Estatísticas e Análises | 26 de setembro de 2016

Um médico deve ir ao funeral de seu paciente?

Pesquisa australiana analisa a questão, um tabu entre profissionais de saúde
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Uma nova pesquisa da Universidade de Adelaide (Austrália) abordou um tema delicado: os médicos que vão aos funerais de seus pacientes e as razões por trás dessa escolha.

Os pesquisadores defendem que o setor e os profissionais precisam discutir o assunto abertamente. No estudo publicado pelo periódico Death Studies, os pesquisadores da Escola de Psicologia e da Escola de Medicina da Universidade de Adelaide reportaram práticas e atitudes em relação ao “atendimento funeral” em um levantamento com mais de 430 médicos australianos. A publicação faz parte de uma pesquisa nacional com mais de 1.000 profissionais de saúde.

“Nossa pesquisa teve como objetivo compreender melhor o que motiva os profissionais de saúde a irem a funerais dos seus pacientes, quais obstáculos que eles podem se deparar, e suas atitudes em relação a questão” , diz a Dra. Sofia Zambrano, autora da pesquisa.

A pesquisa constatou que 57% dos médicos entrevistados tinham frequentado pelo menos um funeral de paciente – mas o número variava muito, dependendo da especialidade médica do entrevistado. Por exemplo: 71% dos clínicos gerais compareceram ao funeral de um paciente; 67% dos oncologistas; 67% dos psiquiatras; 63% dos especialistas em medicina paliativa; 52% dos cirurgiões e 22% dos especialistas em cuidados intensivos.

Greg Crawford, co-autor do estudo e professor de Medicina Paliativa na Escola de Medicina da Universidade de Adelaide, ressaltou que “a morte de um paciente pode ser uma experiência muito emocional e desoladora para os médicos, e alguns podem associar ao fracasso de seu atendimento profissional”.

Segundo ele, os benefícios da visita ao funeral podem ser duplos: “O comparecimento ao funeral parece ser uma prática que pode ajudar os médicos a lidar com suas emoções após a morte de um paciente, e por outro lado, também pode ser um conforto para a família do paciente”. Ainda de acordo com Greg Crawford, “há opiniões divergentes dentro da medicina sobre se é ou não aceitável ir ao funeral de um paciente, com alguns médicos vendo isso como algo não-profissional, e outros sentem que os seus colegas desaprovariam essa participação, que na verdade foram os fatores associados ao não comparecimento a funerais em nosso estudo”.

O estudo também descobriu que as médicas eram mais propensas a comparecerem ao funeral de um paciente do que os homens. Também eram mais abertas a chorar e expressar dor e tristeza no funeral, e elas discutiram ativamente com colegas e familiares, sobre ir aos funerais dos pacientes. Os menos propensos a participarem de enterros eram jovens médicos do sexo masculino, com menos anos de experiência na profissão.

Dra. Zambrano diz que, por se tratar de uma decisão pessoal, os autores do estudo abstiveram-se de defender a participação ou não em funerais. “O nosso objetivo é contribuir para uma discussão mais aberta sobre este tema pouco pesquisado, e obter uma imagem mais clara sobre as atuais práticas e atitudes de uma grande amostra de médicos e outros profissionais de saúde”, explicou ela.

“A percepção dos outros médicos e a hesitação para discutir sobre a ida ao funeral e sobre a morte de forma mais ampla com os colegas, são questões importantes a considerar. A comunidade médica deve se perguntar se o ‘atendimento funeral’ é necessário, e se pode ser abordado de forma mais aberta – seja a morte ou o fim da vida – entre os profissionais de saúde, bem como os efeitos que essas discussões podem ter sobre a satisfação no trabalho e na saúde mental dos médicos”, conclui a pesquisadora.

Acesse o estudo Attending Patient Funerals: Practices and Attitudes of Australian Medical Practitioners aqui (em inglês).

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