FEHOSUL/AHRGS e SINDIHOSPA debatem necessidade de compliance no setor da saúde
Advogado Aloísio Zimmer foi o primeiro palestrante do Seminários de Gestão do mês dezembroEntre diversas alterações que a legislação brasileira sofreu nos últimos anos, a nova Lei Nº 12.846, de 2013, conhecida como Lei Anticorrupção, trouxe uma série de novas adequações para todas as instituições do país, balizadas pelo combate à corrupção. Com isso, ganhou força o debate sobre a necessidade de as empresas terem compliance e programa de integridade – adotando uma série de procedimentos para agir com ética e em conformidade com as normas internas e externas, seguindo as regras vigentes.
Para abordar esse novo momento da legislação – e da sociedade brasileira -, Aloísio Zimmer, advogado, professor e sócio fundador da Aloísio Zimmer Advogados Associados, de Porto Alegre, apresentou a palestra Compliance na Saúde: Uma escolha da Instituição ou Obrigação Legal?, primeira palestra do Seminários de Gestão: Tendências e Inovações em Saúde, realizado no dia 9 de dezembro, no Hotel Plaza São Rafael, em Porto Alegre. Em 2018, Zimmer lançou a publicação Corrupção e Improbidade Administrativa: Cenários de Risco e a Responsabilização dos Agentes Públicos Municipais (Editora Revista dos Tribunais).
Abertura
A abertura foi realizada pelo presidente da FEHOSUL, AHRGS e da ONA, Cláudio Allgayer (foto). “O evento teve origem em 2016, quando Fernando Torelly, então presidente do SINDIHOSPA, sugeriu em uma reunião na FEHOSUL, quando igualmente exercia cargo como Diretor da entidade, a criação de um evento que retomasse a tradição dos eventos Sul Saúde, iniciados na década dos anos 70 pela Associação dos Hospitais do Rio Grande do Sul. A sugestão foi aceita com entusiasmo pelos demais membros da diretoria da FEHOSUL. É importante que neste evento de encerramento do ano, tenhamos em mente que o Torelly é um exemplo de profissionalismo, companheirismo e de parceria. Um profissional que não esquece suas origens e seus amigos. Ele não mede esforços para estar junto a vocês, junto às nossas entidades, para o bem da saúde gaúcha e nacional. Sejam bem-vindos, e desfrutem do conhecimento que o Torelly e os demais renomados palestrantes se dispuseram a compartilhar conosco. Bom evento a todos”, disse Allgayer, na abertura da atividade.
O evento, já tradicional na agenda da saúde gaúcha, atualmente em seu quarto ano consecutivo, é promovido pela Federação dos Hospitais do Rio Grande do Sul (FEHOSUL), em parceria com a Associação dos Hospitais do Rio Grande do Sul (AHRGS) e o Sindicato dos Hospitais e Clínicas de Porto Alegre (SINDIHOSPA). Tendências e Inovações em Saúde foi o tema desta edição do Seminários de Gestão – a quinta em 2019.
O patrocínio desta edição foi do Banrisul; da empresa de tecnologia Pixeon, do laboratório farmacêutico MSD; e da operadora de planos de saúde Unimed Porto Alegre. A certificação foi concedida pela faculdade Fasaúde/IAHCS, e os apoiadores foram IAHCS Acreditação, CBEXs, CNSaúde e Naxia Digital. O veículo oficial do evento é o portal Setor Saúde.
Paulo Petry, coordenador dos cursos de pós-graduação e extensão da FASAÚDE/IAHCS, foi responsável pela condução do Seminários de Gestão. Petry é mestre/doutor pela UFRGS e membro da Comissão Científica do evento.
Compliance na Saúde: Uma escolha da Instituição ou Obrigação Legal?
No início da apresentação, o palestrante alertou que o tema é espinhoso e ainda traz muitas dúvidas. “O assunto escolhido trouxe uma grande mudança na legislação e tem causado insegurança nas diferentes instituições que lidam com saúde, entre pequenas, médias, grandes, filantrópicas, Organizações Sociais de Saúde. Especialmente quando a entidade se obriga a criar relações com o poder público e, a partir disso, receber repasse de dinheiro público e, de forma direta ou indireta, ficar submetido aos controles do Ministério Público e do Tribunal de Contas”, disse, ressaltando que isso ocorre em um cenário em que os atrasos de pagamentos e o subfinanciamento impõem dificuldades grandes para todos os gestores que atuam no setor da saúde.
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Segundo o palestrante, as inseguranças aumentam pelo fato de as leis terem tipos penais abertos. “Há certas condutas que tomamos no cotidiano da gestão que não conseguimos saber se está dentro da lei ou não, causando insegurança, pois depende do olhar específico de um Controlador”, explicou.
Lei Anticorrupção e necessidade de compliance e programa de integridade
O advogado destacou que as leis sofreram alterações pelo recente endurecimento contra a corrupção na legislação. Zimmer lembrou que coincidentemente, 9 de dezembro, é o Dia Internacional de Combate à Corrupção.
“Nem sempre se entendeu que corrupção era algo ruim no Brasil. Compreendia-se que corrupção produzia eficiência econômica”, disse, referindo-se aos vínculos comerciais vigentes com países estrangeiros. “ A corrupção, muitas vezes, era vista por muitas multinacionais como uma porta necessária para se entrar em alguns mercados, para expandir os negócios”, disse.
“ Mas, nos anos 70, nos EUA, se chegou à conclusão que esta não era uma boa forma de se conduzir a relação entre o privado e o público e nas relações econômicas. Algumas empresas processadas ou punidas por estas condutas, vão gerar a ideia de que era preciso alterar a legislação. Os EUA mudam a legislação, porém, não começam a aplicá-la de imediato. Não aplicam por que as empresas disseram: ‘se tivermos que cumprir estas leis, ao nos relacionar com os países onde impera a corrupção, nós vamos quebrar antes que o mundo mude’”, explicou Zimmer. Dentro deste contexto, países de fora começaram a tentar equalizar as diferentes regras, num movimento alinhado à globalização.
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De acordo com o palestrante, a visão acerca da corrupção sofreu uma mudança no país a partir dos anos 1990, inspirados em outros países (como Estados Unidos e Inglaterra), o que faz o Brasil priorizar a governança corporativa. “Dos anos 1990 para cá, vem uma pressão de fora para dentro nessa direção de combate à corrupção. Com isso, o Brasil altera a legislação que envolve os crimes de lavagem de dinheiro e incorpora a colaboração premiada e, em 2013, aprova a Lei 12.846 de 2013, a Lei Anticorrupção. É essa Lei que trata, entre outros temas, do tema compliance. Ou, tratando como sinônimo, a adoção, por necessidade ou não, de programas de integridade”, explicou.
Entretanto, Zimmer aponta que “a Lei Anticorrupção não esclarece pontos de dúvida que só vamos conhecer mesmo vivendo a experiência prática”. De acordo com o advogado, a Lei foi feita às pressas em 2013, como resposta às manifestações de junho daquele ano que tomaram conta do país, o que trouxe uma série de indefinições em alterações impostas. “A lei, por ter sido aprovada em tão pouco tempo, traz as imperfeições desta pressa”, salienta Zimmer.
O palestrante ainda apontou as nuances estaduais e municipais das novas leis para empresas com relações contratuais com entes públicos, que as obrigam a ter programa de integridade. “A Lei do Rio Grande do Sul obriga, para aqueles que estabelecerão contratos públicos, um programa de integridade instituído. Entretanto, se o vínculo for federal, a Lei 12.846, de 2013, não obriga. Porém, a Lei 15.228/2018, do Rio Grande do Sul, obriga, pelos artigos 37, 38, 39”, enfatizou.
Zimmer, porém ressaltou, que a obrigação prevista ainda pende de uma regulamentação, que inexiste. Essa regulamentação depende de um decreto ainda não editado. Ele ainda apontou que as leis municipais sobre o tema estão menos avançadas.
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Compliance na saúde: obrigação ou escolha?
Zimmer explica que não basta apenas ter um “super programa de compliance”, pois os gestores devem saber como agir ao identificar uma falha ética na empresa.
“O meu compliance, que é espetacular, identificou um problema. Aí surge a dúvida. O que eu faço com o problema que identifiquei? Às vezes, se resolve alguns problemas “menores”, com uma simples demissão. Mas quando encontramos um crime, que atinge a empresa e as instituições que ela se relaciona, causado por um dos colaboradores. Sou obrigado a informar às autoridades? ”
Segundo Zimmer, o instrumento do acordo de leniência surgiu com esta finalidade, para ajudar as empresas a demonstrarem seu engajamento e disposição para evitar estas situações. “Eu revelo a investigação que fiz, dou todos os dados, este acordo implica na negociação de algum tipo de multa”, explica. Mesmo assim, Zimmer alerta que outros desdobramentos, incertos, podem vir a surgir, principalmente quando envolver dinheiro público, citando possíveis novas sanções em diferentes esferas, como tribunais de contas e Ministério Público Federal, por exemplo.
No fim, Zimmer respondeu à questão central: as instituições de saúde são obrigadas ou podem escolher ter compliance e programa de integridade? “Acima de tudo, no curto e médio prazo, é uma escolha da instituição”, afirmou. Ela [empresa/instituição] deve saber que as mudanças estão ocorrendo no mundo e principalmente no Brasil. A escolha deverá levar em conta que os riscos aumentam significativamente com o passar do tempo, pela falta da prática em lidar com as novas exigências. Mesmo que indefinições ou incertezas criem um emaranhado de dúvidas atualmente, as práticas da empresa devem estar alinhadas a estes movimentos, defendeu Zimmer. Segundo o especialista, este é o caminho para a instituição conseguir atingir um maior índice de acerto e de segurança no âmbito das relações com o setor público e com a sociedade como um todo.
” É fundamental que os departamentos jurídicos estejam qualificados…. a Lei de Licitações, a Lei Anticorrupção estadual (RS) que será em breve regulamentada, a Lei das Parcerias Público Privadas; todos estes ambientes do jurídico irão se alterar. As pessoas que trabalham nestas entidades [da saúde] precisam estar preparadas para isto”, completou Zimmer.
O advogado apontou que não são apenas as leis que podem exigir compliance e programas de integridade para o setor da saúde. “Na esfera privada, especialmente no mundo da saúde, mais do que obrigações legais, temos a autorregulação e a pressão aos players nacionais vindos de players internacionais. Então, temos aqui compliance que decorre de uma tentativa de um bom relacionamento, estável, com fornecedores internacionais. Então, fica claro que, para me relacionar com eles, é preciso que se tenha programas neste sentido”, salientou.