Características clínicas e sociais da população influenciam nas taxas de reinternação hospitalar
Harvard questiona método que vem penalizando instituições nos EUAEsforços nos EUA para impulsionar a melhoria na qualidade dos serviços têm penalizado inadvertidamente hospitais que atendem populações mais vulneráveis. Características clínicas e sociais da população de pacientes de um hospital podem explicar cerca de 50% da diferença nas taxas de reinternação, em comparação entre o melhor e o pior desempenho dos hospitais nos EUA, revela um novo relatório divulgado pelo periódico JAMA Internal Medicine.
Para incentivar os hospitais a melhorarem a qualidade do atendimento, o sistema de saúde gerido pelos EUA, Medicare (programa para americanos com 65 anos de idade ou mais), vem penalizando instituições com maior taxa de readmissão, dentro do período que engloba os 30 dias após a alta. A lógica por trás da medida é que, se os pacientes recebem cuidados de elevada qualidade – que inclui todo o planejamento de desempenho -, teoricamente estão menos propensos a retornar ao hospital. Porém, verifica-se que as características sociais e clínicas da população de pacientes atendidos em um hospital não estão incluídas no cálculo do Medicare. Isso pode explicar quase a metade da diferença nas taxas de readmissão.
Usando a fórmula padrão do Medicare – que foca apenas a idade do paciente, o sexo e determinados diagnósticos -, os hospitais com melhor desempenho tiveram 4,4% menos readmissões do que os hospitais de pior desempenho. Pesquisadores do Departamento de Políticas de Saúde da Harvard Medical School descobriram que acrescentar um conjunto mais abrangente de características do paciente (incluindo variáveis clínicas, como cognição, estado funcional), bem como aspectos sociodemográficos, como etnia, renda e níveis de escolaridade, podem reduzir a diferença quase pela metade, para 2,3%.
Em 2014, o Medicare cobrou multas que totalizaram US$ 428 milhões, sobre 2,6 mil hospitais com as mais elevadas taxas de reinternação. As taxas se concentraram entre os hospitais que atendem comunidades carentes. Os pesquisadores analisaram se isso ocorre porque as instituições fazem um trabalho de inferior qualidade ou porque as pessoas que usam o hospital têm um maior risco, devido à sua situação socioeconômica e clínica.
J. Michael McWilliams, professor associado de políticas em saúde e medicina da Harvard Medical School e principal autor do estudo, diz que “o programa de redução de reinternação foi concebida para penalizar hospitais pela má qualidade dos cuidados, mas nossos resultados sugerem que os hospitais são penalizados, em grande parte, com base nos pacientes que atendemos”.
Os pesquisadores avaliaram 29 características não incluídas na avaliação do Medicare, considerados pontos potenciais de readmissão após 30 dias. Eles descobriram que a distribuição de muitas dessas características diferem substancialmente entre hospitais com taxas de readmissão mais altas e baixas. Após um ajuste para um perfil mais abrangente, foram comparadas as diferenças nas taxas entre estes hospitais. “A conclusão sugere que nos hospitais que atendem os mais doentes, os pacientes mais vulneráveis estão sendo privados de recursos que poderiam ser usados para cuidar melhor das comunidades”, considerou outro autor do estudo, Michael Barnett, pesquisador de medicina no Harvard Medical School.
A análise mostra que há uma série de potenciais soluções que poderiam reduzir as reinternações e melhorar a qualidade do atendimento sem agravar as disparidades entre instituições, evitando penalizar hospitais que tratam pacientes mais doentes.
Ajustar o item “risco do paciente” poderia ser mais abrangente. Como as informações detalhadas sobre os pacientes são difíceis de serem obtidas, programas de redução de internações podem precisar de uma nova estrutura, para minimizar essas consequências não intencionais. Como alternativa, modelos de pagamento que colocam todo o setor dos cuidados em saúde no âmbito de um orçamento global, poderiam permitir que prestadores de serviços tenham maior poder de decisão na identificação e redução de eventos evitáveis, como as reinternações.
“Reinternações hospitalares são complexas e podem resultar de uma série de fatores, como literatura médica precária ou a falta de acesso a transporte”, constata Barnett. “Portanto, é crucial ter uma visão abrangente do contexto social e clínico dos pacientes na avaliação da qualidade do hospital”.