Arquitetura Hospitalar | 17 de julho de 2013

Novos hospitais e postos de saúde: mau planejamento ou planejamento do mal

Novos hospitais e postos de saúde

Durante a XVI Marcha dos Prefeitos na quarta-feira, 10 de julho, a presidente, ou presidenta (como queira!) Dilma Roussef anunciou o “investimento de R$ 4,9 bilhões destinados à construção e melhorias em 17,8 mil Unidades Básicas de Saúde no Brasil”. Informação disponível no Portal da Saúde do próprio Ministério da Saúde.

O que poderia ser uma notícia de grande efeito no futuro da assistência à saúde, passa a ter o impacto de uma imensa irresponsabilidade sobre a gestão dos recursos públicos. Vejamos alguns aspectos que devemos considerar como de valiosa relevância nesta percepção.

Antes, o assunto merece a clássica pergunta: por que estes recursos não foram liberados gradativamente ao longo dos últimos anos? Liberados na medida em que os projetos foram encaminhados, as demandas foram registradas e após a devida avaliação técnica sobre a qualidade, coerência técnica e efetiva necessidade de cada município?

O Ministério da Saúde complementa a informação com esclarecimentos de que estes recursos são provenientes de demandas levantadas e recebidas a partir de 2011. Pior a emenda que o soneto. Caracteriza-se assim, o retardo da avaliação da necessidade e, consequentemente, da incompatibilidade entre o que foi visto àquela época, 2011, e o que será oferecido a partir desta liberação de recursos neste segundo semestre de 2013. Mais de dois anos, tempo suficiente para que as estruturas físicas e as instalações tenham alterado completamente o perfil de necessidades.

Os revestimentos, as tubulações, o mobiliário, equipamentos, telhados e lajes por certo não resistirão aos impactos da intempérie e uso contínuo que os estabelecimentos de saúde exigem diariamente e (no caso dos hospitais) diuturnamente.

O projeto de um edifício hospitalar tem que cumprir um ritual de planejamento em etapas que podem demorar até 2 anos. Desde a sua concepção projetual (2 a 3 meses), desenvolvimento do projeto básico de arquitetura e assistencial de saúde (6 a 8 meses) e, finalmente, a elaboração do projeto executivo para as instalações prediais e especiais, fundação e infraestrutura, sondagens do terreno, levantamentos topográfico e arbóreo (e outros 8 a 10 meses).

Depois de acrescidos 3 a 4 meses para os procedimentos administrativos de licitação e contratação, resultam aproximadamente 24 meses necessários para o planejamento pleno. Tempo que deverá resultar na eficiência do projeto do edifício hospitalar, na responsabilidade financeira e na garantia da sustentabilidade econômico-financeira do empreendimento.

Estas etapas e respectivos cronogramas são válidos para edifícios públicos ou privados com a mesma intensidade e responsabilidade!

A falta de efetivo planejamento desses projetos para estabelecimentos assistenciais de saúde, a aprovação junto aos órgãos sanitários (estaduais e municipais), o respeito ao código de obras e zoneamento de cada cidade, poderá trazer as inexoráveis consequências que vivemos em período recente com a construção dos estádios para a Copa do Mundo no Brasil: aditivos e acréscimos intermináveis de valores às obras e equipamentos. Superfaturamento respaldado pelo mal planejamento ou planejamento do mau.

Será este o objetivo deste anúncio de investimentos? Anúncio despropositado, (des)planejado e, evidentemente, assustado com as manifestações em todo o Brasil. Como se estes recursos silenciassem a necessidade de qualidade da assistência à saúde, melhorassem a qualidade dos nossos postos de saúde, maternidades e hospitais.

As empresas ou empreiteiras que ficam de sobreaviso a este (des)planejamento dos investimentos públicos aplaudem ou riem como hienas! Sabem o resultado e por isto mesmo assumem qualquer obra a qualquer custo!

Fica evidente que nenhuma fiscalização resistirá ao mais elementar relatório técnico para aditivar novos recursos.

O Brasil e a sua saúde têm uma especial oportunidade de iniciar o seu período de qualificação através de edificações planejadas, adequadas às condições climáticas e à sustentabilidade que cada região do Brasil exige. Ao mesmo tempo, oferecer o conforto humano aos profissionais e demais usuários na medida em que pagamos por edifícios de saúde valores plenamente compatíveis com as melhores construções em outras regiões do mundo.

  • Alice

    Muito bem avaliado e corretamente exposto. Pelo que se depreende, ao contrário do ( des ) planejamento burocrático, politiqueiro e amadorístico do Governo.

    • Portal Setor Saúde

      Prezada Alice
      Agradeço a leitura e observações.
      Atenciosamente,
      Fabio Bitencourt

  • Bernardo

    Muito adequado e ponderado o aviso alerta !!!

  • Erica Duarte

    Prezado colega
    A mais de 30 anos convivo com a gestão na área de saúde, sou enfermeira, e sempre vi planejamentos mal feitos, sem consulta ou participação de profissionais que iriam utilizar estrutura, equipamento ou mesmo realizar assistência. Tenho visto na administração da Presidenta Dilma, não tenho nenhum envolvimento partidário, uma preocupação em acertar dar dinheiro a prefeitos e municípios e cobrar planejamentos e conclusão de obras. Sei que temos muitas pessoas em nosso pais que ainda não entenderam a responsabilidade de suas ações e ainda se queixam da má administração sem olhas as suas atitudes até esse momento.
    Tenho vistos atitudes governamentais como nunca antes havia visto. Acho que devemos ajudar a quem quer fazer a coisa certa criticar é mais fácil. Tenho várias evidências que provam o que disse e é só acompanhar as ações que estão sendo feitas no site do MS

    • Portal Setor Saúde

      Prezada enfermeira Érica Duarte

      Agradeço a leitura e as suas observações.

      Estamos juntos na mesma direção e sentido para construir a melhor qualidade na assistência à saúde.

      Atenciosamente,
      Fabio Bitencourt

  • Vanessa Cardoso

    Prezado Fábio,
    Certamente o mau planejamento vai além dos tópicos já propriamente apontados.
    Como arquiteta diretamente ligada à esta área pela Secretaria de Saúde de Florianópolis vejo que as portarias que se sucedem definindo quais ambientes físicos e qual seu dimensionamento têm se sobreposto à normas de acessibilidade, códigos de obras locais e se distanciado da RDC50 cada vez mais, deixando o arquiteto numa situação difícil ao reunir-se com os usuários e tentar explicar que não pode atender à demanda real de ambientes sob pena de perder recursos federais! Mais que isso, o difícil feedback ou acesso à discussão sobre o os parâmetros lançados para novas edificações têm engessado projetos que podem acabar por se transformarem em “elefantes brancos” ou verdadeiros “franksteins” com ambientes que acabam por ter seu uso deturpado pela prática.

VEJA TAMBÉM