Antonio Quinto nnnn, Qualidade Assistencial | 10 de setembro de 2015

Fator de Qualidade nas Organizações de Saúde e Remuneração pelas Fontes Pagadoras

Fator de Qualidade nas Organizações de Saúde e Remuneração pelas Fontes Pagadoras

As operadoras de saúde preparam-se para atrelar o pagamento dos serviços prestados pelas organizações de saúde, em particular hospitais, clínicas especializadas e laboratórios, com alguma forma de qualificação externa da qualidade. São os passos iniciais para a implantação de um sistema de remuneração denominado “pagamento por desempenho”. A base referencial prevista no momento é a seguinte: a) organizações que possuírem certificação da qualidade receberão reajuste integral (100% do INPC); b) organizações em fase de preparação receberão reajuste de 80%; c) organizações sem certificação ganharão 80% do reajuste.

Quais as implicações embutidas nesse tipo de medida? Primeiro, ao se utilizar o condicionamento negativo (quem não tiver a certificação receberá menos), os gestores são direcionados para interpretarem a melhoria da qualidade e segurança como uma cobrança adicional a ser atendida, e não uma recompensa. Isso é ruim. Leva-os a buscarem a certificação externa imbuídos do prejudicial sentimento de raiva, e não com a disposição positiva de qualificar-se, aumentando a autoestima e alimentando o ciclo virtuoso da melhoria contínua. Segundo, a iniciativa subtrai – injustamente – das organizações de saúde um componente econômico já estabelecido e previsto como reajuste. O consequente descumprimento agravará a situação econômico-financeira, o que resulta em um contrassenso, visto que cumprir padrões e requisitos de qualidade pressupõe tempo e recursos específicos. Terceiro, o número de organizações de saúde certificadas no país não alcança 5% do total. Levando e consideração esse aspecto, a medida adquire caráter oportunista ao invés de um verdadeiro ato de interesse na ascensão da qualidade dos serviços de saúde.

As organizações de saúde, pelo elevado grande de complexidade que envolve múltiplas atividades, interesses e clientes, são ambientes que tendem ao caos. Provavelmente, mais do que em outras áreas, precisam de gestores que: a) dominem e apliquem os fundamentos da gestão da qualidade com sensibilidade e persistência; b) cultivem a humildade de reconhecer que precisam trabalhar intensivamente para melhorar o estágio atual de desenvolvimento de suas organizações; c) entendam que os problemas enfrentados, embora acompanhados de limitações econômico-financeiras, tornam-se mais graves pela invasiva deficiência de gestão.

Na atualidade não se discute se a filosofia e princípios da qualidade adaptam-se aos serviços de saúde. A questão agora é quando começar a aplicar esses conhecimentos, tendo em conta a necessidade de maximizar recursos e aumentar o potencial dos serviços.

Quando se analisa os diversos fatores contribuintes para a qualidade e segurança dos serviços de saúde, o elemento mais crucial encontra-se nas pessoas. São elas as criadoras, participantes e usuárias finais desses componentes. Carregam o compromisso de alcançar as metas institucionais estabelecidas pela alta direção. São muitas pessoas com talentos variados reunidas para uma missão comum, atuando tanto na área assistencial quanto administrativa e de apoio. É, portanto, imprescindível instituir métodos de comunicação que incentivem o trabalho cooperativo, assim como a execução de processos bem definidos monitorados por indicadores que permitam o acompanhamento sistemático das atividades principais e constituam a base fundamental para um julgamento objetivo e consistente.

Quem trabalha em organizações de saúde vivencia diariamente que grande parte das atividades é variável, flexível. Surpreendentemente, a despeito das incertezas, ambiguidades e conflitos de metas, a maioria das coisas realizadas dá certo. Constitui-se em um dos fatos mais impressionantes observados nas organizações de saúde, o que manifesta o poder de resiliência desses sistemas. Adicionalmente, quando as estruturas se encontram adaptadas ao trabalho e os processos executados são explícitos e compreensíveis, identifica-se com mais facilidade e rapidez o desempenho extraordinário de colaboradores “normais” (e bem treinados). Isso se nota amplamente em organizações que aplicam os padrões e requisitos da qualidade e segurança, como as organizações acreditadas.

As operadoras de saúde, ao vincularem o fator de qualidade ao reajuste anual dos serviços prestados pelas organizações de saúde, criam um dispensável clima de pavor e desgaste, porquanto deduzem um pagamento previsto com base em um índice que repõe a inflação do período. Tendo em conta a realidade nacional, a atitude sensata seria recompensar as organizações que adquiriram uma qualificação externa ou que se encontram em fase de preparação. Mais meritória ainda seria estabelecer alguma forma de incentivo para organizações interessadas em alcançar a condição de acreditadas por uma agência acreditadora.

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