Estatísticas e Análises | 3 de abril de 2018

Cientistas descobrem “novo órgão” do corpo humano

"Interstício" é uma estrutura até então desconhecida da anatomia humana e pode mudar o entendimento do funcionamento dos órgãos, tecidos e doenças
Cientistas descobrem novo órgão do corpo humano

Cientistas identificaram um “novo órgão” humano até então escondido à vista de todos, em uma descoberta que os especialistas esperam poder ajudar a entender a propagação do câncer dentro do corpo. Trata-se de um espaço repleto de cavidades preenchidas por líquido, presente entre os tecidos do nosso corpo – por isso, chamado de interstício (entre tecidos).

Os resultados, publicados na revista Scientific Reports, são o resultado de um estudo realizado por especialistas da Universidade de Nova York (NYU) e do Centro Médico Mount Sinai Beth Israel, (localizado na metrópole norte-americana).

Apesar de ter sido descoberto somente agora, pode se tratar de um dos maiores órgãos do corpo humano. Esses compartimentos são encontrados sob a pele, além de revestirem o intestino, os pulmões, os vasos sanguíneos e os músculos, e se juntam para formar uma rede suportada por uma malha de proteínas densas e flexíveis. A equipe responsável pelo estudo sugere que os compartimentos podem atuar como “amortecedores” que protegem os tecidos do corpo contra danos.

O Dr. David Carr-Locke e o Dr. Petros Benias, médicos do Centro Médico Mount Sinai Beth Israel, se depararam com o interstício enquanto investigavam o ducto biliar de um paciente, em busca de sinais de câncer.

Eles notaram cavidades que não combinavam com nenhuma anatomia humana previamente conhecida. Então, relataram a descoberta ao patologista Neil Theise, da Universidade de Nova York. Os pesquisadores perceberam que os métodos tradicionais para examinar os tecidos do corpo tinham perdido a identificação do interstício, porque o método de “fixação” para a montagem de lâminas de microscópio médico envolve a drenagem de fluido – destruindo, portanto, a estrutura do órgão.

Em vez de sua verdadeira identidade como absorvedores de choque em todo o corpo, cheios de fluido, as células esmagadas foram negligenciadas e consideradas uma simples camada de tecido conjuntivo. Tendo chegado a essa conclusão, os cientistas perceberam que essa estrutura foi encontrada não apenas no ducto biliar, mas em torno de muitos órgãos internos cruciais.

Depois de fazer vários testes, Neil Theise, coautor do estudo, se deu conta de que o processo convencional de fixação de amostras de tecidos em placas drenava o fluído presente na estrutura. Normalmente, os cientistas tratam as amostras com produtos químicos, as cortam em uma camada muito fina e aplicam tinta para realçar suas características chave. Porém, esse procedimento faz colapsar a rede de compartimentos, antes cheios de líquidos. É como se os pisos de um edifício desmoronassem.

Por isso, “durante décadas, (a estrutura) pareceu como algo sólido nas placas de biópsia”, disse Theise, que faz parte do departamento de patologia da Universidade de Nova York.

Ao mudar a técnica de fazer a biópsia, sua equipe conseguiu preservar a anatomia da estrutura, “demonstrando que ela forma parte da submucosa e que é um espaço intersticial cheio de fluído não observado anteriormente”. Assim, foram identificadas “tiras largas e escuras ramificadas, rodeadas de espaços grandes e poligonais cheios de fluoresceína”, descreve o estudo.

“Esse artefato de fixação do colapso fez com que um tipo de tecido cheio de fluido em todo o corpo parecesse sólido em lâminas de biópsia por décadas, e nossos resultados corrigem isso para expandir a anatomia da maioria dos tecidos”, disse o Dr. Theise.

Função

Até agora a ciência não estudou profundamente o fluxo nem o volume do fluído intersticial do corpo humano. Por enquanto, a identificação desse “espaço intersticial” levanta várias hipóteses.

Os especialistas acreditam que essa rede de espaços interconectados, forte e elástica, pode atuar como um amortecedor para evitar que os tecidos do corpo se rasguem com o funcionamento diário – que faz com que os órgãos, músculos e vasos sanguíneos se contraiam e se expandam constantemente.

Além de sua capacidade de amortecer os órgãos do corpo e protegê-los de danos, os pesquisadores encontraram evidências de que as células cancerígenas dos tumores poderiam atravessar o interstício no sistema linfático. Ao fornecer uma estrada para que o fluido se mova pelo corpo, as células interconectadas do interstício podem, portanto, ter o efeito colateral de espalhar o câncer pelo corpo.

Novos testes para o câncer 

Compreender essa fronteira recém-descoberta na anatomia humana poderia permitir aos cientistas desenvolver novos testes para o câncer. “Esta descoberta tem potencial para impulsionar avanços significativos na medicina, incluindo a possibilidade de que a amostragem direta do fluido intersticial possa se tornar uma poderosa ferramenta de diagnóstico”, disse o Dr. Theise.

 

* Com informações dos jornais britânicos Independent e BBC. Edição do Setor Saúde.

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