Empregabilidade e Aperfeiçoamento | 30 de julho de 2020

Médico Rogério Tovar descreve o papel da medicina interna e os aspectos clínicos da Covid-19

Médico do Hospital Moinhos de Vento foi atração de Live promovida pela Fassaúde/IAHCS
Rogério Tovar e Paulo Petry

A atuação de um médico internista, a evolução das UTIs e dos profissionais da linha de frente e as estratégias de enfrentamento à pandemia da Covid-19 foram alguns dos temas abordados pelo médico do Serviço de Medicina Interna do Hospital Moinhos de Vento, Rogério Tovar, em Live com o tema Aspectos Clínicos da Covid-19. O evento foi apresentado no Instagram do coordenador de pós-graduação da Faculdade de Tecnologia em Saúde (Fasaúde/IAHCS), doutor em Epidemiologia, professor Paulo Petry.

Na conversa, Tovar destacou a necessidade de cuidado com os idosos, que sofrem psicologicamente em consequência do isolamento imposto. Além disso, descreveu experiências e aprendizados adquiridos como profissional, destacando a mudança em ritmo acelerado nos atendimentos realizados nas UTIs, a evolução dos jovens profissionais que ocupam a linha de frente e a necessidade de preparação para pandemias futuras.

Muitas informações e a importância de dimensionar a gravidade da doença

O médico internista iniciou a conversa abordando a repercussão social trazida pela Covid-19, que causa excesso de informações para a sociedade. Ele ainda destacou que está enfrentando de perto a doença, pois seu filho foi infectado – porém, Tovar salientou que o quadro é leve, “o que deve acontecer em 90% das pessoas contaminadas”.

Além do excesso de informações, o médico disse que está observando um sofrimento psicológico muito grande causado pelo isolamento social, destacando a importância de apoio entre familiares e amigos.


Tovar afirmou que a Covid-19 impõe a dificuldade de lidar com o desconhecido, pelas inúmeras informações desencontradas que acabam surgindo. “Quando começam a questionar a gravidade da doença, eu digo assim: se toda a sociedade adoecer ao mesmo momento, se não nos isolarmos e nos cuidarmos, uma das 28 ou 30 pessoas da tua relação de amizade e família vai morrer. É a única maneira das pessoas entenderem”, disse.


Experiência em UTI e as mudanças aceleradas

Tovar abordou um pouco de sua trajetória. “O internista, dentro da escala da medicina, é a origem de todas as especialidades clínicas”, afirmou. Ele salientou que trabalhou com terapia intensiva nos dez primeiros anos de profissão. “Era indicado não ficar mais de 10 anos, para não sofrer de complicações”, brincou.


“O trabalho na UTI é muito bonito no sentido da velocidade das coisas. Daqui a cinco anos, metade do que eu falo digo aos meus pacientes já não estarão corretas. Na terapia intensiva, essas coisas mudam em um ano: em um ano, 50% das coisas mudaram. E essa pandemia está fazendo com que essa velocidade de mudanças seja ainda mais acelerada, porque precisamos buscar soluções para tantas pessoas que precisam estar internadas [com uma doença nova]”, afirmou.

De acordo com o médico, o período atual tem sido muito difícil pela dificuldade de oferecer uma resposta imediata a muitas pessoas que necessitam tratar quadros graves da doença. “Desde o começo da pandemia, ficou claro que serão os leitos de UTI que irão salvar vidas. Um em cada 10 pacientes irá para o hospital, e alguns destes precisarão ir para a UTI”, disse.


Qualidade assistencial e a relação com as chances de sobrevivência

Tovar destacou que a qualidade da UTI e da equipe profissional de intensivistas é um fator decisivo na recuperação de pacientes com Covid-19, ressaltando a qualidade dos profissionais da linha de frente. “Quem vai ser salvo é quem vai ter uma boa UTI, com uma equipe adequada. E essas esquipes estão aprendendo muito rápido. A evolução desses jovens que estão na UTI é espetacular”, disse.


O professor Petry também destacou  a importância das UTIs, citando os quatro pilares principais no enfrentamento da doença.  “Temos uma opinião parecida nesse aspecto. Eu tenho dito isso, o vírus será mais veloz do que nós, mas uma boa estrutura de UTI é um dos pilares. Hoje saiu um estudo do Imperial College de Londres, citando quatro pilares de suporte para Covid-19: leitos de UTI, densidade demográfica, percentual de idosos da população e medidas de distanciamento social. A ciência tem nos amparado com essas decisões”, afirmou.


A evolução das pandemias: da gripe espanhola à Covid-19

Questionado pelo professor Petry sobre a evolução das pandemias, Tovar abordou a pandemia de H1N1, em 2009, salientando que foi um dos primeiros casos registrados no RS à época. Porém, o médico disse que a doença tinha uma particularidade: a mortalidade era proporcionalmente maior em pessoas com menos de 60 anos, pois muitos idosos à época já eram vivos na década de 1950, quando um vírus similar circulou (o que certamente imunizou boa parte da população nascida à época, que não apresentaram índice elevado de complicações em 2009).

Para o médico, desde a “gripe espanhola” de 1918 até a pandemia atual da Covid-19, houve pouca mudança nas ações de prevenção. Isolamento dos pacientes contaminados, higienização frequente das mãos, uso de máscara, além de medidas de prevenção disseminadas à sociedade são as estratégias que sempre existiram nos enfrentamentos da doença. Na visão de Tovar, a possibilidade de ampla testagem é a grande novidade de enfrentamento atual.


Tovar também destacou que é fundamental que a humanidade tenha aprendido com a pandemia da Covid-19 a se preparar melhor para futuras pandemias, destacando que foi amplamente dito por especialistas nas últimas décadas sobre os perigos de uma grande pandemia, que acabou se concretizando. Ele apontou que, somente em relação ao coronavírus, há sete tipos deste vírus no mundo, e novas doenças relacionadas poderão surgir se não forem realizadas ações globais de enfrentamento precoce.

Petry também destacou o impacto da atual pandemia. “Como professor de epidemiologia, sempre abordei como possibilidade teórica de um vírus se transformar em uma pandemia, mas nunca imaginei que vivenciaria de fato isso”, afirmou.


Rogério Tovar e Paulo Petry

Rogério Tovar e Paulo Petry

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Sintomas

Questionado sobre os sintomas da Covid-19, o médico destacou que há uma ampla gama apresentada.

“Geralmente, é como uma gripe no comportamento inicial. Febre, dor de garganta, que não tem um percentual tão alto quanto parecia inicialmente, dor no corpo e fadiga muscular”, afirmou.

De acordo com Tovar, a anosmia (perda do olfato) chama a atenção, além da tosse seca – ambos são sintomas bastante frequentes. Ele ainda destaca que o vírus pode se disseminar por vários órgãos do corpo, e por isso traz consequências diversas (nos rins, intestino, cérebro, complicações vasculares, entre outras).

Além disso, a dor de cabeça, associado à febre, merece atenção, por serem sintomas frequentes. “Saiu uma revisão interessantes que aponta que quem tem muita dor de cabeça, anosmia [perda do olfato] e menos febre parece ter uma evolução melhor, de não precisar ir ao hospital. Mas isso são coisas que ainda estamos aprendendo [sobre a Covid-19]”, disse.

O agravamento da doença se dá por uma reação inflamatória exagerada. “Quando o vírus mata, é quando ele entra no corpo, se espalha e provoca uma reação inflamatória exagerada. A quantidade de inflamação é que vai determinar a gravidade da doença. Ele circula, podendo ir para as meninges do cérebro, para as membranas do coração, pulmonares, dos músculos, para todos os órgãos. O diabete no paciente com Covid-19 é fator de alto risco, agride o pâncreas”, enumerou. Tovar destacou que, atacando os sistemas vasculares, o vírus muitas vezes agride o coração do paciente.

Além de todos os sintomas apresentados, o médico destaca outro: a reação intestinal. “Quero chamar a atenção para um sintoma que apareceu nas últimas semanas em meus pacientes: a diarreia. Temos que entender que esse vírus pode ir para todos os nossos órgãos. Há uma gama muito grande de reações”, explicou.


Testes

Questionado sobre a importância dos testes, Tovar destacou que o mais importante é o RT-PCR, considerado “padrão ouro”, que tem uma margem de erro muito baixa, que identifica se a pessoa está com a doença. “Hoje indico em qualquer dúvida. Se teve contato com o suspeito, espera dois dias e faz o teste. É o teste mais indicado para o indivíduo”, disse, salientando que, mesmo esse teste pode apresentar resultado equivocado (embora mais raro que os testes rápidos).

Os testes rápidos também foram saudados pelo médico, mas com a ressalva de que não são tão precisos quanto os testes de RT-PCR. “Do ponto de vista empresarial, epidemiológico, os testes rápidos são importantes para identificar quem já passou pela doença. Porém, há uma margem de erro muito grande”, afirmou. “Um teste rápido negativo não me diz nada [pelo alto índice de erros]. Porém, um teste positivo fará com que eu preste atenção e recomende outros testes mais precisos para o paciente”, completou Tovar.

“Medicina como arte”

“Eu vejo a medicina como uma arte, com o uso da ciência para o resultado final, que é o bem-estar do paciente”, disse. De acordo com Tovar, atualmente as pessoas tomam suas decisões terapêuticas por orientação dos seus médicos, mas ressaltou que os próprios médicos estão confusos com tantas informações. É uma área com bastante abrangência, da medicina mais individualizada, com o olhar específico para cada paciente. Entretanto, sobre a Covid-19, de acordo com o médico, “a grande dificuldade dessa doença é que não temos muitas coisas [tratamentos efetivos]”.

Medicamentos e opções de cuidado

O especialista destacou que o oxímetro pode ser uma boa opção de uso caseiro, para controle da oxigenação de pessoas contaminadas. Ele ainda apontou que, como tratamento caseiro, são usados antitérmicos e antibióticos, por exemplo, mas ressaltando que é importante que o tratamento seja prescrito pelo médico.

Tovar ainda deixou um recado sobre os riscos de medicamentos que surgiram como promissores, como a hidroxicloroquina, que além de não ter mostrado eficácia, pode agravar complicações cardíacas em pacientes internados. Ele ainda ressalta que não há eficácia de nenhum medicamento que funcione profilaticamente.

No final da Live, o médico reforçou a importância de tratar as consequências pesadas do isolamento, citando como exemplo a morte de uma paciente, de 101 anos de idade, que ele tratava desde o início da carreira. De acordo com Tovar, a paciente ficou abalada com a mudança de rotina, com o distanciamento de familiares, o que a abalou muito – o óbito ocorreu em decorrência de uma pneumonia. “É fundamental, nesse momento, o cuidado com os idosos”, finalizou.

Próxima Live: JJ Camargo

A 11ª edição da Fasaúde Ao Vivo terá como convidado o professor de Cirurgia Torácica da UFCSPA e diretor do Centro de Transplante da Santa Casa, José de Jesus Peixoto Camargo, ou como é amplamente conhecido: J.J. Camargo. O tema será “O momento atual na visão de JJ Camargo”. O evento ocorrerá no dia 5 de agosto, quarta-feira, às 19h, novamente pelo instagram do professor Paulo Petry: @prof_paulo_petry

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Os debates têm o apoio da Federação dos Hospitais e Estabelecimentos de Saúde do Rio Grande do Sul (FEHOSUL), Sindicato dos Hospitais e Clínicas de Porto Alegre (SINDIHOSPA), Associação dos Hospitais do RS (AHRGS), Instituto de Acreditação Hospitalar e Ciências da Saúde (IAHCS Acreditação) e Portal Setor Saúde.

Leia as matérias com a cobertura das lives já realizadas, com a participação de Robson Morales, Milton BergerSalvador GulloAlex MelloFernando TorellyJosé Carlos CalichJorge BajerskiCristiano Englert Patrícia Prolla.

 



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