Gestão | 7 de abril de 2025

O Macrossistema de Saúde Brasileiro: Dois Pilares – SUS e Sistema de Saúde Suplementar

O Macrossistema de Saúde Brasileiro Dois Pilares– SUS e Sistema de Saúde Suplementar

O sistema de saúde brasileiro se estruturou em dois pilares principais que se complementam: o Sistema Único de Saúde (SUS) e o Sistema Suplementar. Juntos, essas bases recebem a demanda diversificada da população, promovendo o acesso à saúde e a sustentabilidade do setor. Há, contudo, um entendimento equivocado, por razões ideológicas, que o Sistema Suplementar “desafoga” o Sistema Público de Saúde. Para tornar o ambiente ainda mais complicado existem grupos que advogam um Sistema de Saúde inteiramente sob controle do Estado, enquanto outros propõem que este atenda só os menos favorecidos economicamente. Na verdade, os indivíduos com alguma capacidade financeira buscam cuidados de saúde no Sistema Suplementar que oferece serviços privados, acesso ampliado e mais rápido. Assim, tem-se no país um sistema misto onde a irracionalidade instaurou um duelo constante entre o SUS e o Sistema Suplementar e vice-versa. As disputas e antagonismos insensatamente desperdiçam esforços e recursos.

SUS: Um Pilar Universal

Criado a partir da Constituição Federal de 1988 e regulamentado pela Lei nº 8080 de 19/09/1990, estabelece as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, bem como a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes[1].

Constitui-se em um dos maiores e mais complexos sistemas de saúde pública do mundo, abrangendo desde o atendimento à atenção primária até procedimentos altamente complexos como transplante de órgãos. Baseia-se nos princípios de universalidade, integralidade e equidade, garantindo acesso à saúde como um direito de todos e um dever do Estado[2].

 Características Principais do SUS

Universalidade

·     Destinado a todos os cidadãos, independente de classe social, renda

ou contribuição.

Integralidade

·     Abrange ações de promoção e prevenção, diagnóstico e tratamento,

reabilitação e cuidados paliativos.

Gestão

·     Gerido pelos governos federal, estaduais e municipais.

Financiamento

·     Financiado por recursos públicos federais, estaduais e municipais.

Número de

Usuários

·     Cerca de 75% da população depende exclusivamente do SUS.

Desafios

·     Subfinanciamento.

·     Longas filas e limitações na infraestrutura.

·     Judicialização.

O SUS, ao oferecer atendimento universal e gratuito, é visto como “concorrente” indireto do Sistema Suplementar. Além disso, as divergências ideológicas exacerbam a polarização e a falta de diálogo entre os dois pilares.

Sistema de Saúde Suplementar: Um Pilar Privado

A Lei 9.656/1998[3] instituiu a saúde suplementar, que abrange os serviços oferecidos por planos/seguros de saúde privados, e foi concebida para atender parcela da população que pode arcar com serviços privados de saúde, mas isso não significa que ele substitui ou alivia a demanda do SUS.

Características Principais do Sistema de Saúde Suplementar

Livre escolha

·     Os cidadãos e empregadores voluntariamente escolhem contratar planos/seguros de saúde privados. Existe maior flexibilidade de escolha de profissionais e estabelecimentos de saúde, assim como acesso a tratamentos não cobertos integralmente pelo SUS.

Regulação específica

·    É regulamentado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) que define normas e fiscaliza as operadoras.

Gestão

·    Gerido por instituições privadas ou públicas (modalidade de autogestão).

Financiamento

·    Financiado por mensalidades pagas pelos indivíduos e seus empregadores.

Número de usuários

·    Cerca de 25% da população possui planos/seguros de saúde, na maioria das vezes como benefício corporativo.

Desafios

·    Conflitos sobre cobertura contratual e reajustes.

·    Judicialização.

 Um ponto crítico a considerar é que a expansão do Sistema Suplementar tende a ser interpretada como uma privatização disfarçada, o que enfraqueceria SUS e aumentaria os embates entre um e outro.

 A Relação entre SUS e Saúde Suplementar

O SUS e o Sistema Suplementar possuem naturezas distintas e coexistem, na maioria das vezes, nos mesmos prestadores, todavia há uma animosidade intrínseca que dificulta a interligação entre os dois sistemas. Os prestadores comuns restringem assistência aos usuários do SUS e, não raro, adotam um caráter depreciativo em relação a ele, muito embora parte dos prestadores, em particular os hospitais, tenham benefícios governamentais que compensam, em parte, a limitada remuneração proporcionada pelo sistema público.

Conquanto haja uma discrepância financeira que alimenta acusações mútuas e diferenças ideológicas que exacerbam a polarização e a falta de diálogo, os dois sistemas assistenciais compartilham um propósito comum: a promoção do bem-estar da população.

Já existe, em alguma medida, colaboração entre os dois sistemas, mas precisaria ser expandida para ampliar o acesso à saúde. Eis algumas frentes que poderiam ser desenvolvidas:

  • Compartilhamento de infraestrutura: o uso conjunto de hospitais, laboratórios e equipamentos já ocorre em vários prestadores de serviços de saúde. Isso otimiza a capacidade instalada, porém a defasagem dos valores remuneratórios eleva o risco de insustentabilidade dos prestadores.

  • Interligação de sistemas de informação: tanto o SUS quanto o Sistema Suplementar desenvolvem infraestrutura própria de tecnologia da informação, com o agravante que os sistemas informatizados são, na maioria das vezes, incompatíveis e, consequentemente, inviabilizam a troca de dados e prontuários entre os prestadores, gestores do SUS e operadoras/seguradoras.

  • Parcerias em programas de saúde preventiva: programas de educação em saúde, campanhas de vacinação e combate a doenças crônicas podem ser realizados de forma interligada.

Na atualidade já ocorrem interações comuns, como beneficiários de planos que utilizam o SUS para serviços de vacinação e transplantes. Em termos de financiamento e responsabilidade, a judicialização onera e envolve ambos os sistemas.

Apesar das diferenças, SUS e Sistema Suplementar são interdependentes. Alguns procedimentos complexos ou de alta tecnologia são realizados no SUS, mesmo para usuários do Sistema Suplementar. Entretanto, a falta de clareza sobre os papéis e os limites de cada pilar alimentam atritos, principalmente quando há transferência de responsabilidades que sobrecarregam um lado ou outro.

Modelo Interligado

A criação de um modelo de gestão interligada entre SUS e Saúde Suplementar potencializará os benefícios de ambos os pilares, promovendo maior eficiência e acessibilidade. Já existem iniciativas que vão nesse caminho: prestadores que atendem usuários dos dois pilares e as parcerias público-privadas (PPPs). Pelo menos três mecanismos podem ser aplicados para consolidar a interligação entre os dois sistemas:

  • Compartilhamento de Dados: sistemas unificados para identificar demandas e otimizar recursos.

  • Co-Financiamento de Serviços: parcerias em programas como prevenção e controle de doenças.

  • Resolução de Conflitos: protocolos claros para determinar responsabilidades em casos de sobreposição.

 Conclusão

Os pilares do sistema de saúde brasileiro – SUS e Saúde Suplementar – são essenciais para atender a diversidade das demandas de saúde no Brasil. Enquanto o SUS garante a universalidade, a Saúde Suplementar oferece uma oportunidade de os indivíduos buscarem serviços no âmbito privado. A abordagem mais apropriada parece ser ponderar o Sistema Suplementar como complementar e priorizar o fortalecimento e a universalidade do SUS. A interligação e a cooperação entre os dois pilares promoverão um aprimoramento do acesso à saúde da população como um todo. O Ministério da Saúde e as instâncias estaduais e municipais aumentarão a eficiência e eficácia do setor.


[1]  Biblioteca Virtual da Saúde. Ministério da Saúde, Lei nº 8080: 30 anos de criação do Sistema Único de Saúde (SUS).     https://bvsms.saude.gov.br/lei-n-8080-30-anos-de-criacao-do-sistema-unico-de-saude-sus/#:~:text=Em%2019%2F9%2F1990%20foi,%C3%9Anico%20de%20Sa%C3%BAde%20(SUS). Acessado em 28/nov/2024.
[2] Ibidem.
[3] Presidência da República. Lei nº 9.656, de 03 de junho de 1998. Casa Civil, Subchefia para Assuntos Jurídicos.

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