Qualidade Assistencial | 9 de dezembro de 2013

Duas Prioridades Indissociáveis: Segurança do Paciente e Sustentabilidade Financeira

Duas Prioridades Indissociáveis- Segurança do Paciente e Sustentabilidade Financeira (Quinto Neto)

O mundo encontra-se estruturado a partir da dimensão financeira. Tudo gira em torno dela, para o bem e para o mal. Quando se assinala que as organizações de saúde, em especial os hospitais, devem orientar-se pela sustentabilidade financeira – como qualquer empresa – não raro considera-se um sacrilégio. Na cultura brasileira, em particular, há um elevado pudor em associar ganhos econômicos com o atendimento de saúde, como se isso fosse algo socialmente inaceitável, embora seja crescente o reconhecimento de que o aprimoramento dos cuidados de saúde, curativos e preventivos, depende de recursos financeiros cada vez maiores. O que se precisa, contudo, é evitar o comportamento exacerbado de maximizar a produtividade em prejuízo da qualificação dos serviços e segurança dos cuidados médicos-assistenciais.

A gestão do negócio (relacionada com os aspectos econômico-financeiros) e a gestão da assistência (relacionada com os cuidados de saúde) compõem a equação fundamental das organizações de saúde. A prestação dos cuidados de saúde, como qualquer empreendimento, implica em custos. Nessa área, entretanto, o fator emocional habitualmente turva a compreensão dos fatos. Por outro lado, o gerenciamento financeiro, essencial em organizações de qualquer gênero, exige a aplicação de sensibilidade humana para que não se desenvolvam situações estranhas, absurdas e cruéis para os clientes/pacientes e seus familiares, como a cobrança adicional não informada ou a recusa grosseira e arrogante (sem apresentação de alternativas), de um atendimento por impossibilidade de pagamento. Nada há sem recursos financeiros – os meios de troca do trabalho humano – porém colocar os pacientes e familiares diante de condições extremadas em um momento de vulnerabilidade física e psicológica, é moralmente repreensível. É preciso, consequentemente, encontrar meios que tornem esses encontros menos ásperos e dolorosos, principalmente para os pacientes e familiares.

A essência do dilema entre a segurança do paciente e a sustentabilidade financeira encontra-se nas peculiaridades dessas dimensões. A primeira é invisível, de difícil compreensão, descontínua, e medida pela ausência de resultados negativos. A segunda caracteriza-se por ser visível, de fácil compreensão e sujeita à mensuração direta e de curto prazo. Consequentemente, há uma tendência natural e sedutora de se dar maior atenção à variável financeira em detrimento da segurança do paciente, quando na verdade são faces de uma mesma moeda.

A segurança do paciente é, em certo sentido, o contraponto da sustentação financeira. O insucesso de uma dessas dimensões, ou de ambas, pode ser catastrófico para os pacientes, organizações de saúde, gerentes, médicos, enfermeiros, demais profissionais de saúde e a sociedade. Quem trabalha em organizações de saúde sabe que restrições financeiras, seja com o propósito de elevar ganhos ou pela escassez de recursos, adicionam riscos para todas as partes envolvidas, em especial para os pacientes que podem ser acometidos de danos decorrentes do atendimento recebido. Nesse dueto – segurança do paciente e sustentação financeira – é difícil imaginar-se, pela força da correlação positiva entre essas dimensões, qual é a principal.

Se a primeira atenção nas organizações de saúde situa-se na segurança do paciente, a primeira ameaça encontra-se na sustentabilidade financeira. Enquanto a segurança do paciente desafia diariamente os profissionais que atuam na área assistencial, em particular médicos e enfermeiras, a sustentabilidade financeira constitui-se no grande e onipresente preocupação dos gestores. São, portanto, objetivos complementares e inseparáveis. Deste modo, aqueles que avaliam essas duas prioridades como concorrentes, cometem um grave erro de interpretação, que pode, inesperadamente, resultar em prejuízos incalculáveis para os pacientes, os profissionais e as organizações de saúde. Em síntese, gestores e profissionais de saúde encontram-se inexoravelmente conectados por esses dois objetivos comuns.

Efetuar o gerenciamento, tanto da segurança do paciente quanto da sustentabilidade financeira, pressupõe habilidade, capacidade e tempo. Comunicação e trabalho em equipe tornam-se imprescindíveis para que essas duas dimensões possam ser atendidas de modo apropriado, sem colocar em risco os pacientes e as organizações de saúde.

É necessário tornar as organizações de saúde mais seguras do que são. Isso exige um esforço enorme. O compromisso com a segurança torna os pacientes e familiares mais satisfeitos com os cuidados prestados, enquanto os médicos e enfermeiras trabalham mais motivados. O resultado é um aumento virtuoso da produtividade que contribui para a perenidade das organizações de saúde, assim como para a maior satisfação dos pacientes, familiares e profissionais de saúde.

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