Sem categoria | 28 de junho de 2017

A polêmica do jejum nos procedimentos laboratoriais

A polêmica do jejum nos procedimentos laboratoriais

Há cerca de três anos iniciou-se um movimento de alguns setores do ambiente laboratorial, em que eram apresentadas veementes sugestões no sentido de que os procedimentos laboratoriais pudessem ser realizados a qualquer hora, não importando a situação alimentar do cliente.

Naquela ocasião a Sociedade Brasileira de Análises Clínicas adotou atitude de cautela, informando a seus associados de que, sabidamente existiam parâmetros não influenciados pelo jejum, e que para outros, de acentuada solicitação havia, comprovadamente exigência de jejum, pois sofriam alterações bastante significativas.

Que nos conjuntos de erros pré analíticos, os mais impactantes na cadeia das não conformidades, os exercícios físicos, a alimentação e a administração de medicamentos eram os maiores contribuintes na alteração dos parâmetros. Que exames prescritos em que não havia necessidade de jejum estavam quase sempre mesclados com outros em que o jejum seria obrigatório. Que não havia justificativa alguma realizar duas coletas em procedimentos laboratoriais provenientes de atendimento ambulatorial.

Concluía a SBAC em sua nota oficial julgar temerária qualquer modificação nas recomendações do jejum, enquanto não existirem comprovações inequívocas e convincentes da não influência do fator alimentação nos resultados dos procedimentos laboratoriais.

Recentemente, este tema foi retomado com muita força, e a grande imprensa foi acionada.

Sabe-se perfeitamente que quando os “canhões” da mídia são trazidos às discussões acontecem distorções, novas opiniões são formadas como se tudo o que foi publicado seja a mais confiável das verdades.

É evidente que não é desta forma que as polêmicas científicas devam ser abordadas.

Provocar a imprensa leiga para divulgar informações científicas da mais alta importância significa levar à toda a população a discussão de assuntos que, antes de mais nada, num primeiro momento, dizem respeito apenas à comunidade científica.

Após o consenso, muitas vezes obtido de maneira árdua, chega o momento de informar a todos. Todas as informações devem ser democratizadas e socializadas, menos as distorcidas ou mal resolvidas.

Os exames laboratoriais podem ser solicitados, realizados e avaliados sob duas grandes vertentes:

O hospitalar, onde não existe hora, nem jejum para as avaliações, pois nesse caso estão incluídas as emergências, urgências, UTIs, clínicas cirúrgicas, oncológicas e outras. Nessas ocasiões os profissionais nelas envolvidos tem pleno conhecimento para avaliar os resultados dos exames colhidos a qualquer hora, em qualquer situação, com ou sem jejum, ou stress, ou interferências medicamentosas.

No atendimento ambulatorial, nas situações de consulta com solicitação de exames laboratoriais, como componentes de uma avaliação, em que usualmente o cliente vai voltar após decorridos uma semana, 10 dias, ou até mais dependendo do que foi solicitado, não existe necessidade alguma de que o jejum não seja conservado, até para que se possa preservar um trabalho de mais de meio século de notável capacidade orientativa e do mais alto significado os valores de referência laboratoriais, que orientam e conduzem as atitudes médicas ao diagnóstico de 70% das solicitações clínicas.

Essas orientações nos laudos laboratoriais, com exceções mínimas foram pesquisadas e estudadas para a situação de jejum. Apesar de poucas, algumas são muito modificadas pela alimentação, e nos casos “border line” a confusão fica imediatamente estabelecida. Portanto, não pode ser desprezado um trabalho que iniciou há mais de cinco décadas e que até os dias de hoje vem sendo um notável guia de informações, disponibilizadas por todos os laboratórios e periodicamente atualizados.

Um novo foco de discussão está sendo incubado, mas mantido estritamente dentro dos canais científicos é o das dosagens de triglicerídeos, onde respeitáveis membros da Sociedade Brasileira de Cardiologia e Endocrinologia entendem que a ação danosa dos altos níveis de triglicerídeos acontece após a alimentação.

Com esta presunção, tem preconizado a ausência de jejum para a coleta dos lípedes.

Entretanto essas conceituadas entidades, mais uma vez, estão buscando o consenso conjunto com a SBAC, SBPCML e ABRAMED, numa inequívoca demonstração de união de forças e cabeças para maiores e melhores decisões.

De qualquer forma já existe de forma consensual o conceito de que o jejum de 12 horas não é mais necessário, para a dosagem de lípides.

Está previsto para este ano a publicação de um documento/posicionamento das Sociedades científicas em relação a esta pauta.

O signatário deste texto propõe a criação de um novo teste, adosagem de triglicerídeos pós prandial, padronizado pelas sociedades clínicas e laboratoriais.

Para esse novo teste laboratorial seriam pesquisadas e uniformizadas a alimentação ideal para ser utilizada pelo cliente paciente e o horário ideal para a coleta do material. Essa padronização deveria ser observada por todos os laboratórios clínicos para que possa haver uniformidade. Algo similar ao realizado atualmente em relação às dosagens de glicose pós prandial.

Com isto, seriam preservados os valores de referência para os demais procedimentos laboratoriais, e garantidas essas informações fundamentais aos clínicos.

De qualquer forma, como no parecer da SBAC de dois anos atrás tudo ainda deve ser levado com a máxima cautela, preservados os casos urgentes, e considerar que a segurança do paciente é uma necessidade muito mais premente do que o melhor aproveitamento dos espaços físicos dos laboratórios.

IRINEU GRINBERG
Ex Presidente da SBAC
irineugrinberg@gmail.com

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