, o Moinhos decidiu fechar o hospital para procedimentos eletivos, além da busca de novos EPIs e reforço dos protocolos de segurança.O impacto econômico da economia foi “devastador” nos últimos dois meses, de acordo com Parrini. A ocupação pré-pandemia, que era de 90%, está em aproximadamente 70% (cirurgias está em 40%). Dos 485 leitos, atualmente há 21 pacientes confirmados e seis suspeitos com coronavírus.

Segurança do ambiente hospitalar

“Assim como o Dr Henrique, também quero deixar uma mensagem: os hospitais são ambientes seguros e preparados, essa é minha mensagem principal”, enfatizou.

Mohamed Parrini (arquivo)

Mohamed Parrini (divulgação)

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Reconexões e novo modelo de hospital

 Na visão de Mohamed, a reconexão dos pacientes aos hospitais se dará primeiramente pelos pacientes com planos de saúde, que “darão mais valor a essa retomada” aos atendimentos.

Mohamed aponta que um novo modelo de hospital precisará ser avaliado, junto a aspectos ligados à economia, como a diminuição do número de beneficiários, mas um aumento de procura por planos mais completos, por aqueles que podem pagar. A pandemia, demonstrou que é importante ter uma cobertura mais ampla.

Nova realidade dos hospitais

Em relação ao Hospital Moinhos, Parrini afirmou que a instituição está constantemente avaliando os possíveis cenários futuros. “A minha percepção é que não voltaremos [ao observado anteriormente]. Se era um hospital com 90% de ocupação, creio que ficará em torno de 78% daqui para a frente, o que trará um impacto econômico”, avalia. Segundo o executivo, uma nova realidade deverá ser adotada pelo Hospital, em termos de adequações alinhadas ao que o mercado impõe, algo que se repetirá em praticamente todos os hospitais brasileiros.

SUS e investimento em saneamento básico

Parrini enfatizou a importância do Sistema Único de Saúde (SUS) no momento da crise, além de ressaltar a necessidade de investimento muito maior em saneamento básico no Brasil.

FRANCISCO BALESTRIN

O mediador do debate avaliou que, no Brasil, em diferentes cidades houve uma série de ações disruptivas dos stakeholders. Porém, faltou em muitos lugares uma maior sintonia das autoridades públicas, sanitárias, que acabaram gerando erros de diagnóstico no enfrentamento do coronavírus.

O presidente do CBEXs citou Rio Grande do Sul e Minas Gerais como estados que demonstraram sintonia na articulação entre os líderes políticos, em contraponto “à grande desarticulação observada no Rio de Janeiro”, disse.

Balestrin também abordou a definição de órgãos, como da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), para que os hospitais atendessem, no início da pandemia, apenas atendimentos tempo-sensíveis, sem realizar atendimentos eletivos.

Francisco Balestrin (arquivo)

Francisco Balestrin (arquivo)

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Perguntas e debate final

Após as observações dos convidados, o presidente do Conselho de Administração do CBEXs  Francisco Balestrin, trouxe questões enviadas pelos espectadores da live aos três participantes.

Para Tinoco, a pergunta foi se as atividades no setor de saúde devem ser estratificadas para um retorno gradual.

Tinoco: “A resposta é sim. Ao retornar [com os procedimentos], aquilo que fazíamos com proficiência, temos maior índice de mortalidade. As razões, não sabemos. Portanto, agir de forma incremental, avaliar os riscos, analisar o impacto de reinfecções intra hospitalares, isso me parece fazer sentido. Creio que devemos agir dessa maneira, embora muitos casos graves necessitam ser tratados rapidamente”, respondeu.

Para Salvador e Parrini, Balestrin perguntou: qual o papel das operadoras de planos de saúde nesse momento de reconexão? Elas estão sendo proativas?

Mohamed: “Muitas delas estão sendo solidárias, ligando para os hospitais. Estamos em uma situação relativamente confortável. O que eu me preocupo nesse momento é que, com mais de 6 mil hospitais no Brasil, muitos [dos maiores] estão em melhor situação, mas os hospitais menores? Como estão? [Nesse período] A margem de lucro de diversas operadoras dispararam, a sinistralidade despencou. Muitos acreditam que na sequência isso vai vir e voltar na mesma proporção. A demanda voltará, mas o dinheiro que não foi gasto lá atrás não irá voltar. Me questiono se não é o momento para perguntar: existem profissionais de saúde sem as instituições? Quantos profissionais de saúde ficarão sob risco, se de 5 a 20% dessas instituições não sobreviverem nos próximos meses? Minha preocupação é com a sobrevivência, e esse é o papel da Anahp, dos sindicatos, da ANS, do Ministério da Saúde, das Federações, de abordar qual será o futuro das instituições mais frágeis e como preservar os profissionais de saúde. E aí sim, as operadoras de planos de saúde têm um papel numa discussão mais profunda, de discussão sobre a sustentabilidade desses hospitais”, disse.

Salvador: “Algumas das operadoras se disponibilizaram a antecipar recursos para garantir fluxo de caixas para alguns hospitais. Não acho que tenha interesse das operadoras de que tenhamos a falência do sistema prestador de serviços de saúde, exatamente porque são os prestadores que garantem o acesso [rede de assistência]. Eu, enquanto gestor, tenho receio com essa antecipação de receitas, porque um dia essa conta irá chegar. Eu acho que uma outra maneira que as operadoras podem ajudar é entender que esse é o momento da retomada gradativa e não criar dificuldade para evitar liberação de procedimentos, para dificultar que o fluxo normal de processos envolvidos na produção hospitalar seja prejudicado. Isso vale para o grande, médio e pequeno. Temos percebido, nesse aspecto, a sensibilidade das operadoras que são parceiras de anos em não criar essa dificuldade. Se as operadoras forem parceiras nessa recuperação de produção dos hospitais, já estarão fazendo um grande benefício para nossas instituições”, respondeu.


Próximo encontro: A baixa demanda na Saúde Suplementar será uma bomba relógio?

Na próxima quarta-feira, dia 10, autoridades da Saúde estarão ao vivo no WEBINAR CBEXs Nacional para discutir a baixa demanda na Saúde Suplementar. Adriano Londres, CEO Arquitetos da Saúde, Rodrigo Lopes, CEO Hospital Leforte e Rogerio Scarabel, Diretor Presidente Substituto na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) são os convidados especiais. O evento ocorre inicia ás 17h30.  Para se inscrever, acesse aqui. 

A baixa demanda na Saúde Suplementar será uma bomba relógio


 

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