Gestão | 14 de maio de 2025

Beneficiários: o Lícito e o Proibido na Cobrança de Atendimento Através de Planos de Saúde

Beneficiários o Lícito e o Proibido na Cobrança de Atendimento Através de Planos de Saúde-1

As pessoas que buscam um plano de saúde precisam ser esclarecidas sobre os seus direitos e deveres. A tendência natural é suporem que ao necessitarem de um serviço, tudo esteja garantido sem valor adicional. Isso depende do tipo de plano contratado, mas de um modo geral sempre haverá alguma limitação de serviços, a necessidade de desembolso extra e até o pagamento de algo que não é coberto ou não previsto. Nestes casos a cobrança pode ser legítima, uma vez que nenhum plano tem a capacidade de garantir tudo que a assistência à saúde pode demandar.

Cobrança lícita

Os beneficiários devem estar orientados para entender que em algumas situações é permitido que o médico ou o estabelecimento de saúde realize cobrança diretamente do paciente. Essas situações incluem:

– Serviços não cobertos pelo plano de saúde: tudo que esteja fora do rol obrigatório da Agência Nacional de Saúde (ANS)[1], como por exemplo exames, tratamentos estéticos, tecnologias avançadas e tratamentos experimentais;


– Materiais opcionais ou de alta tecnologia (ex.: próteses premium): durante uma cirurgia, por exemplo, os beneficiários podem ser informados que existe a possibilidade de receber uma prótese mais avançada que não se encontra coberta pelo plano. Se, em substituição à prótese padrão, for oferecida a opção premium e o paciente aceitar, a cobrança é legítima;


– Atendimento particular oferecido como opção: o médico pode oferecer a opção de atendimento particular com o argumento, por exemplo, de que a consulta será mais particularizada. Se o paciente for informado com clareza e concordar com a proposta, considera-se lícito.

Cobrança indevida

A cobrança adicional por serviços incluídos no contrato de um plano de saúde é considerada ilegal. Ela pode assumir diversas formas, tanto em consultas quanto em materiais, medicamentos, procedimentos diagnósticos e terapêuticos.

– Consultas médicas: se a consulta é prevista no plano, o médico não pode realizar cobranças além da coparticipação (se houver). Quando há coparticipação e o pagamento é feito diretamente pelo beneficiário, o médico pode entender que está livre para cobrar um valor adicional além do previsto pelo plano. Contudo, tanto a situação em que o médico se sente no direito de cobrar a primeira consulta como se fosse particular, quanto a cobrança extra, além do valor previsto como coparticipação, são atos ilegais;


– Materiais e medicamentos previstos no rol obrigatório: os estabelecimentos de saúde se encontram impedidos legalmente de efetuar cobrança adicional por materiais e medicamentos incluídos na cobertura contratual;


– Procedimentos diagnósticos e terapêuticos: exames, terapias e procedimentos cirúrgicos previstos no contrato de Operadoras de Planos de Saúde (OPS) não devem ser cobrados. A cobrança adicional é considerada ilícita.

A ilegalidade decorre da violação tanto do contrato do médico com a OPS quanto do Código de Defesa do Consumidor.

Cobrança por prioridade no atendimento

A cobrança para “furar fila” é uma prática irregular. Todos os pacientes devem ser atendidos conforme a ordem e as condições contratuais estabelecidas pelo plano. Quando o médico privilegia um paciente em detrimento de outros, fere princípios éticos, exceto em situação de urgência/emergência.

Cobrança de diferença de honorários

A prática da “complementação de honorários” ocorre quando o médico cobra um valor adicional ao que é pago pelo plano de saúde. Em 2010, no Distrito Federal, os médicos passaram a cobrar uma sobretaxa de até R$ 60,00 por consulta dos pacientes de planos de saúde[2]. Assumiram essa conduta amparados em uma resolução do Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal que alterou a forma de pagamento dos honorários médicos. Essa deliberação confrontou a lei que dispõe sobre planos e seguros privados de assistência à saúde[3], a qual proíbe expressamente complementar honorários para serviços cobertos pelos planos. Além disso, o médico, ao assinar o contrato com uma OPS, aceita os valores acordados e não pode transferir esse ônus ao paciente.

Cobrança por consulta de retorno

A consulta de retorno se refere à consulta anterior, não se enquadrando em atendimento à nova doença ou à evolução do quadro do paciente[4]. No caso de doenças de tratamento contínuo, as quais demandam reavaliações periódicas e modificações terapêuticas, não se enquadram no direito a retorno em consulta médica[5]. Assim, as consultas sucessivas serão cobradas, exceto se o médico, por conveniência e liberalidade, dispensar a cobrança.

A consulta de retorno, em geral, está incluída no valor da consulta inicial paga pelo plano, e não pode ser cobrada à parte, a menos que:

– A consulta seja realizada fora do prazo definido pelo plano ou pelo médico como retorno (geralmente 30 dias);


– Seja uma nova consulta por um problema diferente.

A cobrança indevida de retorno é considerada abuso contratual e pode ser denunciada à OPS e aos órgãos de fiscalização. Essa interpretação não faz sentido se o plano considera a consulta de “retorno” como qualquer consulta convencional,

Cobrança sem informar o paciente

Mesmo nos casos em que o serviço não esteja coberto pelo plano, a cobrança será imprópria se o paciente não for informado previamente e de maneira clara sobre os valores e a ausência de cobertura por parte do plano. Se o médico realizar um procedimento ou utilizar um material sem informar que o paciente precisará pagar de forma particular, configura-se uma conduta fraudulenta por duas razões: viola o Código de Ética Médica[6] o qual orienta que o paciente seja informado sobre custos antes da realização de qualquer procedimento, enquanto a ausência de clareza (falta de transparência) pode ser interpretada como má-fé e violação dos direitos do paciente.

Como evitar cobranças indevidas

– Conhecer o contrato do plano. Verificar quais serviços estão incluídos na cobertura;


– Consultar o rol da ANS. Se tiver dúvidas, é oportuno acessar o site da ANS para conferir se o procedimento ou exame é obrigatório;


– Pedir explicações por escrito. Antes de aceitar qualquer cobrança, sempre exigir um documento detalhado explicando o motivo e o custo;]


Caso seja decidido efetuar o pagamento requerido, solicitar nota fiscal ou recibo detalhando os valores pagos.

Cobrança ilegítima

Os beneficiários não devem pagar diretamente ao médico ou ao estabelecimento de saúde nos seguintes casos:

– Serviços cobertos pelo plano: se o procedimento, consulta ou exame está no rol obrigatório da ANS ou foi autorizado pelo plano de saúde, não deve haver cobrança extra;


– Materiais e medicamentos essenciais: os materiais e medicamentos necessários para a realização de procedimentos cobertos pelo plano não podem ser cobrados separadamente;


– Complementação de honorários: não é permitido cobrar uma diferença para “melhorar o atendimento” ou compensar valores pagos pelo plano.

 Orientações para os beneficiários de um plano de saúde

–  Buscar sempre uma segunda opinião: em caso de dúvida sobre cobrança, consultar outro médico ou entrar em contato com o plano;


– Documentar o atendimento: guardar comprovantes de pagamentos, autorizações e qualquer comunicação com o médico ou plano;


– Informar-se tanto quanto possível: saber o que o plano cobre é o melhor jeito de evitar surpresas ou cobranças irregulares.

Conclusão

Os beneficiários de planos de saúde precisam estar cientes sobre os serviços que são garantidos pelas OPS. Quando os médicos efetuam alguma cobrança, precisam se certificar do que se trata. Identificar se é dupla cobrança, complementação de honorários ou pagamento adicional de serviços não inclusos. Na primeira situação os beneficiários têm o direito de ser socorrido pelas OPS; nas duas outras condições tem-se acertos que podem ser estabelecidos entre o médico e o paciente. Entender o que pode ou não ser cobrado ajuda a evitar abusos e afiança que os beneficiários recebam o atendimento necessário. A orientação geral é: sempre buscar esclarecimentos junto às OPS, recusar cobranças que entendam serem injustas e denunciar práticas irregulares.


[1] Agência Nacional de Saúde Suplementar. O rol de procedimentos e eventos em saúde. https://www.gov.br/ans/pt-br/acesso-a-informacao/participacao-da-sociedade/atualizacao-do-rol-de-procedimentos.
[2] Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal. Resolução CRM/DF nº 317/2010.   https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/resolucoes/DF/2010/317.
[3] Lei nº 9.656, de 3 de junho de 1998.  https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1998/lei-9656-3-junho-1998-353439-publicacaooriginal-1-pl.html.
[4] Vydence Medical. Direito a retorno em consulta médica: pode cobrar ou não? https://www.vydence.com/direito-a-retorno-em-consulta-medica/.
[5] Ibidem.
[6] Resolução CFM n° 2.217, de 27 de setembro de 2018, modificada pelas Resoluções CFM nº 2.222/2018 e 2.226/2019. Código de Ética Médica, Conselho Federal de Medicina.  Ver Artigo 66. http://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://portal.cfm.org.br/images/PDF/cem2019.pdf.

 

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